Ópera(Em Andamento)

Capítulo 14(Parte 2)

Thur sabia muito bem que nenhum dos amigos gostava de falar no assunto. Nenhum dos dois gostava de falar sobre o assassinato. Mas não os culpava, afinal, ele mesmo era assim.
Muitas vezes preferia ignorar a existência daquele acontecimento, mas, por mais que tentasse, era impossível. Aquilo tinha estragado sua vida para sempre.
- No dia em que a Melzinha foi atropelada. – Josh concluiu, engolindo em seco.
- Sim. Mas eu não estou falando da Missy. – Duan alternou seu olhar de Josh pra Thur, que estava cabisbaixo. – Desculpe não ter estado lá pra te ajudar, margarida. - estava pesaroso.
- A culpa não foi sua. – murmurou.
- A culpa foi minha, na verdade. – Josh disse chamando repentinamente a atenção dos dois. – Se eu não tivesse bebido até desmaiar, o Duan não precisaria ter me arrastado pra casa, e nós poderíamos ter estado lá.
- Isso não importa mais. – Arthur balançou os ombros, fingindo completo desinteresse. – Eu não ligo.
- Mas então, - Josh mudou de assunto, virando-se para o outro amigo. – quem é a vítima?
Thur girou os olhos com a impaciência, enquanto o loiro voltava ao seu semblante alegre.
- Ela não é vítima. – Duan respondeu tranqüilo. – E ela se chama Lua BLANCO. – Arthur prendeu a respiração por um momento.
- Da sala do Thur? – Josh apontou e o rapaz consentiu. – Ela realmente é um pedaço... Mas quem diria que daria bola pra você! – riu com gosto.
- Por que seria diferente? – o loiro retrucou.
- Ela tem cara de que daria bola pra um cara igual a mim, agora igual a você... – brincou, enquanto o outro dava o dedo.
- Ah, calem a boca. – Arthur caiu deitado sobre o palco, sentindo-se extremamente incomodado. – Odeio quando começam com papos fúteis ou infantilidades... É ridículo.
- Qual parte exatamente foi a da infantilidade, Judd? – o moreno de cabelos curtos e crespos levantou uma sobrancelha. – A parte que eu falei que ela era gostosa ou a parte que eu falei que ela não daria bola pro Duan?
- Aí você se enganou nas duas suposições, amigo. – o loiro disse cheio de si. – Primeiro porque sim, ela não só daria como deu bola pra mim, e segundo porque ela não é apenas gostosa, ela é muito gostosa. Precisava ver ela na festa, dude. Minha boca até salivava! – deu uma risada.
- Ridículo. – Arthur revirou os olhos.
- Eu, hein. – Josh disse, encarando-o confuso. – Que bicho te mordeu?
- Eu sei que bicho é esse. – Duan disse com ar de conhecimento. – Se chama “tensão sexual reprimida”. Já a minha – sorriu. – está completamente satisfeita desde ontem à noite. – Josh deu um assobio de aprovação.
- Cala a boca, porra! – Thur estourou, surpreendendo os dois amigos. – Vai à merda com essa sua tensão. Eu não dou a mínima. – levantou-se rapidamente. – Quer saber? Eu vou embora. Não aguento nem mais um segundo falando dessa babaquice.
Andou decidido até fora do portão da garagem, descendo o mesmo rapidamente até batê-lo. Quando o ambiente ficou em silêncio, Duan e Josh se olharam estáticos e completamente confusos com a atitude do garoto.
- O que será que deu nele? – Josh perguntou e o loiro balançou levemente os ombros, desentendido.
Enquanto Thur andava a passos largos em direção ao Audi, sua cabeça trabalhava em busca de motivos para sua irritação instantânea.
‘Estúpido.’ Pensou consigo mesmo.

Costa Oeste da Inglaterra; Sábado; 12:47 da manhã;

Mel foi conduzida por Chay em um carro de aluguel até uma pequena casa na praia. Por mais que a casa não fosse grande, estava obviamente bem localizada e sua decoração era impecável. Conseguia misturar perfeitamente simplicidade e excentricidade em um só lugar.
Era amarela com um pequeno jardim em frente, tinha escadas de madeira, uma varanda com duas cadeiras, e por dentro era mais do que aconchegante. Mel se sentiria melhor se, além da conveniência da casa, o clima também fosse conveniente.
A costa oeste estava apresentando ventos fortes e o clima fresco, inadequado para um dia no mar.
- Droga, amor. – ela disse de braços cruzados, olhando as ondas agitadas através da janela. – Devíamos ter pesquisado como estaria o clima, antes de vir. – suspirou. – Agora os seus planos de pegar sol foram todos pro espaço...
- Quem disse que eu tinha planos de pegar sol? – o rapaz falou apoiando seu queixo no ombro da namorada, que se arrepiou com seu toque. – Aliás, quem disse que eu não sabia como estaria o clima?
- Você sabia? – ela se virou pra ele, abraçando seu pescoço apesar da expressão confusa.
- Desculpe se eu te decepcionei, Melzinha. – respondeu encarando os olhos da menina com um olhar terno. – Mas nem sempre faz parte dos meus planos te ver corada, por mais que eu te ache linda quando está assim. Dessa vez, a única coisa que eu queria com essa viagem era te aquecer do frio.
Ao ver a namorada sorrir, não teve duvidas em beijá-la.
Precisavam se recuperar do ano difícil que tiveram, tanto fisicamente quanto emocionalmente. E fariam isso com êxito.  




Capítulo 14(Parte 1)

Ao sublinhar a palavra amor, apenas estou ressaltando o que você já sabe, que eu te amo!


Londres; Oxford Street; Sábado; 3:07 da manhã;  
O Toyota azul-marinho foi perdendo a velocidade devagar, até que estivesse completamente estacionado na frente da casa branca. 
As luzes da varanda estavam acesas, dando uma iluminação precária à calçada e ao pequeno jardim que antecedia as escadas de madeira. Luinha olhou tudo através do vidro dando um suspiro. Seu peito estava carregado, e essa não era exatamente uma das suas sensações favoritas. 
Tinha uma vontade oculta de fugir, mas o sentimento de evasão era só mais um que estava afogando-a em meio a um mar de sensações. Sentia-se feliz, compreensiva, assustada e arrependida ao mesmo tempo. 
Acordou de seus pensamentos assim que sentiu a respiração pesada de Duan em seu pescoço. Virou-se pra tentar protestar ou simplesmente se despedir, quando ele juntou seus lábios novamente. 
Luinha permitiu a passagem da língua do garoto um pouco receosa. Não tinha certeza se realmente fizera isso por sua vontade ou apenas por educação. Retribuiu o beijo do rapaz sem a mesma voracidade que ele apresentava. Apenas por retribuir. 
A mão de Duan postada na nuca dela foi descendo aos poucos, percorrendo até a altura de seu ombro direito, e do ombro até seu decote. Luinha partiu o beijo assim que sentiu a trajetória que a mão do garoto pretendia percorrer. 
- O que foi? – ele perguntou arfante. Sua voz estava rouca. – Eu fiz algo errado? – abriu os olhos, fitando-a preocupadamente. 
Não podia perder aquela garota
- Não, não. – Lua disse em um tom leve, tentando isentá-lo de preocupação. – É, só... – comprimiu os lábios úmidos em uma linha, encarando seus olhos verdes. – Vamos mais devagar, ok? 
O garoto desceu seu olhar para o decote da menina, onde sua mão ainda estava pousada. 
- Ah, claro. – falou recolhendo-a rapidamente. – Me desculpe por isso. Acho que eu... 
- Se empolgou? – ela deu uma risada baixa. Suas bochechas ainda estavam mais rosadas. 
- É... – ele concordou alternando o olhar das pernas da garota para seus olhos. – Mas eu não tenho culpa. – balançou os ombros. – Você faz isso comigo. 
Luinha gargalhou, apesar de não saber ao certo se foi por achar graça ou por nervosismo. 
- Eu... – falou reticente, retomando a aparência séria. – Eu tenho que ir, Duan. Até mais. 
Impulsionou-se para abrir a porta, quando uma das mãos quentes do rapaz puxou-a pelo braço, trazendo-a pra mais um beijo. Lua partiu-o rapidamente, apesar de gentil, e acenou com a cabeça. 
- Tchau. – repetiu, com um sorriso cordial. 
Ele respondeu ao “tchau” com um tom de voz tão baixo que foi quase imperceptível. 
Quando Luinha adentrou a casa, Duan largou seu corpo no banco, expirando o ar que estava preso desde o início da festa. 
- Man, há quanto tempo não me sinto assim. – alargou o sorriso, colocando a mão na testa e sentindo-se tonto pelo aroma da garota que ainda preenchia o local. 

Londres; Dockland; Sábado; 3:03 da manhã; 

Arthur passou a mão rapidamente pelo seu criado-mudo, derrubando agressivamente tudo que se postava ali. A raiva fluía através do seu sangue, fazendo com que as pontas de seus dedos esquentassem com um simples pensamento. Mas não. Não queria pensar. Não queria pensar porque sabia que toda vez que isso acontecesse, o rosto dela lhe viria à mente. 
Devia ter suspeitado. Devia ter suspeitado desde o início que ela estava interessada em Duan. Claro. Quem iria escolher o estranho suspeito de assassinato ao cara mais bem humorado da escola? 
Só mesmo uma louca. Insana. 
Duan era tudo o que ele não podia ser. Radiante, seguro e de bem com a vida. 
Como Thur podia fazer alguém feliz se a felicidade era uma coisa que ele mesmo desconhecia? 
Espera! 
Quem falou em fazer feliz? 
Não podia se permitir ter esse sentimento novamente. Uma vez já fora o bastante. Uma vez já o levara a ruína. A que limites mais poderia fazê-lo chegar? Arthur não conseguia nem imaginar. 
Spike mirava o dono remexer nos cabelos nervosamente. Estava deitado perto da vidraça, e simplesmente não sabia o que interpretar das reações do garoto. O máximo que sabia, na verdade, era quando estava na sua hora de passear, ou comer. Bocejou enquanto Thur começava a vagar a esmo pelo cômodo. 
- Péssimo conselho, Spike. – o rapaz murmurou, caindo sentado na cama. – Péssimo. Não podia ter me aconselhado a coisa pior. – ele parou pra ouvir as próprias palavras e deu uma risada fria. 
Estava seguindo os conselhos de um cachorro, agora? Realmente, a insanidade tinha batido à sua porta. 
Novamente a música eletrônica invadiu seus pensamentos e se viu parado na porta dos fundos da casa de Bennet. A lembrança de Duan e Luinha se beijando avidamente era tão vívida em sua mente que até o enojava. Enojava até demais... 
Fechou os olhos e viu Lua sorrir em seu subconsciente. 
- SAI DA MINHA CABEÇA! – gritou, caindo de costas no colchão. 
Iria esquecê-la. Tinha que fazer isso! Essa obsessão por aquela garota já estava o fazendo até perder os rumos de seu objetivo. 
Tiraria ela da mente, nem que pra isso precisasse da ajuda de seus bons e velhos amigos... A vodka e o uísque. 
‘Ridículo.’ Pensou, dando um sorriso de escárnio com a própria imaginação. 
Quer saber? Ele tinha um jeito melhor de tirar a garota da cabeça. Afinal, sempre era mais fácil esquecer uma dor com outra. 
Estendeu a mão até a primeira gaveta, tirando de lá um álbum de fotos simples e surrado. 
Seus olhos ficaram quentes assim que viu a primeira foto, e de uma hora pra outra, Lua não habitava mais seus pensamentos. Eles estavam em um lugar muito mais distante e sombrio, mas ainda assim, mais seguro. 
O livro vermelho começou a incomodar Thur embaixo de seu corpo, e enquanto fitava tão compenetradamente as fotos, uma frase do autor lhe veio à mente: 
“Conservar algo que possa recordar-te seria admitir que eu pudesse esquecer-te.” 
Suspirou impaciente. 
- Cala a boca, Shakespeare. – murmurou, antes de virar para o lado, fechar os olhos e tentar pegar no sono, sem nenhum pensamento prévio. 

Londres; Oxford Street; Sábado; 11:35 da manhã; 

Luinha estava em seu quarto, encarando o lado de fora da janela enquanto dobrava uma blusa para colocar na mochila. Passaria dois dias no apartamento de Sophia, e por mais que, de certa forma, isso a animasse, não conseguia tirar os pensamentos de mica. 
‘O que ele faria se soubesse?’ perguntou-se, e assim que completou o pensamento, outro rosto veio a sua mente. ‘O que ele faria se soubesse?’ 
Suspirou lembrando-se de seu primeiro beijo com Duan, na festa. A sensação de frio na espinha, o asco, o desejo. Tudo misturado em um momento só. Sentia-se angustiada por dentro, como se tivesse ferido alguém. Como se aquele beijo não tivesse sido o certo a fazer. 
Lua despertou de seus pensamentos assim que o telefone começou a tocar. 
- Alô? – atendeu, ajeitando a blusa dentro da mochila. 
- Eles já foram. – ouviu uma voz feminina conhecida do outro lado da linha. Não pôde deixar de sorrir. – Que horas vem pra cá? 
- Agora mesmo. – respondeu prontamente. – Pelo menos eu pretendo... 
- Seu primo não suspeitou de nada? – Sophia perguntou surpresa. 
- Não. Mas eu acho que ele suspeitará assim que me vir saindo com uma mochila nas costas. – deu uma risada leve, imaginando a cena. – Terei que inventar uma desculpa pra passar a noite aí. 
- Realmente. – Sop concordou receosa. – Detestaria que ele ficasse sabendo... 
- Ou que o melhor amigo dele ficasse sabendo. – Luinha completou, rolando os olhos. Sophia ficou um momento em silêncio. – Mas tudo bem... – disse reticente enquanto seus pensamentos se voltavam pra noite anterior. Deu um sorriso astuto. – Eu sei exatamente que desculpa inventar. Só preciso fazer um telefonema... 
- Boa sorte. 
- Terei. – a garota sorriu, antes de desligar o telefone. 
Luinha se sentou na cama, dando uma breve olhada pro seu quarto antes de virar seu rosto para o criado mudo. Estendeu a mão e digitou o mais novo número em seu celular, pensando que aquela fosse uma desculpa claramente aceitável. 
- Alô? – perguntou assim que a pessoa atendeu ao telefone. – Duan? 

- Você vai fazer o quê?! – Rod perguntou horrorizado, deixando a colher que estava usando para comer o cereal ir diretamente de encontro à tigela, fazendo um alto barulho metálico. 
Ele e Luinha estavam na cozinha. O garoto estava assentado em frente à mesa de madeira e sua reação fez a prima ter vontade de rir, apesar de não tê-lo feito. 
- Com o goleiro? Mas você mal o conhece! – protestou, postando-se de pé rapidamente. 
- Aí que você se engana, molengo. – ela tentou usar seu melhor tom sério, apesar da risada estar implorando pra sair. – Eu e o Duan temos... Uma conexão muito forte. – pigarreou. 
Lembrou-se do momento em que combinava com o rapaz que, se alguém perguntasse, ele diria que ela passara a noite com ele. 
- E você está afim de consumar essa conexão hoje à noite? – Rod colocou a mão na cintura, irritado e incrédulo. 
- O que eu e o Duan vamos fazer hoje à noite não é da sua conta, molengo. – fingiu estar brava. 
- É, sim. – falou com a voz aflita e mais aguda. - Sabe por quê? Porque depois quem tem que explicar pra tia porque você apareceu grávida sou eu
- Eu não vou engravidar. – revirou os olhos, fazendo o maior esforço que já fizera pra segurar a gargalhada. 
- Quem te garante? – o primo estreitou os olhos, deslizando o queixo pra frente para aparentar uma expressão rabugenta. 
- O meu amigo anticoncepcional e minha amiga c... – já ia completar o raciocínio quando Rod virou o rosto para o lado. 
- Esquece, faça o que você quiser. – cruzou os braços e voltou a sentar na cadeira. – Não irei me opor. 
- Obrigada. – Luinha suspirou aliviada, dando alguns passos na direção do primo, que não lhe dirigia o olhar. Agachou-se na frente dele, e fitou seus olhos. – Obrigada, Rodrigo. Você não sabe o quanto isso é importante pra mim. 
Odiava enganá-lo daquele jeito. Mas não tinha escolha. Era isso ou trair a confiança deSophia, que no momento estava numa situação tão complicada. 
Rod virou seus olhos magoados para a garota, depois suspirou. 
- Você gosta mesmo dele, não é? – perguntou. 
Luinha mordeu seu lábio inferior, concordando com a cabeça sem olhá-lo nos olhos. Se discordasse, ele nunca a deixaria ir. 

Londres; Dockland; Sábado; 11:40 da manhã; 

Josh e Duan estavam na garagem da casa do primeiro rapaz, tentando tocar algumas músicas de seu repertório sem o auxílio de Thur, que, como de costume, estava atrasado para o ensaio. 
Quando o portão foi levantado por alguém do lado de fora, Josh fechou a cara e Duan abriu um amplo sorriso. 
- Thur! – disse animado ao ver o amigo, descendo do pequeno palco improvisado para vê-lo melhor. 
O garoto tinha os olhos rodeados por olheiras e o cabelo bagunçado. Estava mais do que claro que tivera uma péssima noite de sono. 
- Você está péssimo, dude. – Duan disse, sinceramente preocupado. 
- Obrigado pela parte que me toca. – Arthur deu um sorriso seco e jogou-se sentado no palco. 
Josh observou os garotos. 
- Legal. – ele disse suspirando. – Então temos aqui hoje dois pólos. 
- O que quer dizer? – Thur resmungou. 
- O Adams está que nem pinto no lixo. – apontou pro loiro com o queixo. Esse, por sua vez, sorria radiante. – E você está que nem pinto na merda. 
- Cala a boca, Josh. – mostrou o dedo médio. 
- Queria passar um pouco do meu bom-humor pra você, margarida. – Duan falou, com o tom leve. 
- Posso saber o motivo de toda essa alegria? – o outro perguntou, soltando o instrumento e se sentando ao lado de Thur. 
- Nada. – Duan cantarolou olhando inocentemente pra cima. – Okay, okay. – se deu por vencido, andando empolgado de um lado pro outro. Arthur bufou. – Talvez eu tenha ficado com a garota mais linda da escola. 
Thur sentiu um desconforto no estômago, trancando mais ainda seu rosto. 
- A Missy? – Josh sugeriu. – Pensei que tivesse ficado com ela naquele dia em que... – engoliu a fala imediatamente, quando se lembrou do exato dia em que isso tinha acontecido. Olhou para Arthur de soslaio. Esse deu um sorriso sombrio e disse: 
- Pode falar em que dia isso aconteceu. Eu não vou ficar chateado. – “mais chateado”, ele quis dizer.  






Capítulo 13
Quando menos se espera, ela vem e você não se livra dela tão                                   cedo. É uma consequência de quem soube amar mas não soube ser        amado. Solidão... 





Londres; Dockland; Quarta-feira; 9:13 da noite; 


- Alô? – uma voz feminina nasalada surgiu do outro lado da linha, fazendo o coração de Thur palpitar por um segundo. 
Estava sentado em sua cama desarrumada, olhando as luzes da cidade que, vez ou outra, substituíam as sombras através da vidraça. O cachorro parecia olhar na mesma direção, com um olhar entediado. 
- Martha? – sua voz transpareceu seriedade. 
- Senhor Arthur? – pareceu espantada. 
- Já disse que não precisa me chamar de senhor... 
- Arthur, mas o que...? 
- Não pergunte nada. – disse áspero, mesmo que educadamente. – Preciso da sua ajuda. 
A mulher ficou uns segundos em silêncio, depois respondeu: 
- O que o senhor quiser. 
Thur deu um sorriso sombrio com a resposta. 
- Preciso da ficha de uma paciente. – falou devagar. 
Sabia que era um pedido sério demais a se fazer, mas precisava daquilo mais do que qualquer outra coisa. 
- O senhor sabe que não posso fazer isso. – Martha sentiu-se ofendida. 
- Disse que faria o que eu quisesse... 
- Seu pai sabe disso? – ela interrompeu. 
- Não devo explicações a ele. Irá me ajudar? – franziu o cenho, com medo da resposta. 
Os instantes silenciosos que se passaram foram agonizantes. O rapaz sentia o batimento cardíaco acelerado apenas com a expectativa daquela resposta. Precisava disso. 
- Que paciente? – a mulher suspirou com a derrota, fazendo com que Arthur abrisse um amplo sorriso. 
- Sally Andersen. 
- Posso pelo menos saber o motivo? – indagou desconfiada. 
- É um motivo pessoal. – esclareceu. – Manter isso em segredo é imprescindível. 
- O que você não pede sorrindo que eu faço chorando? – rolou os olhos. – O que quer exatamente, senhor Aguiar? 
- A princípio... Quando será sua próxima consulta. 

Londres; Highgate High School; Quinta-feira; 11:17 da manhã; 

Todos os alunos da turma B estavam sentados em dupla e distraídos com conversas sobre o trabalho de cálculos, enquanto o professor, senhor Johnson, lia alguns papéis amontoados em sua carteira. Arthur estaria observando a todos com olhar de tédio, se não fosse pelo nervosismo de estar novamente ao lado de Lua. A menina parecia estranhamente confortável, deixando-o ainda mais tenso se possível. 
- E então, o que me diz, Thur? – ela disse olhando-o fixamente nos olhos, como se tivesse acabado de falar alguma coisa. 
‘Deve ser porque ela acabou de falar alguma coisa.’ Arthur concluiu o óbvio, percebendo que sua ansiedade se transformara em desatenção. 
- Desculpe, sobre o quê? – o garoto perguntou juntando as sobrancelhas. 
Luinha suspirou pesadamente antes de prosseguir seu raciocínio. Sabia que Thur estava com a mente em outro lugar, apesar de não imaginar exatamente onde. Pensou que talvez ele pensasse em Ivane, mas esse era um pensamento que ela mesma não queria que rondasse sua cabeça. O porquê? Bom, era um mistério. 
- Sobre o trabalho de cálculos. Podemos nos encontrar na segunda pra fazer... – ela continuou. 
- Na sua casa? – Arthur pareceu vacilar. 
- Bem, tem que ser. Onde mais seria? – Luinha agora levava um sorriso divertido no rosto. 
- Lá está ótimo. 
- Okay. – a garota cantarolou, fechando o livro que estava aberto em cima de sua mesa. 
Luinha respirou profundamente, varrendo a sala com os olhos. Viu o senhor Johnson sentado em sua cadeira, com a expressão monótona, os colegas animados conversando com suas duplas. Mel era a aparentemente mais insatisfeita com sua dupla. Evelin, quando resolvia compartilhar com a companheira suas expectativas para o trabalho, entrava em um monólogo sem fim, observou Lua. 
Seus olhos foram de um extremo ao outro, parando finalmente, em Arthur. 
O rapaz mordia fortemente o lápis, com o semblante inflexível voltado para frente da sala. Sua postura tensa poderia ter até feito-a achar que ele estava nervoso. Mas não. Não oThur... 
Lua fitou seu rosto, descendo por seu pescoço e ombros até chegar ao braço. O braço que estava descansado na mesa a poucos centímetros dela. A mão que descansava ao lado da sua... 
A menina mordeu levemente o lábio inferior, deixando que suas emoções e vontades tomassem conta de seu corpo por um momento. Ergueu os dedos devagar em direção a mão de Thur, e, sem o medo da rejeição, segurou-a. 
Expirou profundamente, entrelaçando seus dedos. 

Arthur sentiu como se correntes elétricas fossem geradas em seu corpo, apenas pelo toque daquela mão na sua. Seu coração disparou de tal forma que o rapaz temia até que ele fosse ouvido. 
A maciez da pele dela era inigualável. Macia demais até para aquela, a que ele tanto amava. Aquela que nunca mais poderia sentir. 
Comparou o toque das mãos de Lua e de Ivane. Uma era frágil e carinhosa, enquanto a outra, ousada e decidida. Era uma comparação imbecil a se fazer. Imbecil e imprópria. 
Num momento de confusão e resguardo, recolheu sua mão, deixando uma Luinha atônita a seu lado. 
O sinal do recreio bateu, de modo que todos os alunos a sua volta se levantassem. 
- Luinha, e-eu... – gaguejou com a voz falha, observando o olhar nublado da menina. Uma pontada de culpa subiu-lhe a garganta. – Eu não queria... 
- Não, Thur. – a garota balançou levemente a cabeça para os lados. – Tudo bem. Eu entendo. – também levantou-se. 
- Não. Você não entende. Eu... – Arthur acompanhou-a contornar a cadeira com os olhos, até que estivesse completamente do lado de fora da sala. 
Tinha deixado o rapaz falando sozinho. 
Thur respirou profundamente, recolhendo seu material de cima da carteira e deixando que a culpa pesasse sobre as suas costas. 

- Festa? – Rod arqueou a sobrancelha. Ele e Luinha estavam se dirigindo para a mesa, após terem saído da fila da cantina. Cada um carregava uma bandeja. – Do Bennet? Você sabe que eu não gosto dessas coisas. 
- Eu sei, molengo. – ela suspirou. – Mas eu acharia demais ir a uma festa aqui. 
- Deixa eu ver se eu entendi. – os dois sentaram a mesa, que ainda estava vazia. Os outros ainda estavam pegando o almoço. – Você está me pedindo permissão pra ir, é isso? 
- Não exatamente. – a garota remexeu os legumes de seu prato com o garfo. 
Ainda sentia-se mal pelo que acontecera com Thur, minutos antes. 
- Não posso permitir que você vá sozinha. 
Rodrigo olhou-a com olhos severos durantes alguns segundos. Quando ela estava prestes a tomar ar pra responder ao primo, outra voz masculina preencheu o ambiente: 
- Ela não estará sozinha. – os olhos de ambos se viraram para encarar a figura decidida e esbelta de Duan. – Acho que nunca fomos apresentados. – esticou sua mão para Rod. – Meu nome é Duan Adams, acompanhante da sua prima na festa. 
- Duan? O goleiro do time? – apertou a mão do rapaz. – Rodrigo Marques. 
- Prazer finalmente conhecer o primo da Luinha. – piscou para a garota, que corou em seguida. 
- O prazer é meu em conhecer o goleiro que salvou nosso time na semifinal, ano passado. – os olhos de Rod brilharam com a lembrança. 
- Ah, aquilo não foi nada. – Duan deu uma risada baixa. – Um goleiro não pode fazer nada sozinho. Grande parte da vitória se deveu aos colegas de equipe. – ‘Um colega de equipe’. Ele quis dizer, mas não verbalizou. 
Rod entendeu muito bem a que jogador o rapaz dos olhos verdes se referia, então deu um suspiro de descaso. 
- Então você que vai levar a Luinha a festa, não é? – analisou-o de cima a baixo. 
Lua rolou os olhos com a desconfiança do primo. 
- Ela foi consultada antes, claro. – o loiro lançou um sorriso torto à garota. – Mas pra mim seu consentimento é importante. 
- Olha... – Rod suspirou. – Eu amo a Luinha. Ela é minha prima caçula, então se algo acontecer a ela, me sentirei culpado pelo resto da vida. 
- Não pretendo permitir que algo aconteça a Lua. – Duan disse com o semblante sério, olhando Rodrigo diretamente nos olhos, depois desviando seu olhar pra Luinha, que observava-o um tanto deslumbrada. – Ela é especial demais pra que eu permita algo assim. 
- Fala, goleirão! – mica disse passando o braço direito em volta do pescoço do rapaz. Duan juntou as sobrancelhas, olhando-o e fazendo com que Luinha risse. 
- Eu te conheço? 
- Não. – Micael disse simplesmente, balançando os ombros. – Mas a questão é que eu te conheço. – fez uma pequena pausa olhando pra garota sentada a mesa, que continuava com o aspecto divertido. – E preciso te falar que aquela sua defesa no jogo contra a Sydney School foi simplesmente fantástica. Cara, você precisa me ensinar! 
- Obrigado, er... Eu acho. – Duan coçou a cabeça, afastando-se de mica. 
- Desculpe por isso. – Lua disse sorrindo sem graça para o garoto e apontando o amigo com as sobrancelhas. Micael bufou. 
- Tudo bem. Não foi nada. – ele sorriu. – O que me diz, Rod? Se é que me permite te chamar assim... 
- Rod está bom. – o branquelo deu de ombros, olhando a prima. – Eu confio que você vá cuidar da Luinha. Deixo ela em suas mãos. 
Duan alargou o sorriso virando seu olhar para a garota e dizendo: 
- Então, te vejo amanhã? 
- Pode contar com isso. – ela sorriu timidamente. 
O rapaz aproximou-se de Lua, dando-lhe um leve beijo na bochecha antes de se afastar pra sua mesa. 
- Obrigada, molengo. – a menina disse ao primo, que a olhou de uma forma carinhosa. 
- Não que você precise da minha permissão... Ou peça, mas eu fico feliz quando você me deixa a par das suas decisões. – segurou a mão da prima por cima da mesa. – Afinal, eu sou o responsável por você, pirralha. – brincou. 
- Vai à merda, Rod. Eu já disse que você não é o responsável coisa nenhuma. – Luinha rolou os olhos. – É só uma pessoa que eu amo e que se preocupa por mim. 
- Dá pra ser mais meloso? – mica disse sentando à mesa, em um tom leve. – Deixa eu ver se entendi... Você está saindo com o goleiro do time de futebol? 
- Ainda não. Vamos sair juntos pela primeira vez amanhã. 
- Na festa do Bennet? – o amigo perguntou curioso. 
- Deixe-me adivinhar... – Rod apoiou o queixo na mão, fazendo cara de tédio. – O “rei da farra”, vulgo: Micael Borges, também vai. 
- Óbvio. – mica deu um sorriso radiante. – Se quiser, ajudo a tomar conta da garota brasileira, aqui. – aponto-a com o queixo. 
- À merda você também, Borges. Gente, olá, eu tenho quase dezoito anos. – moveu ambas as mãos e olhou-os como se os chamasse de “patéticos”. 
- Ainda é um bebê. – Rod disse tomando um gole do suco. 
- Ainda é um bebê. – mica concordou. 
Antes que a menina pudesse retrucar, Mel e Chay sentaram-se à mesa, desviando as atenções para si. 
- Sobre o que estavam falando? – Melzinha perguntou ajeitando-se no banco. 
- Nada demais. – Lua disse com uma pontada de irritação. 
- Imagino. – Chay riu, percebendo sua raiva. – Adivinhem! 
- Papai Noel existe? 
- Cala boca, mica. Óbvio que não. – o rapaz revirou os olhos, abraçando a namorada. 
- Não custa tentar. – Micael encolheu os ombros. 
- ‘Ta, ‘ta. – fez sinal com a mão pra que ele se calasse. – Eu e a Melzinha vamos pra praia esse final de semana. 
- Uau. Eu sou o único que não tem um programa divertido? – Rod disse um pouco impaciente. 
- Por que não vai à festa comigo? – mica perguntou. – Vai ser legal. 
- Porque você não faz meu tipo, Borges. – as pessoas da mesa deram risadas abafadas, enquanto mica dava o dedo. 
- Pra onde vocês vão? – Luinha virou-se pro casal. 
- Pra casa de praia da família dele. Não sei exatamente onde fica, Chay quer fazer uma surpresa. – Mel beijou o pescoço do namorado, que sorriu satisfeito. 
Os amigos continuaram entretidos entre conversas sobre a viagem do casal e a festa no final de semana durante todo o almoço. 
Depois de vários minutos sentada, Luinha sentiu um leve calor na nuca, como se alguém estivesse fitando-a da porta do refeitório. Virou seu tronco devagar nessa direção, até que seus olhos se encontrassem com um garoto que dava as costas para o local e voltava a andar pra dentro do corredor, sozinho. 
Thur 

Londres; Highgate High School; Quinta-feira; 5:03 da tarde; 

Lua tinha saído quase roboticamente da educação física. Temia encontrar com Arthur novamente, ainda mais depois da rejeição a qual fora sujeita. 
Saiu do ginásio poliesportivo despedindo-se de Mel e caminhando pelo gramado no sentido oposto ao campo de futebol, afim de que não fosse vista. Estava tudo bem ela pedir um táxi dessa vez. Tudo bem... 
Soltou a gominha do cabelo respirando profundamente, e, pela primeira vez naquele dia, parando para sentir o peso no peito que aquela atitude do rapaz lhe causara. 
‘Ninguém mandou ser burra, Lua!” Dizia pra si mesma. ‘Óbvio que ele não está interessado. Óbvio. Ele é apaixonado pela Ivane. Onde você estava com a cabeça?’ Dava passos largos tomando seu rumo para a outra saída da escola. 
- Luinha! – ouviu uma voz masculina chamá-la. Deteve seus passos a contragosto, olhando pra trás. 
- Duan?! 
- Luinha – o garoto parou ofegante a sua frente. Ainda vestia o uniforme de goleiro e seus curtos cabelos loiros estavam mais brilhantes pelo suor. – Desculpe te seguir, mas vi que você estava vindo por outro caminho então pensei que fosse pegar um táxi... 
- E vou. – ela completou. 
- Não vai mais. – Duan deu um sorriso torto, mostrando parte de sua arcada dentaria organizada e branca. – Eu te levo pra casa. 
Lua apenas concordou com a cabeça, tendo a estranha sensação de que, de alguma forma, o destino sempre colocava um dedo no meio de seu relacionamento com Duan. 
Era um bom rapaz. 

Londres; Greewich; Sexta-feira; 5:50 da tarde; 

A pequena sala do apartamento agora estava ocupada por uma mala enorme, bem no centro. Preta, aberta, desorganizada. 
- Não acredito que você ainda não tenha arrumado suas coisas, Melzinha. – Chay deu um suspiro, olhando a namorada que estava ajoelhada na frente da mala com a expressão confusa, observando a bagagem. 
- Quieto, Chay. Já disse que não estava achando minha camisola. – repreendeu-o. 
- Pra quê camisola, Mel? – ele rolou os olhos, fazendo-a rir. 
- Eu sei que você não vê necessidade, amor. Mas eu sim. 
- Eca. – Sophia disse entrando na sala, fazendo a atenção de ambos virar-se pra ela. Usava um pijama folgado do Mickey e comia uma caixinha de iogurte. – Eu não precisava entrar aqui e saber que você não quer que a Melzinha use camisola, Chay. 
Os dois riram, fazendo com que ela também sorrisse. 
- Sei que você não é nenhuma leiga nesse assunto, Sop. – o garoto disse. Sophia deu o dedo. 
- Sabe, vocês são dois insuportáveis, mas essa casa ficará vazia sem vocês. – fez voz manhosa, sentando-se no sofá ao lado de Chay. 
- Own, linda. – Melzinha sentou-se do outro lado da amiga. – Também sentirei sua falta, mas já, já estamos de volta. Você nem verá. 
- Venham cá vocês duas. – Chay abraçou-as. – Minhas garotas. 
Ficaram um tempo abraçados no sofá, até que Sophia levantou-se. 
- Okay, okay. – disse. – Agora vocês tem que arrumar as malas. Preciso resolver alguns assuntos. 
- Que assuntos? – Mel arqueou uma sobrancelha. 
- À toa. Com minha dupla no trabalho. – balançou os ombros. 
Chay e Melzinha olharam com desconfiança pra Sophia, enquanto ela deixava a sala e entrava no quarto. 
A garota desviou a cama vazia que antes era de Ivane e a cama de Mel, até chegar a sua, no canto direito. Sentou-se devagar, estendendo sua mão na direção do criado mudo de madeira, onde estava seu celular. 
Digitou alguns números que havia tanto tempo que não digitava que mal se lembrava da sensação de tocá-los nessa ordem. 
- Alô, Luinha? 

Londres; Oxford Street; Sexta-feira; 6:00 da noite; 

- Sophia? – Lua disse arregalando um pouco os olhos, quando se deu conta de quem estava do outro lado da linha. Desde quarta-feira não tivera nenhuma notícia sobre a garota, e de repente, ela lhe falava no telefone. – Como você está? – perguntou preocupada. 
- Bem, bem.- deu uma risada baixa. – Calma, não foi pra isso que liguei. Nós dois estamos bem.- deu ênfase em “dois”. 
- Isso é um alívio. – suspirou. 
- Hm... Luinha? 
- Oi? 
- Eu sei que não tenho condição de te pedir mais nada, até porque você estourou sua cota de ajuda a mim na quarta... 
- Não seja estúpida, Sop. – Lua falou repreensiva. – Te ajudarei sempre que você precisar. Eu não tenho uma “cota de ajuda”. 
Luinha observou as paredes claras de seu quarto, na casa do tio. Sentou-se na cama fofa e começou a olhar através da janela. De lá podia ver uma árvore longa e com vários troncos, próxima a casa. 
Ouviu Sophia suspirar do outro lado da linha. 
- Obrigada. - sorriu. - A Melzinha e o Chay viajarão amanhã. - prosseguiu sua fala. - Eu... Bem... Eu não sei se me sentiria bem em passar esses dias sozinha. Ainda mais na situação difícil em que me encontro... 
- Quer que eu passe o fim de semana com você? – Lua perguntou prontamente. 
- Não, er... - Sop vacilou. - Apenas se não for um incômodo.... 
- Claro que não! – Luinha deu risada, sentindo-se feliz por ter sido solicitada. 
Seu sonho de fazer amizades verdadeiras na Inglaterra talvez não estivesse tão distante... 
- De verdade? - Sophia ouviu o “Hm hm” de Luinha do outro lado da linha, abrindo ainda mais seu sorriso. - Não sei como agradecer... 
- Não precisa agradecer. Afinal de contas, é isso que amigas fazem, certo? – a garota deu um sorriso meigo, enquanto Sop sentia os olhos ficarem lustrosos. 
- Desculpe, Luinha. Eu realmente não queria estar passando por isso. - respirou profundamente. - E nem fazendo você passar por isso. Eu sou uma idiota... 
- Cala a boca. Você não é uma idiota. – irritou-se. – É um ser humano. Você também tem o direito de errar. Apesar de quê, não ache que o resultado disso será um erro. – decretou.Lua colocou os cabelos no ombro esquerdo, recostando-se no encosto da cama. 
Ouviu Sophia chorar do outro lado da linha. 
- Desculpe, Luinha. Eu... Eu preciso desligar. - a garota soluçou. 
- Te vejo no sábado? 
- Até sábado então, minha amiga. - deu um sorriso fraco, depois desligou o telefone. 
Lua sentiu-se iluminada por dentro. “Minha amiga”. “Minha amiga”. Podia fazer amizades no exterior, de fato. 
Não que pensasse que Mel não era sua amiga. Não que pensasse que mica e Chay não eram seus amigos. Eles eram. Mas não os imaginava contando-lhe segredos, ainda mais tão importantes quanto o de Sop. Talvez pudesse se abrir com a garota, também. 
Sobre Nick, sobre os olhares estranhos que algumas pessoas do colégio lhe lançavam, sobreRod, sobre Ivane Whinsky e, conseqüentemente... Sobre Arthur Aguiar. 
Arthur. 
Lembrou da sensação de sentir-se completa, segurando sua mão. Era uma sensação nova e estranha, que nunca sentira na vida. Sentia o peito cheio e o coração sorrir. Incrível como apenas um toque de carinho poderia lhe causar tais sentimentos. Um toque de carinho emThur. 
Olhou pra mão que tocara a de Aguiar, respirando profundamente. Se quisesse, ainda podia sentir o local mais aquecido do que o resto do corpo. Sensação esquisita. Loucura. 
Riu baixo com o pensamento. 
Seu riso esvairou-se aos poucos lembrando-se de como o garoto recolhera a mão assustado. Ele não gostava de seu toque. Claro. Não fazia seu tipo. Ivane, sim. Ela era a garota que ele amou, e que amaria eternamente. Ele mesmo tinha dito. 
Pra quê lutar, então? 
‘Espera!’ Luinha assustou-se com seus próprios pensamentos, levando uma das mãos a boca. ‘Quem disse em lutar? Quem disse em querer lutar por alguma coisa?’. 
Devia estar ficando louca, isso sim. 
Largou esse tipo de indagação pra trás quando ouviu o tio chamar Rod e ela para o jantar. 
Ocupar-se com a conversa sempre divertida dos dois com certeza seria melhor do que se preocupar com Aguiar. Com certeza... 
Tentou pensar na festa que iria com Duan, em algumas horas, e sorriu. 

Londres; Oxford Street; Sexta-feira; 8:21 da noite; 

Lua passava de leve um brilho perto das sobrancelhas quando ouviu duas batidas na porta.Rod. 
- Woooow, Luinha! – o garoto disse deixando o queixo cair, observando-a de cima a baixo.Lua virou-se da frente do espelho do armário para encarar o primo, que andava em direção a sua cama, sentando-se em seguida. – Fará qualquer um da festa invejar o goleiro. 
A menina deu uma risada gostosa. 
- Eu sei que estou gata, meu bem. Pode falar. – brincou, virando-se novamente pro espelho, para passar o rímel. 
- Uma gata modesta. – Rod rolou os olhos e ela gargalhou. – Mas sério, você está... – olhou as pernas descobertas da garota. – Uau. 
- Obrigada, molengo. – sorriu. – Eu faço o que posso. 
- E pelo jeito... Não mediu esforços. – analisou-a novamente dos pés à cabeça. Luinha sentiu as bochechas corarem. – Ok, agora. Parando com a babação... Que horas volta? 
- Quem disse que eu volto hoje? – virou-se pro primo com um sorriso danado. Rod olhou para os lados com a falta de graça, sentindo-se constrangido. – Estou brincando. – ela gargalhou, fazendo-o suspirar aliviado. – Devia ter tirado uma foto da sua cara. Foi imperdível! Aposto que o mica me pagava uma nota preta pela imagem. – ainda ria. 
- Não teve graça, Luinha. – cruzou os braços, emburrado e ruborizado. – Nunca mais brinque com esse tipo de coisa. 
- Por que não? – a garota arqueou as sobrancelhas, colocando o rímel de volta dentro do armário. 
- Eu não consigo imaginar a minha pequena Luinha... – disse reticente, sentindo as bochechas corarem ainda mais. 
- Wow, wow, wow, garotão. Espera lá! – ela riu. – E nem eu estou te pedindo que imagine, isso seria... Eca. – fez careta, o garoto gargalhou. – Só peço que não me trate como uma criancinha inocente porque, vamos e voltemos, eu não sou. 
- Você fez eu me sentir muito bem agora, Luinha. Parabéns. – Rod deu uma risada irônica, fazendo-a dar um sorriso divertido. 
- Desculpa. – andou na direção do primo, puxando-o de leve pelo braço para um abraço. – Mas eu ainda te amo, ok? 
- Ahhh, você está linda. – Rodrigo fingiu voz de sofrimento. – Não tente me seduzir assim, é injusto! 
Ela gargalhou, soltando-o. 
- Tudo bem. Duan já deve estar chegando, agora só falta eu passar o perfume. – pegou um frasco grande e cor-de-rosa da marca “Fantasy”. 
- Esse negócio tem cheiro de “Angel”. – o garoto inalou a fragrância. 
- Todo mundo diz isso. – balançou os ombros. – Mas o bom é que fica um cheiro doce, sem ser enjoativo. 
- O que a torna ainda mais bonita. – olhou-a fixamente. – Se o idiota do goleiro te fizer alguma coisa, me ligue correndo ou grite o mica. Ele estará por lá. Duvido que será muito útil, mas pelo menos não estará sozinha... – Rod riu. 
- Você o ama. – ela rolou os olhos, rindo. 
- Eca. Isso é coisa de gay. – Rodrigo franziu o nariz. – Mas é o papel do melhor amigo fazer o outro se sentir patético, e acho que faço isso muito bem. 
- Você é lindo, Rod. – Luinha sorriu de uma forma meiga. O primo amoleceu. – Agora me dá licença que eu preciso acabar de me arrumar! 
- Okay, okay! – o menino disse entre gargalhadas, enquanto ela o empurrava do quarto, fechando a porta em seguida. 
Luinha encostou-se a porta fechada, respirando profundamente. 
Andou até a frente do espelho, observando-se mais uma vez. Começou sua analise pelos pés e foi subindo o olhar fixando-se em cada detalhe. 
Usava um scarpin preto com a ponta redonda, suas pernas estavam à mostra e o vestido cobria-lhe apenas parte da coxa. O vestido... 
Observou-o novamente virando-se para os lados, para analisá-lo melhor. Era um vestido vermelho, com a alça preta e trabalhada. Sua cintura fina estava melhor definida pelo espartilho, que era a parte de cima da roupa. No fim, formavam-se pequenos babados, fazendo a sua saia. O espartilho era coberto por uma renda preta. 
Sentia-se bonita e ao mesmo tempo, sensual. Sorriu em frente ao espelho. 
Seu rosto também não estava nada mal. Tinha passado o delineador, o que dava a impressão de que usava uma sombra preta nos olhos. Tinha um gloss claro nos lábios, e passara um blush igualmente claro. 
Perfeito. 
Ouviu o farfalhar de algumas folhas na árvore próxima a sua janela, e um estranho calor percorreu-lhe o corpo. Teve a nítida sensação de estar sendo observada. 
Andou decididamente e um pouco assustada até a janela. Encarou a árvore, procurando qualquer coisa nos galhos. Sentiu-se estúpida por não encontrar nada. 
Já estava recolhendo a cabeça pra dentro do quarto de novo, quando ouviu duas buzinas do Toyota azul-marinho estacionado em frente à casa branca. 
Lua sentiu o coração acelerar um pouco, dando um sorriso sincero e ainda assim, incompleto... 
- Seu acompanhante chegou. – Rod disse abrindo a porta do quarto da menina e rolando os olhos quando viu o sorriso de criança que ela esboçava. 

- Espero não ter te feito esperar. – Luinha disse abrindo a porta esbaforida, com uma bolsa preta em mãos. 
Tinha se passado quase dez minutos desde que o garoto estacionara o carro do outro lado da rua, mas ela não queria parecer ansiosa pelo encontro. Trancou a porta de casa virando seu olhar pra ele, que estava parado na varanda. 
Duan vestia um jeans escuro, que contrastava diretamente com sua blusa clara de marca. Seu perfume amadeirado aromático penetrou pelas narinas da garota fazendo suas pernas amolecerem por alguns segundos. 
Fitava-a maravilhado. 
Duan sentia como se tudo o que sempre quisera estivesse perante seus olhos e ao seu alcance. Ele precisava daquela garota. Precisava tê-la. Precisava tê-la só pra ele. 
Aproximou-se sem dizer uma palavra, colocando uma mecha dos cabelos soltos de Luinha para trás da orelha. As ondas nas pontas estavam mais acentuadas, como pequenos cachos existentes apenas ali. 
- A espera valeu à pena. – disse simplesmente, encarando-a fixamente nos olhos. 
Lua desviou o olhar, intimidada pelo brilho repentino que transparecia no sorriso e na mirada do rapaz. 
- Vamos? – puxou-o pela mão. 
- Como quiser. – ele suspirou. – Hoje serei seu leal servo. 

Londres; Dockland; Sexta-feira; 8:52 da noite; 

Arthur estava completamente perdido em pensamentos, jogado em sua cama. Alternava sua atenção em ler o grosso livro de capa vermelha e analisar alguns papéis entregues pelo detetive Daves. 
O cachorro estava entretido mastigando sua ração, próximo a cozinha. 
- Desisto de tentar me entender, Spike. – suspirou. O cachorro levantou o olhar da tigela vermelha, olhando o dono sentar na cama. – Tudo estava bem. Quero dizer, bem não. Ótimo. Meu destino estava seguindo o curso certo. Eu ia cumpri-lo e acabar encontrando a tão esperada morte, e quando o fizesse, agarrá-la com unhas e dentes pra não deixá-la escapar. – seus olhos ficaram quentes. Thur segurou os cabelos com força, olhando confuso para a parede. – E aí vem essa... Vadia. – cuspiu a palavra. – Por que essa garota me faz querer viver, Spike? Por que... Por que com um simples toque ela consegue me fazer esquecer os meus propósitos? – levantou-se repentinamente, sentindo algumas lágrimas rolarem. – Eu anseio a morte. É o que eu mais almejo desde que... Desde que a Ivane partiu. – soluçou. – Eu quero que a morte me encontre o quanto antes quando cumprir a minha promessa. É o meu maior desejo. – fez uma pequena pausa, levando seu olhar sofrido ao piso de madeira. Encarou seus pés descalços. – Era o meu maior desejo. – sentiu-se idiota, caindo de costas na cama e encarando o teto. Ficou um tempo assim, depois virou seu olhar para o cão, que olhava-o com pena. – O que eu devo fazer? 
Spike desviou sua atenção do dono, levando-a para a chave do carro, na bancada da cozinha. Fitou-a como se fosse alguma coisa interessante. Arthur acompanhou o movimento do cachorro. 
Quando observou o chaveiro solitário na bancada clara, imediatamente olhou sua mão. A que Luinha havia tocado. 
Estúpido. Por que a rejeitara? 
Agora sabia o que fazer. 
- Obrigado, amigão. – deu um semi-sorriso, dirigindo-se para o banheiro. 

Londres; Lowden Avenue; Sexta-feira; 9:03 da noite; 

Duan viu dificuldade em achar algum lugar para estacionar o carro. Os quarteirões próximos à casa de Bennet estavam quase inteiros ocupados por carros de todos os tipos. 
Estacionou um quarteirão depois, virando seu olhar pra Luinha ao parar. 
- Cara, - ela disse enquanto ria. – você tem um gosto musical horrível. Não sei como consegue se dar bem com os The Lumps. 
- Haha, engraçadinha. – disse irônico, apesar de estar se divertindo. – E eu não me lembro de ter te falado o nome da minha banda. – concluiu. 
Lua sentiu-se sem jeito ao se lembrar desse detalhe. Thur havia contado-lhe o nome da banda, mas sentia que seria melhor não dizer isso a Duan. A noite estava perfeita, e nada poderia estragá-la. 
- Eu fui no Mark’s quando vocês tocaram. – lembrou-se de ver o loiro no palco. – Me lembrei daí – mentiu. 
- Se você lembrou, é porque causamos uma boa impressão. – ele disse galanteador, tirando o cinto de segurança e escorando o pulso no volante, encarando-a. 
- Causaram. – ela também sorriu, tirando seu cinto e virando-se pra ele. 
Gostava da sensação que a presença dele lhe passava. O garoto dos olhos verdes conseguia inundar o ambiente em torno dos dois com um misto de excitação e mistério. 
Duan ficou um tempo em silêncio, apenas observando os detalhes do rosto da menina. Estendeu uma de suas mãos acariciando-lhe a face devagar. Luinha fechou os olhos ao sentir o carinho. 
- Acho que não cheguei a te dizer – falou baixo. – o quanto você está linda. 
Ela corou, segurando a mão do menino contra seu rosto. Ele gostava dela. Ela sentia que sim. 
Era o que sua mãe sempre dizia: “aprenda a gostar de quem gosta de você”. E Duan sim parecia gostar. Não Thur. Nem Nick. 
- Acho que não cheguei a dizer – ela sorriu. – o quanto você também. 
O garoto começou a fechar os olhos devagar, aproximando seus lábios dos da menina quando, de repente, alguém começou a dar tapas no vidro. 
- Quê que é, porra? – disse mal humorado, olhando a janela do seu lado. 
Deparou-se com a figura de um branquelo magro que sorria abertamente pra Luinha. 
Ah, claro. Conhecia aquele branquelo magro... 
- Hey, Luinha! – o menino disse empolgado. 
- mica? – Luinha riu, vendo-o acenar pra ela. 
- Vocês não vão pra festa, não? 
Duan bufou, encostando-se novamente no banco. Olhou pra mica com uma sobrancelha arqueada, em seguida, abrindo a porta de maneira hostil. 
- Ops. – Micael disse alternando o olhar do loiro pra Lua. – Interrompi alguma coisa? 
- Imagina. – Duan murmurou. 
Luinha saiu do carro, indo em direção aos rapazes, na calçada. 
- Uau, Luinha. – mica analisou-a dos pés a cabeça. – Você está um pecado. 
O menino usava uma blusa Pólo azul, um jeans alguns números maior e tênis. À sua maneira, mica estava uma graça. 
A noite estava fresca e sem estrelas. O barulho da música eletrônica da festa podia ser ouvido da esquina. 
Os três começaram a caminhar juntos para a grande casa branca, que tinha várias pessoas no jardim e luzes coloridas que podiam ser vistas de longe. 
Luinha estava entre os dois rapazes, observando tudo maravilhada. 
- Só não nomeio o pecado – mica cochichou pra ela. Duan tinha passado os braços pelos ombros da menina. – porque senão o goleirão aqui me mata. 
Ela deu uma risada gostosa, voltando sua atenção para o caminho. 

- Espera aí. – Bennet disse cutucando Scott, que estava ao seu lado. Os dois estavam dentro da casa lotada, cercados por garotas e sentados em uma mesa de madeira. – Duan... Com ela? 
Scott virou seu olhar na mesma direção. 
Viu o loiro de cabelos curtos entrar sorrindo na festa, abraçado àquela menina que tanto os intrigava. A menina vestia um vestido vermelho curto e provocante, que faria qualquer um que usasse calças naquele local, amolecer. 
Scott espirou confuso, virando os olhos pra Bennet, que tinha a mesma expressão. 
- Definitivamente eu não sei de mais nada. – o capitão disse, com sua face naturalmente abobalhada. 
- Esperemos pra ver. – o zagueiro deu sua sentença, lançando um olhar áspero na direção do casal e levando um cigarro à boca. 

- Opa, opa. – Kimberly disse descendo do balcão em que estava. 
Brittany partiu o beijo que dava em um rapaz pra encará-la. Kim usava uma longa bota preta, saia jeans curta e uma blusa da cor da bota. Seus cabelos castanhos estavam presos em um rabo de lado. 
- Não é que ele conseguiu mesmo? – apontou para o início da sala, com o queixo. 
A loira virou seus olhos felinos na direção de um casal que adentrava o cômodo, um tanto desajeitado. Abriu um sorriso satisfeito e malicioso, logo depois voltando ao que estava fazendo. 
Aquilo era motivo pra comemoração... 
- E essa é a minha deixa. – Kimberly disse dando de ombros, ao ver um garoto desengonçado entrar na sala um pouco depois. 
Infiltrou-se no meio das pessoas. 

- E aí? – Duan gritou no ouvido de Luinha graças à música alta, quando pararam em um canto. O lugar estava completamente cheio de pessoas, que dançavam, se beijavam, bebiam ou faziam qualquer outra coisa. Estaria difícil de respirar ali se não fossem as grandes janelas da casa. – O que achou? Claro que não deve ser tão divertida quanto às festas no Brasil... 
- Não. – Luinha riu. – Festas são festas em qualquer lugar. – observou o cômodo. Todas as luzes da casa estavam apagadas, e ela estaria completamente escura se não fosse a iluminação de uma boate improvisada na sala. – Parece que a escola inteira veio. 
Olhou as pessoas próximas, desejando que isso fosse verdade. Mas era estupidez pensar que ele viria. Além do mais, o que ela queria com aquele garoto? Ainda mais ali. Estava tão bem com Duan. Sentia-se tão bem com Duan... Apesar de incompleta. Sabia que só se sentiria completa se Arthur, de alguma forma, atravessasse a porta de entrada. 
- Vai querer alguma bebida? 
- Já que perguntou... – ela respondeu, dando um sorriso maroto. O garoto já ia se afastar quando se deu um tapa na testa, lembrando-se de um detalhe. 
- Melhor eu não deixá-la sozinha aqui, senhorita. – falou quase cordialmente. – Se acontecer alguma coisa com você, eu me mato antes que seu primo o faça. – deu uma risada, acompanhado por ela. Segurou a mão de Luinha, guiando-a em direção ao bar. 

-... são os “Flower Rangers”! – mica disse, fazendo as três meninas que o cercavam rir. Ele deu um sorriso, que se desfez imediatamente ao ver uma quarta menina se juntar ao grupo.
- Não vai contar mais piadas, Borges? – Kimberly falou, dando um sorriso divertido. 
- Não tenho motivo nenhum pra fazê-la rir. – respondeu amargo. As meninas se entreolharam quando perceberam o clima pesado, comunicando-se imperceptivelmente umas com as outras e saindo dali, deixando mica e Kim sozinhos. 
- Que pena. – ela aproximou-se do rapaz, ajeitando a gola de sua camisa azul. – Adoraria que você me fizesse rir. 
- Que pena. – sorriu irônico. – Pois eu não vou. 
- Deixa disso, mica. – Kimberly rolou os olhos. – Eu não fiz nada pra você. 
- Ah, - estava sarcástico. – agora foder com a vida de alguém se tornou: “nada”?! 
- Aquela Sophia não merecia você. Além do mais... – segurou as bochechas do garoto, virando o rosto dele pra si. – Tudo o que ela viu foi feito por você de livre e espontânea vontade. 
Micael fitou os olhos penetrantes de Kimberly com a dúvida estampada em seu aspecto, apesar da garota demonstrar uma certeza assustadora. Sabia que não tinha sido exatamente por vontade própria. Não podia ter sido! Ele amava Sophia e nunca iria querer traí-la. 
Por outro lado, não lembrava-se muito bem do que tinha acontecido naquela noite. Não tinha como provar que Kimberly o levou a fazer nada. Talvez... Talvez ela fosse inocente nessa história, assim como ele. Talvez, como Rod havia dito, ele tivesse bebido demais. 
Kimberly não tinha culpa. Era apenas uma garota. Uma garota que gostava dele, como, pelo jeito, Sophia não fazia. 
Deu um suspiro derrotado, segurando a cintura da garota de cabelos castanhos. Kim estampou um amplo sorriso antes de começar a beijá-lo. 

- Ah, nossa. – Luinha disse dando risada. Tudo já estava começando a diverti-la, apesar de mal ter tomado dois copos de bebida. – Eu adoro essa música. 
- Que música antiga, Luinha. – Duan também riu, aproximando-se mais da garota. – Depois eu é que tenho um péssimo gosto musical... 
- O Kasino é bom, ‘ta ok? – fingiu ficar emburrada, fazendo bico. Duan riu mais ainda, apertando a bochecha da garota e achando-a a coisa mais fofa do mundo. 
- Ok, linda. Você venceu. Me rendo ao Kasino. – abriu um pouco os braços. Ela gargalhou. 
- Duan... - voltou a fazer bico, dessa vez, ficando mais próxima a ele. 
- O que, meu anjo? 
- Vamos dançar? – deixou o copo na bancada, juntando a palma das duas mãos. 
Ele rolou os olhos. 
- Esquece a parte que eu disse que me rendo ao Kasino. Eu me rendo é a você. – sorriu galanteador. 
Ela abriu um sorriso de uma orelha à outra, puxando-o pela gola da camisa até o centro da boate improvisada. 
Lua colocou devagar sua mão na nuca do garoto, começando a mover-se no ritmo da música, assim como ele. Duan postou suas duas mãos na cintura de Luinha, sentido todos os movimentos lentos que a menina fazia. 
Fechou os olhos como se o mundo se resumisse a isso. Ele e ela. Ela se movimentando devagar e ele apenas acompanhando suas ações, como um imã ou um satélite. Sorriu com o pensamento. Tentou lembrar como era quando se sentia dessa forma, mas essas lembranças estavam enterradas tão profundamente em seu coração que era incapaz de encontrá-las. Resolveu então curtir o momento, e puxar Luinha ainda mais pra perto, finalmente colando seus corpos. Quando sentiu o choque do corpo da garota contra o seu, abriu os olhos, fitando-a ternamente. 
Lua continuava a se mover, assim como ele, mas dessa vez, acariciando a nuca do rapaz devagar. Queria fazer-lhe carinho, mesmo que seus corpos já estivessem se acariciando o bastante, no ritmo da música. Era uma pessoa boa, uma pessoa que gostava dela... E que ela aprenderia a gostar. 
Observou o rosto limpo do garoto se aproximar do seu, enquanto os olhos verdes esmeralda se fechavam devagar. A boca rosa fosco de Duan estava entreaberta e seguia em direção a sua, lentamente. 
Luinha poderia ter fugido, mas não queria. 
Pensou em Nick e em como ele devia estar se divertindo com a sua amiga, no Brasil. Pensou nele fazendo os mesmos carinhos nela com os quais estava acostumada. Sentiu náuseas. 
Virou o pensamento pra Inglaterra. Lembrou-se dos olhos opacos de Aguiar. Seu rosto, seu peitoral, seus braços... Sua mão. Aquela mão que ele recolhera ao seu toque. Aquela mão que a rejeitara. 
Sua mente voltou à festa, dando-se conta que aquilo era o certo a fazer. Duan se importava.
Quando a boca do rapaz estava a apenas poucos centímetros da dela, Luinha apressou-se em acabar, por fim, com a distância, sentindo a língua dele invadi-la e ir de encontro a sua. 
Fechou a mão nos cabelos do garoto, apertando-os. Duan fez o mesmo com as mãos que estavam em sua cintura, trazendo-a ainda mais para perto se fosse possível, à medida que o beijo se intensificava. 
Os lábios de ambos se moviam numa sintonia estranha. Era como se já se conhecessem, mas não era uma sensação exatamente agradável. Luinha sentia arrepios. Arrepios de excitação e repulsa. Não sabia pra qual dos dois lados se inclinava mais. 
Resolveu encarar a repulsa como se fosse apenas confusão, e a excitação fosse certa. Abraçou-o com o outro braço, enquanto o rapaz espalmava uma das mãos nas costas deLuinha, empurrando-a com seu corpo um pouco para baixo. 

“Merda. O que eu estou fazendo aqui mesmo?” Arthur se perguntou enquanto andava pela calçada da Lowden Avenue. Já foram-se os dias em que costumava a ir a esse tipo de lugar. 
Continuou a andar com as mãos dentro do bolso do casaco. O vento frio batia em seu rosto, arrastando um pouco seus cabelos para o lado. Observou as luzes que saíam da festa e a música alta. 
O que ele estava fazendo ali, mesmo? 
Caminhou pelo jardim da casa até a porta dos fundos, ignorando qualquer bêbado babaca que tenha mexido com ele. 
Conhecia a casa. 
A porta dos fundos daria diretamente pra grande sala, onde a garota provavelmente deveria estar. 
Desviou de um rapaz que parecia querer vomitar e olhou para o aglomerado de pessoas. Deu um passou pra dentro da casa, chamando a atenção de quem estava mais próximo à grande porta de vidro. Levantou o rosto para procurá-la melhor, e desejou não ter feito isso. 
E como desejou não ter feito isso. 
Luinha estava no centro de uma pista de dança improvisada, iluminada por várias luzes coloridas. Até aí estaria tudo bem. Estaria tudo bem se ela não estivesse beijando tão densa e concentradamente Duan Adams. Seu amigo de infância. Seu irmão. 
Thur olhou pra baixo, achando aquele momento o seu pico de idiotice da noite. Procurar pelaLua? No que estava pensando? 
Deu uma risada irônica, observando novamente a cena. 
- Mas é claro. – murmurou. 
Virou-se de costas preparado para fazer seu caminho de volta ao Audi. 

- Ops. – disse Brittany dando uma risada com gosto, enquanto olhava para a porta. – Parece que o mundinho perfeito acabou de desmoronar. – deu um sorriso maldoso, voltando os olhos para o casal que se beijava intensamente no meio do cômodo. 




Capítulo 12

" Que o amor, de olhos vendados, 
encontre o caminho para a sua vontade ! "

* Willian Shakespeare *


Londres; Highgate High School; Quarta-feira; 5:02 da tarde; 

A loira saía ofegante da educação física. Amaldiçoava a inspetora mentalmente por não ter permitido que cabulasse aula – que era uma coisa que sempre dava certo. 
Não bastasse o fato de ter corrido em volta da quadra várias vezes, seu pulmão ainda era débil, em função do cigarro. 
Brittany saía do ginásio ao som de alguns assobios maliciosos dos rapazes da quadra de futebol. Também, ela sabia que já era de se esperar: seus cabelos dourados encaracolados nas pontas sempre eram brilhantes; tinha as coxas, os seios e os glúteos fartos, que agora estavam quase à mostra graças ao mini-short. 
Passou seus olhos pelos meninos que a cortejavam, desejando ver um em especial. O único que realmente atraía sua atenção. 
Ele não estava lá... 
- Brit! – ouviu a voz estridente da amiga, que corria afobada em sua direção, amassando a grama com os tênis pretos. – Brit! 
A garota parou a centímetros da loira. Seu olhar estava como se tivesse acabado de aprontar algo maldoso... Ou visto algo maldoso. 
- O que é, Kim? – colocou as mãos na cintura com a impaciência. 
- Você. Não vai. Acreditar. – seus olhos faiscaram enquanto ofegava. 
Brittany teve uma sensação ruim sobre a notícia da amiga, mas fez sinal pra que ela prosseguisse. 
- O Thur. – inspirou. – E a novata idêntica a Iv. – soltou o ar. – Estão de casinho. 
Uma bomba pareceu estourar no estômago de Brittany, expelindo veneno para todos os lados. Seus olhos se estreitaram, enquanto alguns pensamentos passavam por sua cabeça. 
- O que exatamente você viu? – perguntou à amiga. 
- Eles pareciam se abraçar com, digamos... Muita vontade, atrás do ginásio. 
A loira deixou um sorriso sinistro escapar. Kimberly arrepiou-se com a expressão da menina. 
- Não vou permitir que isso continue. 

Londres; Audi A8; Quarta-feira; 5:07 da tarde; 

- Desculpa. – Luinha disse sentada no banco de couro do carona. 
Estavam seguindo em direção a sua casa, como faziam todos os dias depois da educação física. 
Arthur olhava pra frente, com as bochechas um pouco mais rosadas. Sentia-se quente por dentro. ‘Aquecido como...’ Ele mesmo pensava em uma comparação. Pensou em um pequeno pássaro sob as asas da mãe. Talvez não fosse a analogia mais adequada, mas passava a mesma sensação de calor. 
- Eu sujei sua blusa. – a menina olhou para um pequeno borrão preto na camisa branca do rapaz. Era uma boa idéia começar a comprar lápis de olho à prova d’água... 
- Não precisa se desculpar, Luinha. – a dureza de sua voz parecia ter amolecido depois do abraço. – Eu não me importo em lavar. 
- Mas eu me importo que você lave. – disse definitiva. – Você a sujou pra me consolar, então a responsabilidade é minha. 
- Eu não fui obrigado a fazer isso. – seu semblante era sério. – Fiz porque quis. 
A garota expirou lentamente, virando seu olhar pra ele. Foi descendo seu foco do rosto extremamente bonito do rapaz para seu pescoço um pouco grosso; depois para seus ombros largos, peito, até chegar à barriga. Imaginou Thur sem camisa, e, apesar de seu rosto esquentar, não se sentiu envergonhada: sentiu-se tentada, mordendo levemente o lábio inferior. 
Arthur tirou seu olhar da direção para admirá-la por alguns segundos. Luinha olhava para a região de sua barriga ou peitoral, com uma expressão provocante. O garoto riu baixo, ao perceber que ela não fazia de propósito. 
- Que foi? – Lua perguntou levando as mãos ao rosto. Tinha sido flagrada. Merda. 
- Nada. – ainda divertia-se. 
Ela bufou, cruzando os braços e tentando ao máximo enterrar seu tronco no assento. Sua face estava completamente ruborizada. 
- Gosto da cor da sua bochecha quando você fica envergonhada. – ele comentou, dando uma risada com gosto. 
- Vai à merda, Aguiar. – protestou. – Eu não estou envergonhada. 
- Ok, então. Quer mudar de assunto antes que cheguemos à parte boa? 
- Que parte boa? 
- O porquê do seu constrangimento. – sorriu malicioso. 
- Cala a boca. – ela rolou os olhos. - Vamos mudar de assunto. 
- Diga. 
- Vai à festa do Bennet? 
Thur voltou a ficar sério. 
- Detesto as festas daquele troglodita. 
- Por quê? 
- Muito sexo. Bebidas. Drogas. Tudo em excesso. 
- Eu vou. – Luinha disse simplesmente. Arthur apertou as mãos contra o volante. – Queria ir a pelo menos uma festa aqui na Inglaterra. Deve ser... Interessante. 
- Seu primo vai com você? – a dureza reapareceu em seu tom de voz. 
- Acho que não. O molengo não é muito de ir a festinhas assim... 
- Você vai sozinha
- Algum problema com isso, Arthur? – virou-se para o garoto. 
- Claro que não. – ele sorriu sombriamente. – Se você é do tipo que gosta de ser estuprada, vá em frente. Luinha gargalhou. 
- Sabe... até chegou a parecer que você estava preocupado comigo. 
- Claro que não. – disse seco. 
- Ótimo. Mas caso você estivesse... Eu te diria que eu vou com o Duan. 
- Com o Duan? - ele parecia incrédulo. 
- É. Ele é uma boa pessoa. – ela ficou um tempo em silêncio. Suas bochechas tomaram um leve tom mais rosado, então prosseguiu: - E se você fosse... Bem... Seria legal. 
- Isso é um convite? – Arthur arqueou uma sobrancelha. 
- Teria dado certo? 
O garoto sorriu e então respondeu: 
- Não. Continuo sem gostar dessas festas. 
Depois do sinal, a velocidade do carro ia diminuindo aos poucos ao virarem a esquina. Seguiram desacelerando gradativamente, até o veículo, por fim, parar num largo quarteirão: O da casa branca, de estatura mediana. 
Thur parou o Audi a alguma distância da casa. 
Luinha tirou o cinto dando um longo suspiro e abrindo a porta, já se impulsionando pra fora e ficando em pé, na calçada. 
Ia acenar em agradecimento, quando viu Arthur tirar o próprio cinto e abrir a porta, saindo e contornando o carro, em sua direção. A garota ficou sem reação por um momento, apenas observando-o se aproximar. O rapaz parou a centímetros de distância, com a respiração desuniforme e o olhar direcionado para seus lábios. 
- O que foi? – Luinha perguntou baixo, também olhando para a boca estranhamente convidativa do rapaz. 
- Você... – a voz dele falhou. ‘Porra, Thur! O que mesmo você está fazendo aqui?’ Pensou. – Você... 
- Eu? 
Arthur pigarreou, dando um passo para trás antes de cruzar os braços sob a barriga e puxar a barra de sua blusa pra cima, deixando à mostra, primeiro seu abdômen, depois seu peitoral, até por fim, se livrar dela. 
Luinha observou-o tirar a camisa estática e ao mesmo tempo, atraída. Seu estômago parecia estar em pleno inverno nova-iorquino, que se intensificava à medida que ele puxava a blusa pra cima. 
O abdômen e peitoral do rapaz pareciam ter sido esculpidos, e não eram, nem de longe, decepcionantes. Luinha encarava-o com as bochechas visivelmente coradas. 
- Você disse que ia lavar minha blusa. – Thur disse por fim, acordando-a de seu transe. 
- Ah...! – segurou o pano que estava na mão dele, completamente sem graça. 
Arthur observou a garota olhar para baixo, parecia preferir encarar tudo desde que não fossem seus olhos. Sorriu levemente ao ver a inocência que ela emanava. Espalmou a mão direita suavemente atrás da nuca de Luinha, puxando seu rosto para perto e dando-lhe um rápido beijo na testa. 
- Até amanhã. – sussurrou. 

Londres; Highgate High School; Quarta-feira; 5:11; 

- ‘Estou na boate com uma garrafa de champanhe. Tenho o que você quer pra ficar ligada.’ – Duan cantava uma das inúmeras músicas do 50 Cent de seu iPod, enquanto aproximava-se do seu Toyota azul-marinho. 
Seus cabelos dourados ainda estavam suados, fazendo com que a onda que eles normalmente formavam na frente ficasse desconfigurada. 
Já tinha apertado o botão pra abrir o carro, quando viu, pelo reflexo do vidro, uma garota correr na sua direção. 
- ‘Venha me abraçar se quiser...’ – cantou virando-se pra ela, mas assim que viu seu olhar enfurecido, calou-se. – Que foi, gata? 
Brittany inspirou profundamente antes de falar qualquer coisa. 
- Qual o problema? – ele insistiu, desconfiado. 
- É aquela novata. – falou com o maxilar tenso. 
- Novata...? 
- A vagabundinha parecida com a Iv. 
- Wow, wow, wow. Calma lá. – o rapaz levantou ambas as mãos. – Primeiro que você nem a conhece, e segundo: o que tem a Luinha? 
- “Luinha.” – disse em zombaria. – Acho que... Acho não! Tenho certeza de que ela gosta domeu Thur. 
- QUÊ? 
Duan fez uma expressão de espanto, que rapidamente foi substituída por uma séria e meditativa. Enrijeceu sua feição, encontrando os olhos tensos de Brittany. 
- Essa suposição tem algum... Fundamento? 
- Eles estavam se abraçando... – a loira disse devagar. – Atrás do ginásio. Quer fundamento melhor? 
O garoto começou a gargalhar, fazendo com que ela ficasse ainda mais nervosa. 
- Já faz um tempo que o Thur não abraça ninguém. Você quer que eu acredite que ele foi fazer isso logo com a novata? 
- Pague pra ver. – ela sorriu desafiadoramente, fazendo-o perder o humor. 
- Brit, ele não ia querer tomar a garota de mim. Ele é meu irmão. – falou convicto. 
- Então a reconquiste. Você resolve o seu problema e o meu ao mesmo tempo. – ela ficou um instante em silêncio, depois retomou sua fala, um pouco mais descontraída: – Eu já sabia que você devia estar interessado por essa garota. Ela é tão, tão... Seu tipo. – fez careta de nojo, colocando a língua pra fora. 
O rapaz deu uma risada cheia, por fim, entrando no carro. Abaixou a janela até que seus olhos novamente se encontrassem com o olhar felino de Brittany. 
- Pode deixar comigo, linda. – sorriu maroto. – A Luinha é minha
Deu a partida, deixando uma menina satisfeita para trás. 

Londres; Greenwich; Quarta-feira; 5:15; 

- Hein, Melzinha. – Chay dizia abraçando a cintura da namorada por trás e mordendo de leve seu pescoço. Estavam na sala do apartamento da garota. – Vamos pra praia. Minha família tem uma casa lá, onde podemos ficar sossegados. – trilhou beijos por sua nuca até chegar à bochecha. 
- Não sei se posso deixar a Evelin sozinha com o trabalho de geometria... – Mel franziu o nariz. 
- Esquece o trabalho de geometria, vai. Só por esse final de semana. – sussurrou. – Prometo que te faço esquecer. 
Mel se arrepiou, virando-se de frente pro namorado enquanto ria. 
- Ok, então. Só com a condição de você me fazer esquecer. 
- Pode deixar. Sou bom nisso. – Chay envolveu novamente a cintura da namorada, dando-lhe um selinho demorado. 
- Chay... – Melzinha disse contra seus lábios. – Em falar nisso... Eu tenho um plano pra recobrar a memória. 
- Em falar nisso o quê? – pareceu confuso, abrindo os olhos. 
- Em esquecer... 
- Ah! – juntou as sobrancelhas. – De novo essa história, Melzinha? Você não acha que isso te faz mal? 
- Fazer mal é ter a semana mais importante da sua vida esquecida! 
- Ok, amor. Não precisa ficar nervosinha. – puxou-a pra perto novamente. – Qual sua idéia? 
- Posso contar com você nessa? – perguntou desconfiada. 
- Pode contar comigo em todas. 
- Eu preciso ir com a Luinha nos lugares onde a Iv provavelmente esteve durante a semana. – estava séria. – Isso inclui: bares, ensaio das líderes de torcida, o quarto, a Drayton High School e... A mansão
- A mansão, Melzinha? – Chay pareceu espantado. – Tem certeza? Aquele lugar não te faz bem. Aliás... Não faz bem a ninguém! 
- Tenho certeza, Chay. – falou com veemência. - E você vai nos levar a esses lugares. 
- EU? 
- Você disse que eu podia contar com você... 
- Mas eu não sei se quero que você recobre a memória, Melzinha. – o rapaz estava tenso e seu olhar triste. – Pode trazer só mais sofrimento, e eu não quero te ver sofrer. Nunca mais. Já chega naquele velório... 
- Mas se eu não souber, vou sofrer pro resto da vida. – segurou o rosto do namorado entre as mãos. – Eu preciso de você. 
Chay ficou um tempo em silêncio, apenas fitando os olhos suplicantes da garota. 
- O que eu não faço por você?! – viu-a sorrir antes de envolvê-la em um beijo profundo. 

Londres; Oxford Street; Quarta-feira; 5:16 da tarde; 

Rod estava sentado na cadeira em frente ao computador da sala de estudos. Pesquisava qualquer coisa boba em um site de relacionamento da internet quando percebeu Luinha passar pela sala sem o cumprimentar. 
- Opa, opa, opa! – disse levantando-se e seguindo até a porta, fazendo com que a prima que andava no corredor virasse pra trás. – Cadê o meu “boa tarde”? 
- Boa tarde. – ela respondeu dando um sorriso discreto. 
Rodrigo observou as bochechas perceptivelmente mais rosadas da garota e seu olhar mais brilhante. Por certo algo tinha acontecido com ela. Algo que, mesmo que não soubesse o que era, incomodava-o profundamente. 
Sentia que a expressão iluminada da prima tinha a ver com aquele rapaz. Arthur. Só podia ter! Esse tipo de situação fazia os pensamentos de Rod revirarem-se em sua cabeça e seu estômago pensar em embrulhar. ‘Pobre Luinha.’ Pensou. ‘Tão inocente. Tão alheia aos assuntos dessa escola.’ 
- Pode deixar que hoje eu arrumo o jantar, molengo. – ela ofereceu, cruzando as mãos enfrente ao corpo, como uma criança. 
- Está de bom-humor, é? – sentia-se desconfiado. 
- Não muito. 
- Não é o que parece. Aliás, o que parece é que seu humor mudou radicalmente desde manhã. – arqueou uma sobrancelha. – Algum motivo em especial? 
Luinha observou o primo durante alguns segundos, deduzindo onde sua desconfiança queria chegar. Balançou os ombros e abriu a boca pra responder: 
- À toa. 
Virou-se de costas e voltou a andar em direção ao quarto, com um sorriso esperto querendo surgir em seu rosto. Lua tinha escondido a blusa larga de Thur dentro de sua mochila verde-limão, prevendo que o espanto e as perguntas de Rod seriam sufocantes se a visse. 
Entrou no cômodo jogando a mochila no canto e pulando de bruços na cama. Apertou o travesseiro contra o rosto e deixou que um sorriso surgisse devagar. 

Londres; Wimbledon; Quarta-feira; 6:32 da noite; 

Arthur esperava impacientemente o passar de andares do elevador. Um décimo segundo andar nunca lhe parecera tão distante. Talvez fosse apenas a ansiedade... Ou sua insaciável sede pela descoberta. 
Quando a porta do elevador abriu, deu passos longos e firmes até a porta de carvalho do apartamento 1203. Deu socos leves na porta. 
- Detetive Daves? 
O rapaz perguntou com o cenho franzido. 
Suas pernas estavam um pouco mais bambas depois da ligação que recebera aquela tarde.Ele tinha descoberto alguma coisa. Alguma coisa que, estando na pista certa, levaria às provas da culpa da pessoa que Thur julgava ser a mais desprezível da Terra. 
- Senhor Aguiar. – o homem grisalho com um terno marrom abriu a porta, fazendo sinal pro rapaz entrar. 
- E então, detetive Daves, o que descobriu? – perguntou passando uma mão na outra, com o nervosismo. 
- Preciso que o senhor sente, primeiramente. – apontou um lugar no sofá camurça. Arthur obedeceu. 
O local era pouco iluminado, deixando os traços dos rostos de ambos quase imperceptíveis. 
- Não me deixe ansioso. Por favor. 
- Lembra que o senhor pediu-me pra que fizesse um estudo sobre a família Andersen? – sentou-se, no outro sofá. 
- Claro. A família daquele homem. – Thur disse enrijecendo o maxilar com o nojo. 
- Creio que descobri uma coisa digamos... Digna de nota. – detetive Daves analisou o garoto, que agora parecia mais ansioso do que anteriormente. – Sem mais delongas. Tome. 
O homem pegou um envelope em cima da mesa e entregou-o nas mãos de Arthur, que parecia estático. 
- Quero que dê uma olhada nesses documentos. 

Quando Thur terminou de ler o conteúdo do envelope, sua fala parecia presa na garganta. Seus olhos estavam mais arregalados do que de costume, e sua mente trabalhava em grande velocidade, tentando achar alguma conexão entre os fatos. 
- Sally Andersen? – balbuciou com a voz sufocada. O detetive consentiu. – Tem certeza de que é a filha dele
- Tenho. – o homem estava sério. - Não acha um tanto... Curioso que ela tenha recebido tal tipo de tratamento justamente... 
- No hospital do meu pai?! – o rapaz completou, ainda em choque. 
- E além disso, olhe o custo do transplante. – esticou um dos seus dedos gordos pra apontar para uma parte do papel. – É impossível que um mero jar... 
- Tenha pagado por isso. – Thur novamente completou sua fala, sem esperar que o homem terminasse e postando-se de pé rapidamente. – Tenho uma ligação a fazer. 
Falou seco, soltando novamente o envelope na mesa de vidro em frente ao sofá.  


Escrito por : Lan

"Podemos nos defender de um ataque, mas somos indefesos 
a um elogio."

Sigmund Freud



Londres; Greenwich; Terça-feira; 7:04 da noite;

- Melzinha, eu não sei. – Sophia disse angustiada. – A Iv não quis me contar.
- Mas você não se lembra de nada sobre o dia? Não tem nenhuma pista? – a garota insistiu.
- Eu lembro que... – a primeira ficou pensativa durante alguns segundos. – Eu a encontrei chorando muito no quarto...
- Você sabe quando?
- Eu cheguei tarde em casa. Estava escuro e você não estava lá. – apontou pro cômodo com as sobrancelhas. – Provavelmente devia estar com o Chay. Eu estava com o mica. – falou mais baixo. – Achei que a Ivane estaria com o Thur também. Mas não. Eu a encontrei aos prantos no quarto... Ela estava vestindo o uniforme número dois, da torcida. – voltava à lembrança aos poucos.
Os uniformes da torcida eram divididos em um, dois e três. Eram modelos diferentes. O número dois, o qual Ivane usava no dia, era azul e preto, tão curto quanto os outros. Sophia se lembrava bem desse detalhe.
- Ela estava usando-o porque, se me lembro bem... – estreitou os olhos. – Mais cedo houve um jogo de futebol entre os Eagles e os Tigers...
- Da Drayton High School. – Mel completou, voltando ao primeiro flashback. – Quando aconteceu o jogo? Em que dia da semana?
- Talvez terça ou quarta. – mordeu levemente o lábio inferior. – Os Eagles ganharam. Último gol do Thur.
- Como você se lembra disso e não se lembra do dia? – estava impaciente.
- Porque os Eagles foram classificados pra final, nesse jogo. – fez uma pausa. – Desculpa,Melzinha. mica ficou animado com isso, por isso eu lembro. Eu não sabia que ia precisar lembrar disso algum dia.
- Tudo bem, Sop. A culpa não é sua... Você pelo menos se lembra de alguma coisa que ela tenha dito?
- Quando eu entrei no quarto ela estava ajoelhada, com a cabeça encostada na cama. Chorava alto e gritava algumas palavras sem sentido... Acho que ela gritou algo como... –Sophia juntou as sobrancelhas, repensando no que estava prestes a dizer. – “Ele me paga”. Tentei perguntá-la se ela queria alguma coisa, mas a Ivane não estava pra papo.
- Você foi dormir, depois?
- Acho que eu fui ao banheiro me trocar. Quando voltei, ela tinha saído.
- Pra onde?
- Não faço idéia. – a garota sentiu os olhos queimarem. Culpava mentalmente sua falta de atenção. Merda. – Eu tentei ligar no seu celular. Ela tinha deixado em casa. Preferi aguardar.
- E como ela chegou no dia seguinte?
- Ela chegou... – colocou o indicador no queixo. – Parecia que estava de ressaca. Com os olhos um pouco mais arregalados. Ainda estava com o uniforme da torcida.
- Vou procurar saber com o treinador Stevens o dia do jogo. – Mel respirou fundo.

Londres; Terça-feira; 7:21 da noite;

- O que você quer? – Duan perguntou grosseiro ao homem escorado na parede de um viaduto. Ele era magro e vestia um terno preto.
O loiro saía apressado do carro, dando passos pesados até a figura ali parada. Olhava-a com desprezo.
- Um carro novo. – ele sorriu. – Me cansei do meu.
- Olha aqui, seu idiota. – o rapaz segurou-o pega gola da camisa. – Eu já paguei o que você queria. Não abuse, senão...
- Senão o que, playboy? – deu uma risada de deboche. – Esqueceu do que eu tenho em mãos?
Duan olhou-o com raiva durante alguns segundos e soltou-lhe a camisa.
- Quanto você quer?

Londres; Dockland; Terça-feira; 10:32 da noite;

Arthur caiu na cama após tomar uma chuveirada quente e demorada. Estava com a toalha de banho ainda enrolada a cintura. Esperava o corpo esfriar.
Spike o olhava um pouco cansado. Tinham passeado por vários quarteirões, coisa que não faziam há muito tempo. O dono estava animado com alguma coisa, o cão podia perceber.
Thur fixou seus olhos no teto, respirando profundamente e deixando a mente rolar.
“- Tira o cinto. – disse por entre os dentes. Seus corpos estavam insuportavelmente próximos. Insuportavelmente colados.
- Você não consegue me obrigar, Arthur. – a garota deu uma gargalhada.”


Merda. Merda. Merda! Por que não conseguia obrigá-la? Uma coisa tão simples, tão banal. Facilmente teria dado esse susto em outra menina. Mas por que não nela? O que Lua tinha? O que Lua era? Por que não conseguia esquecê-la?
- Merda de garota. – virou-se para o lado, encarando seu criado mudo e dando de cara com um envelope surrado. Olhou-o por alguns instantes, estendendo sua mão para puxá-lo pra si.
Seus dedos tremeram ao abri-lo. Vacilou. Esperou até ter um pouco mais de coragem e fôlego para tentar novamente puxar seu conteúdo pra fora.
Observou o que o envelope guardava com o olhar mais arregalado, sentando-se na cama. Seus olhos ficaram quentes e seu coração bombeou acelerado, apesar de fraco. Sentia um embrulho forte no estômago ao olhar aquilo. Uma dor imensurável.
Começou a chorar compulsivamente, sendo interrompido por uma forte pressão na altura do diafragma e correndo pro banheiro, vomitando no vaso sanitário.
- Preferia estar morto! – gritou com a voz embargada pelos sentimentos. O cachorro o observava com pena, da porta. Thur olhou o livro vermelho na pia, dando uma risada baixa e triste. – “Acompanharei a ti em teu sono de morte”. – limpou a boca com as costas das mãos. Levantou a coluna que havia curvado em direção ao vaso e andou acelerado pra cozinha, onde abriu uma gaveta violentamente. Seus olhos se iluminaram com a lâmina afiada de uma faca. – “Serei a tua bainha”. – citou passagens de Romeu e Julieta, segurando o objeto de frente para o peito.
“- Você não é mal, Thur.”
“- Me mostre do que é capaz, Aguiar, e talvez, bem talvez, eu tenha medo de você. - ela gargalhou satisfeita. Mantinha um sorriso no rosto. O sorriso mais aconchegante que ele tinha visto até hoje. Nem Ivane fora capaz de reconfortá-lo tanto ao sorrir... Nem Ivane..."

Sentiu os dedos tremerem desvairadamente, permitindo que a faca escorregasse e caísse no chão.
- MERDA. – gritou. – O QUE É ESSA MENINA? – colocou as mãos nos cabelos. As lágrimas ainda rolavam quentes por sua bochecha. – Por que ela me perturba tanto? – seus olhos se encheram novamente com a lâmina, esticando a mão para voltar a segurá-la. – Eu não posso morrer agora, Iv. Não agora. – sua voz estava inconstante. Talvez se estivesse acompanhado no apartamento, apenas ele mesmo entenderia o que murmurava. – Eu te fiz uma promessa. Não posso ir ao seu encontro sem cumpri-la...

Londres; Oxford Street; Quarta-feira; 5:57 da manhã;

“Jogava uma bola vermelha para a pequena garota de cabelos loiros e enrolados. Ela sorria largamente. O dia estava ensolarado. Nada poderia dar errado...
Ela mandou a bola de volta dando uma risada melodiosa. Luinha segurou-a.
- Pega a bola, hein? – dirigiu-se a menina, que concordou com a cabeça. – Lá vai! – mandou-a um pouco mais forte, para que ela não pegasse. A brincadeira ficava sem graça se ninguém deixasse o objeto cair. Teriam que ser mais competitivas.
A bola voou longe, fazendo a menininha olhá-la e em seguida gritar pra Lua, com uma expressão doce:
- Tudo bem, maninha. Eu vou pegar!
De repente, o sonho ficou escuro...”


- LILY! – gritou abrindo os olhos e sentando-se imediatamente na cama. Estava ofegante e suava frio.
A garota estava com o nariz entupido. Tinha chorado durante o sono.
'Foi um sonho...’ Pensou aliviada.
- Luinha! – Rod adentrou o quarto apavorado, tropicando antes de se sentar na frente da prima e segurar-lhe os ombros. – O que foi? – o garoto usava uma calça de pijama preta com a blusa azul. Seus cabelos estavam bagunçados.
- Eu tive aquele sonho de novo. A Lily, ela... – falava depressa, sendo interrompida por um soluço.
- Shhh, calma. – abraçou a prima apertado, segurando sua cabeça cuidadosamente, porém firme, contra seu ombro. Podia sentir o choro dela molhar sua blusa.
Ele fechou os olhos durante um momento. Respirou fundo enquanto seu coração amolecia. Droga. Por que as coisas tinham que ser daquela forma? Por que Luinha tinha que ter passado por isso? Por que ela não emendava de uma vez e se afastava de Thur? Não tinha medo de sofrer novamente?
A garota murmurava seu nome baixinho, entre soluços e gemidos. Rod sentia-se mais impotente a cada vez que ela fazia isso.
- Calma, minha baixinha. – sussurrou, afagando seus cabelos. – Eu estou aqui.
Luinha apertou as mãos na blusa do rapaz, com o coração ainda acelerado pelo sonho. Talvez aquelas lembranças ruins tivessem sido estimuladas pelos acontecimentos da noite anterior. Pela sua conversa com Avril.
De uma hora pra outra as lágrimas que surgiam não estavam mais relacionadas à pequena menina. Seu choro tomou uma altura mais elevada.

Londres; Greenwich; Quarta-feira; 7:20 da manhã;

- Sop! – ouviu Melzinha chamá-la. Estava dentro do banheiro, olhando trêmula para seu reflexo no espelho. Seus olhos estavam circulados de vermelho e o chão lhe parecia escapar.
Amaldiçoava-se pelo dia que tinha tido a idéia de deixar sua casa, tão bem localizada ao sul do país, para estudar na Highgate. Mas seus pais tinham aprovado a idéia, afinal, era a capital, e tinham toda condição financeira pra arcar com os gastos. Droga. Agora estava nessa.
- Chay já chegou. – a amiga gritou novamente, mas sua voz parecia mais próxima. Mel colocou a cabeça pra dentro do banheiro, observando a garota apertar os olhos com força, escorada sobre a pia.
- Pode ir, Melzinha. Depois pego um táxi. Estou passando mal. – respirou profundamente.
Mel olhou-a preocupada, durante alguns instantes. Depois, entendendo que a menina precisava de um tempo sozinha, assentiu.
- Melhoras, hein?

Londres; Highgate High School; Quarta-feira; 7:50 da manhã;

- Desculpe se chegamos mais tarde, molengo. – Luinha disse ainda sentada no banco do carona, enrolando nervosamente uma mecha de cabelo com a ponta do dedo.
Teve que passar de leve um lápis preto em torno dos olhos, pra esconder o inchaço causado pelo choro compulsivo.
Rod estava em uma posição mais rígida do que de costume, tirando seu cinto de segurança. Seu cenho franzido indicava preocupação.
- Baixinha... - começou a falar, mas se interrompeu durante alguns segundos. – Tem certeza de que é só a história do sonho que está te incomodando?
Ela engoliu a seco, mordendo o lábio inferior.
- Não quer falar sobre isso?
- Desculpe, Rod, mas eu... – sentiu os olhos queimarem com as lágrimas que estavam se formando novamente.
- Não se force. – abraçou-a de lado. – Vamos. O sinal vai tocar.

Clic. Clic. Clic.
O barulho da máquina fotográfica fez o garoto da pele um tanto amarela e aparência doente dar um largo sorriso. Fotografava um casal que saía de um carro prateado. Mais especificamente, a menina que saia do veículo: Cabelos longos, um belo sorriso e ondas perfeitas nas quais adoraria se afogar. Ela não tinha ido embora. Ele sabia.

- Molengo, pode ir na frente, preciso conferir onde está minha agenda. – parou apoiando a mochila na cintura e abrindo-a.
- Esqueceu os horários? – o primo perguntou um pouco mais leve.
- Esqueci.
- Já sabe o caminho, certo? – arqueou uma sobrancelha.
- Claro. Não se preocupe. – sorriu amarela. O rapaz se curvou pra beijá-la carinhosamente na testa. Seguiu pela calçada no pátio do colégio, rodeada por grama, até as escadas da entrada principal.
Luinha abriu a mochila desajeitadamente, de forma que o pequeno caderno – a agenda – caísse no chão. Soltou um longo suspiro enquanto abaixava-se para pegá-la. Quando começou a voltar a coluna para o lugar, passou os olhos rápida e significativamente a sua volta, fixando-se em um local.
Estreitou os olhos pra poder enxergar melhor. Uma pessoa estava encolhida atrás da escada. Uma pessoa... Que ela conhecia...

Sophia abraçava forte o joelho, enquanto tentava fazer a respiração “cachorrinho”. Seu rosto estava completamente vermelho, seu corpo mole e as lágrimas descontroladas.
Espremia-se contra a parede, tentando ao máximo não ser vista por ninguém. Provavelmente não seria. Nenhum dos alunos costumava chegar tarde na Highgate... Nenhum que se lembrasse.
‘Merda! Por que isso agora? O que eu fiz pra merecer?’ Perguntava-se mentalmente, sentindo falta de ar pela rapidez a qual respirava. Apertou as mãos contra os olhos, desejando mais do que tudo que desaparecesse dali.
- Está tudo bem? – ouviu uma voz serena perguntar. Sophia engasgou com o susto e o choro, virando seu olhar arregalado para uma garota a sua frente.
Cerrou os lábios numa linha, com uma mistura de vergonha e desaprovação. – Você é a amiga da Melzinha, certo? – a menina sentou-se tranquilamente ao seu lado.
Os olhos de Sophia ainda estavam alagados pelo choro, seu corpo inteiro tremia.
- P-por favor. – disse fechando os olhos e respirando fundo. – Não conte a ninguém que me viu aqui.
- Já não estava pretendendo fazer isso mesmo. – Luinha deu de ombros, ajeitando as costas no concreto cinza da escada. – Só achei que talvez você quisesse um ombro pra chorar.
Sop olhou-a durante alguns segundos, sendo consumida pelos sentimentos e enterrando seu rosto no ombro de Lua. Começou a chorar alto. Nada a impediria de expelir aquela dor que sentia no peito.
- Shhh... – a menina abraçou-a pelo lado, reconfortando-a. – Vai dar tudo certo.
- Não, não vai. – devolveu um pouco esganiçada, gemendo com a tristeza.
- Como pode saber?
- Como você pode saber? – tirou o rosto de cima do ombro da garota. – Você nem me conhece.
- Mas eu conheço alguém que a ama muito. – Lua ainda não havia perdido seu tom tranqüilo. Apesar de também estar entupida de problemas e sofrimentos, compreendia que o desespero maior agora era da menina sentada ao seu lado. – E não há como tudo ser ruim quando temos alguém que nos ama. O mundo fica... Melhor...
- Desculpe-me, moça. – Sophia riu irônica. – Mas ainda não encontrei esse alguém. Provavelmente nunca mais vou encontrar. – cuspiu as palavras, com raiva.
- Óbvio que vai. Nem está tão difícil de achá-lo quanto você pensa. – Lua olhou através da garota, para um rapaz que chegava atrasado, desajeitado. Seu cabelo estava bagunçado, a gravata frouxa e corria desengonçadamente. Seu rosto pálido e assustado a reconfortava. Apesar do pouco tempo que estava na escola, já podia considerá-lo um amigo. Como o menino realmente era.
Apontou-o pra Sophia com o queixo. Ela virou seu rosto devagar, para ver a quem se referia.
mica.
- Está louca. – deu outra risada um tanto histérica, enquanto o rapaz entrava na escola sem as perceber ali. – Ele seria a última pessoa do mundo que me amaria.
- Não é o que parece. – sorriu levemente. – E eu sei que não é assim.
- Você não sabe de nada sobre mim. – Sophia respondeu grosseira. Depois engoliu a fala, arrependendo-se de como tinha saído seu tom. – Me desculpe. Mas você nem sabe meu nome.
- E qual é? – ainda espelhava paz.
- Sophia. – disse sem graça. – E o seu é Lua. – completou.
- Não sabia que era famosa assim. – Luinha disse numa tentativa de bom humor, mas ela sabia muito bem que seu estado de espírito era incapaz de acompanhar sua tentativa.
- Mel fala muito de você. – observou a paisagem a sua frente, passando os olhos devagar pelas quadras e pelo ginásio poliesportivo.
- Ela sabe o motivo do seu choro?
- Ninguém sabe. – Sophia apoiou-se nos calcanhares, impulsionando-os e ficando de pé rapidamente.
Com a rapidez de seus movimentos, seu estômago embrulhou e sua vista escureceu-se, fazendo-a perder o equilíbrio. Prendeu a respiração, já prevendo que se chocaria fortemente contra o chão, mas antes que isso acontecesse, sentiu dois braços firmes mantendo-a de pé.
- Eu sei que você está chateada, mas vamos com calma, ok? – Luinha disse com o cenho franzido de preocupação, segurando a garota pelo braço.
Sophia olhou-a agradecida e suplicante ao mesmo tempo. Seus olhos ainda estavam lustrosos e as pernas moles. Seu estômago embrulhou ainda mais ao ver a expressão do rosto de Lua. Tão pura, tão lisa, tão... Familiar. Sentiu o diafragma se contrair.
- Meu Deus. – Luinha disse falha, ao ver a garota se curvar pra frente. – Vamos procurar um banheiro. Urgente.
Apoiou-a com o braço, andando apressadamente até o banheiro do ginásio. A senhora Campbell as deteria se tentassem entrar pela porta da frente, e ao invés de ir ao banheiro, teriam que responder ao atraso na diretoria.
Os passos de Sop e Luinha estavam sincronizados enquanto pisavam na grama. Uma das garotas estava com a expressão séria e um tanto aflita. A outra empalidecida e assustada.

Rod e Chay levantaram-se de suas carteiras quando foi dada a permissão do professor. Naquele dia teriam uma palestra qualquer na sala de vídeo.
Já esperavam que fossem duas horas desperdiçadas com um assunto maçante que viam desde o primário. Algo como: “Aquecimento Global” ou um Power Point mal feito com o título “Não Use Drogas”. Será que os professores nunca se dariam conta que eles lecionavam na Highgate? Será que nunca se dariam conta de que palestras azucrinantes repetindo sempre as mesmas coisas: ‘Não fume’, ‘Não use sacolas de plástico’, ‘Não use drogas’ e ‘Não se envolvam com marginais’, simplesmente nunca seriam realmente eficazes com os alunos daquela escola?
- Estou pensando em roubar a Melzinha esse final de semana. – Chay disse abrindo um sorriso discreto, enquanto seguiam a massa de alunos pelo corredor. Senhor Walker estava logo atrás deles.
- E deixar a Sop sozinha no apartamento? – Rod e Chay sentiram alguém os abraçar por trás. Pela grossura nem tão fina dos braços e o cheiro de desodorante que se espalhou pelo ambiente, concluíram de quem se tratava. – Show.
- De onde você surgiu, peste? – Chay resmungou, empurrando o braço do amigo.
- Se quiser eu explico. – mica limpou a garganta. – Um belo dia papai e mamãe não tinham nada de bom pra ver na televisão. Então resolveram fazer algo que não vai ser muito diferente do que você aprontará com a Melzinha esse final de semana...
- Era pra ser uma piada? – Rod estreitou os olhos.
- Não teve graça? – os dois rapazes rolaram os olhos. – Ok, eu digo de onde surgi: A palestra hoje é pra turma C e D.
- Aumentaram a zona de tortura, é? – Rod disse rabugento, depois olhando para os dois amigos um pouco avoados. – Droga, gente. – protestou. – Detesto quando vocês arrumam algo realmente interessante pra fazer no final de semana. Eu fico me sentindo meio...
- Encalhado? – mica sugeriu.
- Em palavras grosseiras – ressaltou. –, sim.
- Você tem a Lua vinte e quatro horas por dia dentro de casa. – Chay comentou. – Não sei do que está reclamando.
- É, dude. – mica balançou a cabeça afirmativamente. – Aproveita pra já dar aquele ‘approach’.
- Deixem de ser ridículos. – impacientou-se. – A Luinha pode ser o quão gata e gostosa Deus quiser, mas ela é minha prima mais nova.
- Eu já peguei minha prima. – Micael deu um sorriso pervertido.
- O que não significa que eu vá pegar a minha. Além do mais... A Luinha tem namorado, e eu não pareço ser o tipo dela. – suspirou, colocando as duas mãos nos bolsos.
- Então quem é? – Chay perguntou.
A porta de uma das salas mais a frente abriu-se devagar, e logo um garoto com a silhueta conhecida saiu por ela. Seus ombros largos e olhos opacos faziam alguma parte do cérebro de Rod entrar em estado de alerta. Ele não prestava.
Thur olhou os três rapazes que andavam pelo corredor de relance. Estava como sempre: Mangas arregaçadas, gravata frouxa, cabelo bagunçado. Soltou um suspiro pesado ao sentir a expressão de cada um dos garotos sobre si: Rod desconfiado e com a feição um tanto colérica, mica sorrindo largamente, como se o cumprimentasse, e Chay inexpressivo, nem contra, nem a favor de sua presença.
Ele. – Rodrigo rosnou quase imperceptivelmente, pouco depois de já terem passado porArthur.
- Não vejo muito problema com isso. – Micael deu de ombros. – Ele é o meu ídolo.
- Só porque ele te salvou de um assaltante não quer dizer que ele seja uma boa pessoa,mica.
- Ele ofereceu o Audi dele por mim. – o menino disse ainda maravilhado. – Tem idéia de quanto custa AQUELE Audi?
- Grande parte dos alunos dessa escola tem carros com o mesmo preço. – Chay intrometeu-se.
- Mas quantos o ofereceram por mim? Hein? Hein? Hein? – mica levantou o dedo indicador. – Além do mais, ele já não salvou a vida da Luinha uma vez? Você deveria estar agradecido,Rod.
- Eu simplesmente não consigo me acostumar com a idéia de que ele seja o mocinho. – mordeu nervosamente o lábio inferior.
- Dizem que o lobo-mal também se esconde em pele de cordeiro. – Chay deu um sorriso divertido com sua comparação.
E está pronto pra atacar a ovelhinha.
Adentraram a sala de vídeo passando os olhos rapidamente pelo local e observando o título do Power Point projetado na parede.
“Sexo Consciente”. Já deviam imaginar...

- Por favor. – Sophia dizia em um tom desesperado, dentro de uma das divisórias do banheiro. Lua estava atrás da garota, segurando seus cabelos e com o olhar pesado. – Por favor, não conte isso pra ninguém. – ainda chorava, com o rosto em cima do vaso sanitário e um dos braços escorado na parede de ladrilhos. – Minha vida vai acabar.
- Pare de se dizer isso o tempo todo. Sua vida não vai acabar. – expirou rapidamente, um pouco irritada. – Você fala como se isso fosse algo ruim.
- É algo péssimo. Imagine se fosse com você!
- Claro que eu ia ficar assustada a princípio... – olhou o nada, cogitando a hipótese. – Mas depois ia acabar aceitando e gostando da idéia.
- Minha vida acabou. – Sop deu um gemido alto. – Obrigada por estar aqui, Luinha. De verdade. Não sei o que seria de mim sem você.
Lua comprimiu os lábios durante alguns segundos, permitindo que sua mente viajasse até determinada pessoa.
mica.
Imagine se ele soubesse...

Londres; Highgate High School; Quarta-feira; 4:42 da tarde;

A aula de educação física estava sendo um desgaste. Talvez isso se devesse ao fato de queLua não conseguia tirar da cabeça do ocorrido com Sophia – que no momento, já estava em casa.
Tinham ficado no banheiro feminino até metade do segundo horário, quando por fim, a senhora Campbell as encontrou.
A diretora deu permissão pra que Sophia voltasse para casa, e quanto a Luinha... Bem, ela teve que voltar às aulas, por menos que conseguisse prestar atenção. Fosse pelo problema de Sophia, ou por seu próprio problema...
Enquanto as meninas davam mais duas voltas correndo na quadra, Luinha dirigiu-se até a treinadora, pedindo sua permissão pra ir tomar água. Não que estivesse com muita sede. Não estava. Queria respirar ar fresco, colocar as idéias no lugar. Pensar sobre Sophia e, talvez com mais urgência, em Nick...
Ajeitou o pequeno short preto enquanto caminhava até atrás do ginásio. Seu coração estava apertado e um turbilhão de pensamentos infestava sua cabeça como um enxame de vespas. Pensamentos ruins. Contornou a parte de trás do ginásio, que agradeceu a Deus por estar vazia. Deserta.
Caminhou até o bebedouro, escorando suas costas na superfície áspera da parede ao seu lado e permitindo que seu corpo escorregasse devagar. Luinha encaixou a cabeça entre os joelhos, e deixou que as lágrimas rolassem.
Nick estava namorando. Namorando alguém que não era ela. E ainda uma das meninas que era sua amiga no Brasil. O pior nisso? Já fazia algum tempo. Ele não havia nem esperado que ela se acomodasse na Inglaterra. Droga.
Lua afogava-se nas imaginações dele com outra garota. Abraçando outra garota. Beijando-a. Suas lágrimas ainda rolavam e alguns gemidos abafados começavam a sair por sua boca. Por que teve que se apaixonar por aquele idiota?
Continuou assim por um tempo, até ouvir um assobio que, a princípio estava distante, mas começava a se aproximar. De uma hora pra outra, o som estava próximo demais para que ela pudesse se recompor a tempo da pessoa não vê-la.

Thur admirou a garota que abraçava os joelhos. Seus cabelos estavam jogados de qualquer forma pelos ombros, enquanto seu rosto escondia-se entre as pernas. Seus ombros balançavam pra cima e pra baixo como se ela estivesse... Espera. Ela estava chorando?
O coração de Arthur bateu pequeno ao ver a cena.
- Oi. –disse sem encará-la, tornando sua visão para o bebedouro.
Luinha virou seu olhar para ele com os olhos e o nariz vermelhos.
- Ah, ótimo. – disse irônica. – O que você quer agora? Assaltar minha gominha de cabelo?
- Não seria uma má idéia. – ele devolveu a risada. – Vejo que está de mau humor. – aproximou a boca da água que saia da máquina.
- Desculpe. Não consegui me igualar ao mestre. – a garota rolou os olhos impacientemente.
Arthur deu uma risada com gosto, olhando para ela e seguindo em sua direção. Lua sentiu-se desconfortável ao vê-lo sentar ao seu lado.
Ficaram um momento em silêncio. Thur encarava o vazio. Luinha tentava normalizar sua respiração.
- Há algumas pessoas... – o rapaz quebrou o quieto momento. – Que combinam com a solidão. – Lua reergueu a coluna, começando a olhar para frente e a prestar atenção nas palavras de Thur. Sua voz estava terna e constante. - Esse é o meu caso. Há pessoas que combinam com a tristeza. Com a saudade... E olha! – fingiu surpresa. – É o meu caso também... Há pessoas que combinam com as lágrimas. E esse, definitivamente, não é o seucaso.
Luinha deu uma risada baixa e sem humor.
- Esse foi seu jeito de pedir pra eu não chorar? – Arthur esboçou um sorriso ao ouvi-la dizer essas palavras.
- Funcionou.
- Eu vou voltar a chorar assim que você sair daqui, Aguiar. Não se dê ao trabalho.
- E quem disse que eu vou sair daqui? – fez sua cara desafiadora.
- Por que não sairia? – a garota arqueou uma sobrancelha, virando seu olhar pra ele durante um momento.
Arthur ficou alguns segundos em silêncio, ponderando algum pensamento e fazendo com que seu aspecto ficasse sério novamente. Delineou um sorriso frouxo e respondeu:
- Porque você voltaria a chorar.
Lua fechou os lábios lentamente, ao mesmo tempo em que respirava fundo. Seu coração bombeou como se estivesse sendo acariciado, lhe trazendo uma sensação boa. O rapaz permanecia imóvel ao seu lado.
Olhou-o pelo canto do olho. Arthur nunca havia lhe parecido tão próximo e tão distante ao mesmo tempo. Tão inalcançável.
- O amor às vezes trai a gente. – comentou.
- Por que diz isso? – Thur contemplou a posição da garota: abraçando os joelhos e com o rosto um pouco assustado.
- Lembra que... Uma vez eu disse que estava apaixonada por um rapaz do Brasil? – ele assentiu inexpressivo. – Ele era meu namorado. Nick. Já estávamos juntos há mais de um ano... E eu... Bem, eu realmente gostava dele. – seus olhos encheram-se d’água. – Ele não concordou quando eu disse que viria pra Inglaterra. Mas eu prometi que não iria esquecê-lo enquanto estivesse no exterior... Pensei que a promessa valeria pra nós dois... – uma lágrima fugiu de seu olhou direito.
- E ele te decepcionou. – concluiu.
- E ele me decepcionou. – sorriu fracamente, concordando. – Ele está namorando uma garota que era minha amiga no Brasil. E já faz algum tempo.
A mente de Luinha fazia projeções do rosto do ex-namorado. Do rosto fino e elegante de Nick. De suas feições que tinham ficado impregnadas em seu cérebro.
- Ele nem esperou que eu me acomodasse aqui. – soluçou, parando de tentar lutar contra as lágrimas, que já vinham em série.
A menina colocou-se de pé apressadamente, apertando as mãos contra os olhos.
Lua não queria que Arthur a visse desabar. Seria a ruína de sua pose de ‘corajosa’. De ‘desprendida’.
Seus joelhos fraquejaram na mesma hora que teve a idéia de correr. Mas esse pequeno problema não a impediria de sair dali. Não mesmo. Aguiar não a veria chorar. Não podia ver. Impulsionou o corpo com força pra frente, esperando que se impulso fosse o suficiente pra que ela saísse do lugar. Seus olhos ainda estavam espremidos. Ela os abriria assim que sua corrida fosse consumada.
Assim que seu pé encostou-se ao chão e estava pronta pra tomar velocidade, seu corpo foi impedido por uma força maior, puxando-a pelo braço no sentido contrário.
Os milésimos de segundo que se passaram foram um tanto confusos pra ela. Estava prestes a começar a correr quando sentiu algo agarrar-lhe o braço. Os momentos depois disso foram vagos: viu a paisagem girar ao seu redor enquanto retrocedia rapidamente, sendo puxada. Tudo pareceu apenas um borrão, até que seu olhar se fixou numa superfície branca que estava cada vez mais próxima. Mais próxima e mais próxima, até que seu rosto se enterrasse sobre ela. Era macia.
Quando deu por si, dois braços fortes se fechavam a sua volta. Quentes e protetores. Acolhendo-a como se quisessem escondê-la de algum perigo, ou apenas acamá-la. ArthurAguiar a havia puxado para um abraço.
Um abraço.
- Finalmente em meus braços. – Thur sussurrou, fazendo-a arrepiar. Puxou Lua ainda mais pra si, mas receando que pudesse sufocá-la.
Seu receio esvairou-se quando sentiu as duas mãos da garota espalmarem-se em suas costas, retribuindo o abraço repentino.
- Obrigada. – a voz de Luinha saiu abafada pela camisa branca do rapaz.
Ele não respondeu nada, apenas saboreando as batidas arrítmicas de seu coração.

Kimberly tinha matado a aula de educação física pra molhar a garganta com cerveja, em um bar perto da escola. Caminhava despreocupada pela calçada do colégio, quando algo lhe chamou a atenção. Um casal.
Esfregou os olhos uma vez, pensando ver uma miragem. Quando percebeu que se tratava da realidade, esboçou um sorriso maldoso:
Dejavú? 



Escrita por : Lan



" O essencial é invisível aos olhos; só se vê bem com o coração !"
Saint Exupéry
 



Londres; Oxford Street; Sábado; 7:17 da noite;

“Ei, Nick.
Você deve estar estranhando minha demora pra lhe escrever alguma coisa. A verdade é que eu não sabia exatamente o que escrever. Agora eu sei...
Se há alguma coisa que mexeu comigo e que eu aprendi vindo pra Inglaterra é que você deve cuidar muito bem do seu amor... Antes que ele escape por entre seus dedos ou se vá para sempre. É uma lição bonita, não? Pra quem ainda tem tempo de aplicá-la... Eu, felizmente, tenho.
Hoje mesmo estava lembrando de você. Não que eu já não faça isso frequentemente, mas hoje foi especial. Era como se você estivesse aqui... Fiquei com saudades. Queria te ver...
Bem, acho que já tenho que ir. Rod e o tio estão me chamando na cozinha.
Espero notícias e... Nick...
Nunca se esqueça que eu te amo,

Luinha.”


A garota desligou o computador, passando os dedos entre os cabelos lisos e suspirando. Estava sentada à cama, onde tinha passado um bom tempo pensando nas palavras de Thur:“Somos separados por um abismo muito maior que o oceano”.
O namorado estava no Brasil. Ainda pensava nele antes de dormir, e era uma figura que sempre aparecia em seus sonhos.
Não podia dizer com toda certeza que o amava, afinal, o que era o amor? Mas com certeza ele era alguém que significava algo especial pra ela. A quem ela tinha um carinho imenso.
Calçou os chinelos e desceu as escadas para a cozinha, assim que tio John gritou por ela novamente.

Londres; Dockland; Sábado; 7:23 da noite;

“Você em seu mundo, separado do meu por um abismo. Ouça, me chame e eu voarei para seu o mundo distante.” Estava sentado a frente da vidraça, com o cachorro Spike.
A voz de Lua ecoava por sua cabeça, traduzindo uma música que tinha um significado tão peculiar pra ele. ‘Voarei para o seu mundo distante.’ Pensou, fechando os olhos e se perdendo em lembranças.

“- Hey, qual é. Pare de se fazer de difícil. – disse dando um sorriso tarado, seguindo-a em direção aos fundos do ginásio. Era após um jogo de campeonato de futebol dos Eagles. Estava completamente escuro.
A garota vestia o uniforme azul e branco de torcida da escola: colado e curto. Esboçava um sorriso maroto, fazendo sinal com o dedo para que ele a acompanhasse.
- Nem vem, Aguiar. Você acha que tem alguma chance comigo? – deu uma gargalhada alta. – Sou demais pro seu caminhãozinho.
O garoto viu-a escorar na parede, postando-se a sua frente. Estavam sozinhos ali, e os únicos sons que preenchiam o local, fora a voz dos dois, era da música do campo, bem longe de onde estavam.
- É isso o que vamos ver. – Thur espalmou as mãos em sua cintura, juntando seus lábios. Sentia a garota sorrir enquanto suas línguas se tocavam rapidamente.”


- Acabou, amigão. – observava as luzes de Londres. A vidraça era como um grande espelho que ocupava uma parede inteira. Olhou os carros passando andares a baixo... Muito a baixo. Teve um pensamento que fez o coração acelerar. É... Talvez fosse o que devesse fazer.
“- Você não sabe nada sobre mim.
- Que tal começar a me contar? – ela deu um sorriso doce”

‘Essa garota...’ Sorriu sombriamente, passando as mãos pelos pêlos dourados do cachorro.
- Tudo é negro para minha vista se você não está comigo, aqui. – traduziu outra parte que lembrava da música, cerrando os olhos antes que começassem a arder.
O cômodo ficou em silêncio durante um largo momento, até que uma voz conhecida e esganiçada rompesse por seus ouvidos.
- Mar-ga-ri-da! – ouviu pancadas na porta do apartamento. – Trouxe pizza pra gente comer. Vai abrir ou não?
Levantou-se amargamente, dando passos pesados naquela direção.
- Às vezes você é um pouco irritante demais, Duan. – disse abrindo a porta e já vendo o rapaz entrar à vontade. Thur estava sem camisa, com uma calça de pijama longa e cinza.
- Pizza de peperoni. Sua favorita, não? – o loiro colocou a caixa com a pizza em cima de uma bancada de mármore improvisada na “cozinha”. – Você está um pouco pra baixo, achei melhor eu, em toda minha gostosura, vir aqui te animar.
- Hm. – respondeu desinteressado, sentando-se, assim como o amigo, em um dos bancos em frente à bancada.
- Olha que delícia. Ardidinha. – Duan abriu o pacote, deixando o cheiro se espalhar pelo ambiente e o cachorro inflar as narinas com o aroma.
Esse pegou um pedaço sem cerimônias e encheu a boca com o mesmo, sorrindo satisfeito.Arthur, enquanto isso, se lembrava de um pequeno momento vivido na escola, e não hestiou em perguntar sem mais nem menos:
- De onde você a conhece? – apoiou o cotovelo na bancada.
- Quem? - Duan perguntou com a boca cheia, pensando se tinha perdido parte do assunto.
- Lua.
- Ah. Ela é amiga da Mel. – balançou os ombros. Thur sentiu o coração bombear calor pro resto do corpo.
- Só isso? - arqueou uma das sobrancelhas, estranhando sua própria curiosidade.
- Ela é muito gata. – o loiro voltou a dar uma mordida cheia na fatia. – Por quê? Está interessado? Senão é toda sua...
Não. Pode ficar se quiser. – respondeu friamente.
O amigo estava com a bochecha cheia, analisando-o e medindo a verdade em suas palavras. Como não viu hesitação, apenas ignorou e continuou com seu lanche.

Londres; Highgate High School; Segunda-feira; 10:30 da manhã;

Estava na hora da troca de horários na Highgate High School. Os alunos foram para os corredores em direção a seus armários, para trocar seus livros e mudar de sala.
- Borges! – o rapaz ouviu Sophia gritar, acelerando ainda mais os passos para longe dela. –Borges! – sua voz estava furiosa, assim como sua mão, que lhe agarrou o braço forçando-o a se virar pra ela.
A garota olhou com um misto de nojo, pena e raiva para o corte na sobrancelha do menino.
- Ethan me contou o que aconteceu... COMO ASSIM você se atreve a bater no meu namorado? Sem mais nem menos? – colocou as duas mãos na cintura. – Você bebe?
- Bebo. – mica disse tão irritado quanto. – Mas ele mereceu. E aposto também que o namoradinho não contou a história inteira...
- Que história inteira? – Sop franziu o nariz, com a voz já estridente.
- Olha isso antes de falar alguma coisa. Se você é tão boa, já devia ter suspeitado. – Micael disse alto, tirando do bolso o celular e mostrando para a garota uma foto: Ethan agarrando-se com outra no canto do pub. – Se quiser, pode conferir a data. Tirei porque depois não ia ter como provar.
- Isso é... – a voz dela falhou. Seus olhos ficaram quentes e marejados.
- Você é uma corna, e eu só te fiz um favor. – mica expirou mais devagar, esperando alguma reação dela como um beijo, ou no mínimo um "obrigada", que acabou por sair completamente contrária. Sophia meteu-lhe um tapa no rosto.
- Corna duas vezes, então. – disse com a voz embargada pelo choro e saindo de perto dele com passos acelerados.

- Lindo quinteto de dedos na sua bochecha, mica. – Rod comentou na hora do intervalo, fazendo Chay gargalhar. Mel e Lua estavam na fila da cantina.
- Ela não acredita em mim. – resmungou.
- Eu também não acreditaria. – Chay manifestou-se. – Dadas as circunstâncias...
- Estou dizendo, dude. Armaram pra mim. Eu não fiz aquilo!
- Ok, mica. – Rod fez cara de tédio. – Vamos supor que você não tenha bebido e feito aquilo sem pensar. Quem teria armado pra você e com que propósito?
- Eu não bebi. – o garoto expirou impaciente. – Primeiro porque mesmo estando bêbado eu tenho consciência dos meus atos... Ou pelo menos me lembro deles... E segundo porque no dia seguinte nem de ressaca eu estava.
- Tudo bem, gênio. – Chay encheu a boca de batatas fritas. – Quem armou pra você, então?
Kimberly. – disse o nome com raiva.
- Por que ela teria feito isso?
- Porque... Ela. Gosta. De mim. Oras! – falou soletrado, fazendo com que os amigos o encarassem durante um tempo, depois caindo na gargalhada.
- Custamos a acreditar que a Sophia caiu na sua laia, dude. Kimberly já é demais. – Marques colocou a mão no abdômen.

- Luinha... – Mel disse segurando o braço da garota enquanto estavam na fila, fazendo-a a encarar. – Preciso conversar com você.
- Diga.
- Eu... – media palavras. – Meio que... Preciso da sua ajuda.
- Estou a sua disposição. – a outra deu um sorriso meigo. – Em quê precisa? Literatura? História? Problemas amorosos com Chay? – brincou, fazendo a amiga rolar os olhos. Depois de algum tempo em silêncio, o semblante de Mel se alterou completamente, do brincalhão para o sério.
- É um assunto... Grave. – abaixou o tom de voz.
- Ok, você está começando a me preocupar... – O que poderia ser?

- “É uma infelicidade da época que os loucos guiem os cegos.” – Thur disse sentado ao lado de Lua, na aula de literatura. Suas cadeiras estavam juntas e eles tinham conseguido manter uma conversa agradável sobre o trabalho, até então. – Gosto de Shakespeare.
- Eu também. – a garota apoiou o cotovelo na mesa e o rosto na mão. – Era uma pessoa que sabia o que dizia... – um breve silêncio se instalou entre os dois.
Lua relembrou os dias anteriores, pensando no quanto tinha se sentido bem ao receber a carona de Arthur. O quanto tinha se sentido aconchegada ao seu lado. O quanto tinha se sentido estranha ao ouvi-lo pronunciar certas palavras...
- Thur?
- Hm?
- Qual é o abismo? – perguntou simplesmente, fazendo o rapaz olhá-la de rabo de olho.
Ele estava como sempre: cabelos bagunçados, bochechas levemente rosadas, mangas da blusa social arregaçadas, olhos duros. Frios, foscos. Pareciam guardar algum mistério, segredo...
Arthur sempre fora um dos “queridinhos” das meninas, apesar de que agora, maioria delas - pelo menos as prudentes - resolvia ficar longe dele. Não entendia Lua. Não entendia a curiosidade da garota por sua vida. Não entendia seu sorriso sempre meigo, apesar de tratá-la com frieza. E o que menos entendia era sua atração quase magnética por ela... Por que ela?
Ficou em silêncio, obviamente deixando claro que se sentiria desconfortável respondendo aquela pergunta. Oh, desconfortável era eufemismo...
- É a vida e a morte, Arthur? – perguntou pesarosa. O garoto sentiu o coração descompassar, apenas tendo uma reação: virar seu olhar pra frente. Lua soltou um suspiro pesado ao vê-lo fazer isso.

As garotas estavam sentadas na grama perto do ginásio, matando o quarto horário. Kimberly fixava o vazio enquanto Brittany acendia o isqueiro e dava uma tragada no cigarro em seus dedos.
- Merda. – a primeira balbuciou, tacando uma pedrinha a metros de distância. – Tomara que aquele cara nunca nos procure de novo.
- Ele não vai, Kim. – a loira revirou os olhos, como se fosse óbvio. – Ele tem tanto a perder quanto nós.
- Por que mesmo nos metemos nessa merda de situação?
- Os fins justificam os meios. – soltou a fumaça.
- Você ainda acha que o Aguiar vai te querer depois de tudo? – perguntou quase inocentemente, fazendo a amiga tirar as costas da parede para encará-la.
- Óbvio que vai! Ele não sabe de nada... Nem vai ficar sabendo. – respondeu nervosa. – Ele é meu, Kimberly.
- Quem me dera saber como é amar alguém... – Kimberly deu uma risada abafada.
A morena deu uma olhada no local tendo uma lembrança: talvez o início de tudo aquilo...

“- Olha lá, Brit! – falou boquiaberta, chegando cautelosa atrás do ginásio.
- Não acredito. – a amiga deu uma risada de deboche. O céu já estava negro. – Ele com a... Iv?
As duas observavam um casal que se beijava intensamente e que vez ou outra deixavam as mãos percorrerem livremente o corpo do outro.
- Vaca. – a loira rosnou por entre os dentes, observando o garoto puxar a blusa da menina pra cima.
- Wow! As coisas estão esquentando por aqui... – Kimberly deu uma risada pervertida. – Vamos embora, Brittany.
- Coitada da Iv, se ela acha que vai ficar por isso mesmo. – murmurou, antes de virar as costas e se afastar.”


A sala de aula estava uma paz aquela hora...
- Okay, Mel. Desembucha antes que o Rod pire com a minha demora. – Lua cruzou os braços ao se sentar do lado da amiga, no fim do horário.
Mel prendeu os cabelos longos em um coque, sentindo um suor gelado brotar em seu pescoço. Talvez não fosse tarefa dela tratar desse tipo de assunto com a menina, mas ela precisava saber o que queria... E seria com a ajuda dela.
- Luinha... Você já ouviu falar... – pigarreou. – De Ivane Whinsky? – falou um pouco mais baixo, vendo que algumas pessoas ainda estavam na sala.
Lua encarou-a durante um largo momento, depois deu um suspiro pesado e respondeu:
- Já. – Mel expirou rapidamente, aliviada ao saber que não seria a primeira a tocar naquele assunto.
- O que, exatamente, você sabe sobre ela?
- Não muito. – Luinha olhou-a preocupada, depois deixou seu olhar cair. – Ela era sua amiga e da ex-namorada do mica. Foi assassinada ano passado e se parecia muito comigo... Só.
- Você é a cara dela. – a garota deu ênfase.
- Não entendo o que eu possa te ajudar com relação a isso... – Luinha estava confusa.
- Você... – Melzinha analisou a última pessoa que saia da sala, deixando-as sozinhas. – Tem idéia de como ela morreu? – Lua balançou a cabeça para os dois lados, em negação. – Ela levou um tiro... À queima roupa.
A menina dos cabelos escuros engoliu a seco. Era um jeito horrível de se morrer... Uma morte brutal. Rápida.
- Ainda não entendo. – disse com a voz falha. – Quem... A matou?
O silêncio reinou pelo ambiente enquanto Luinha se perdia em perguntas, fixando seu olhar nos olhos pesarosos de Mel.

- Chay, eu ainda não entendo porque me chamou aqui. – Rod disse mordendo um cachorro-quente, na lanchonete em frente à escola.
- Queria ficar a sós com você... – Chay brincou, fazendo o amigo dar o dedo e em seguida, gargalhando.
- Sério, dude. O que foi? – encarou-o desconfiado.
- Mel está conversando com a Luinha...
- E...?
- Sobre a Iv. – disse devagar, fazendo com que Rod se engasgasse.
- Por quê? - ele perguntou entre soluços.
- Escute tudo antes de dar palpite, okay, mate? – o outro perguntou com cautela.

- Festinha na sua casa? – Duan perguntou, sentado a duas mesas dos outros dois rapazes, na lanchonete. Estava conversando com o capitão e o zagueiro do time de futebol.
- É, meu chapa. Morar sozinho tem suas vantagens... – Bennet gargalhou.
- Ótimo. – o loiro deu de ombros. – Que dia?
- Sexta à noite. Chame quantas pessoas quiser. – sorriu maliciosamente. – Quanto mais melhor.

O garoto andava inexpressivo até o Audi preto, passando pela grama do pátio da escola. Incomodava-se com o barulho. Incomodava-se com as pessoas. Incomodava-se com o ambiente...
- Thur! – ouviu uma voz feminina gritá-lo.
‘Merda’, pensou antes de olhar friamente por cima dos ombros.
- Por que não me ligou depois? – a garota dos cabelos loiros e longos fez bico. Ela tinha os olhos muito azuis e um rosto que, se não fossem as circunstâncias, ele acharia bonito.
- Depois de quê, Brit? - estava completamente impaciente.
- Você sabe... – ela o abraçou pela cintura, sorrindo insinuante.
- Brittany, olha... Eu estou sem tempo agora. Não posso conversar. – afastou seus braços e continuou seguindo para o veículo, deixando uma menina furiosa pra trás.
'As coisas não serão novamente assim... Não mesmo!', ela pensou, soltando quase um rugido.

- Ninguém sabe ao certo... – Mel respondeu, depois de alguns largos segundos em silêncio.
- Como assim ninguém sabe? Ninguém foi preso? A polícia não foi atrás do culpado? – Lua assustou-se.
- Até que foi... Um jardineiro. Mas não acredito na culpa dele...
- Melzinha! – a garota levou a mão a boca. – Quer dizer que o criminoso pode estar à solta?
- Ele está à solta. – Mel enrijeceu o maxilar, estreitando os olhos. Lua sentiu o coração bombear mais fortemente com a declaração.
- Como você tem certeza? – perguntou baixo.
Eu o vi.

Capítulo 10 -


Londres; Segunda-feira; 5:11 da tarde;

Lua observava as figuras embaçadas passarem rapidamente através do vidro do carro em movimento. Estava escorada na porta, e os únicos sons audíveis no ambiente eram o de sua respiração e o da respiração dele.
Thur, como todo dia depois do treino, estava vestindo o uniforme do time. Seu rosto e pescoço estavam suados, o que o fazia ter uma leve sensação de calor. Uma sensação que se intensificava com aquela garota ao seu lado...
- Essa escola me intriga. – ela disse em meio a um suspiro, fazendo-o olhá-la.
Arthur sentia um agradável sentimento no peito quando mirava a figura doce de Luinha. Talvez porque ela se parecesse com Ivane. Mas, não... Tinha algo a mais...
- Por quê? – voltou a prestar atenção na estrada.
- É apenas... Intrigante.

“- Você viu o assassino, Melzinha? – perguntou surpresa, e ao mesmo tempo, aterrorizada. – Quem é? Por que você não chamou a polícia?
- E do que ia adiantar? – a menina deu uma risada histérica. – Luinha, eu o vi. E eu teria o entregado pra polícia, se não fosse...
- O quê? – a amiga perguntou preocupada, segurando o ombro da garota.
- Eu fui atropelada naquele dia... – fechou os olhos, sentindo as lágrimas se formarem. – Bati a cabeça e perdi parte da memória. – duas lágrimas gordas rolaram por suas bochechas. Lua sentiu as pernas tremerem, ficando estática. – Eu não sei quem era o motorista. Só sei que Chay me encontrou na rua poucos minutos depois.
- Melzinha... – a menina disse sentindo a dor da amiga e ajoelhando-se pra abraçá-la. Mel correspondeu o abraço fracamente. – O que eu posso fazer pra ajudar?
- Você parece muito a Iv. – soluçou, apertando suas mãos nas costas de Luinha. – Você me estimula a captar as lembranças perdidas. Por favor. Por favor, fique perto pra que eu possa relembrar aquela semana... A semana do assassinato. – sua voz estava alterada e seu rosto vermelho.
Luinha emocionou-se, fechando os olhos que também começavam com uma leve ardência. O sentimento de Mel deveria ser horrível. Na verdade, o de todos. A morte era uma coisa definitiva. Não se dava pra voltar atrás. Era o conceito do “nunca mais ver” o qual as pessoas dificilmente se acostumam, ainda mais estando relacionado aos parentes, ou aos amigos... Ivane era nova demais pra morrer. Saudável demais pra morrer. Viva demais pra morrer...”


- Chegamos. – ele disse, após a viagem silenciosa.
- Obrigada, Thur. – ela respondeu abrindo a porta e se impulsionando pra fora do veículo.
- De nada, Luinha. – encarou-a por alguns segundos.
Arthur ainda era apaixonado pela Ivane. Lua sabia que sim, apesar de ele não ter dito com palavras. Sentia o coração apertar toda vez que o olhava e pensava em como ele deveria se sentir querendo vê-la e simplesmente... Não podendo. Nunca mais.
Ficaram um tempo olhando um para o outro enquanto ela segurava a porta.
A garota sentiu os joelhos renderem, caindo ajoelhada no banco novamente. Seus olhos estavam marejados, e os impulsos de sua mente misturados com os apelos de seu coração fizeram com que ela estendesse a mão esquerda na direção de Thur e puxasse seu rosto, encostando rapidamente seus lábios macios em sua bochecha suada. Seu coração acelerou ao fazer isso, sentindo um leve formigamento na boca ao contato com a pele do rapaz.
Arthur tampou a respiração durante o tempo em que ela estava próxima. Muito próxima. Sentiu o sangue passar quente por suas veias nessa hora. Sua vontade era de tomá-la nos braços... Mas, espera! O que diabos ele estava pensando? Como podia sequer cogitar uma coisa dessas?
- Vai ficar tudo bem. – ela sussurrou em seu ouvido, assim que separou os lábios quentes de seu rosto.
Depois de alguns segundos, o garoto ouviu a porta do carro ser batida. Ele ainda fixava o vazio. O vazio que, pela primeira vez, lhe parecia solitário.
“Vai ficar tudo bem” Ninguém nunca havia lhe dito algo assim... Essa garota...

Londres; Greenwich; Segunda-feira; 6:32 da tarde;

- Você disse a ela, Melzinha? – Sophia perguntou, colocando um morango com chantilly na boca. Estavam sentadas à pequena mesa da cozinha.
- Disse. Felizmente ela não se assustou tanto quanto eu imaginava...
- O que é muito bom. Talvez finalmente possamos saber a resposta... – estreitou os olhos, tomando um repentino tom sério.
- Sop... – Mel colocou o dedo indicador no queixo. – Tem absorvente pra me emprestar?
- Está no banheiro. – sorriu simpática. A amiga se levantou, indo em direção ao quarto e sumindo de vista. – Eu tenho de sobra... – murmurou.
Sophia fechou os olhos por alguns segundos, lembrando-se da tarde que tivera. Tinha discutido com Ethan e terminado o namoro. Ela tinha sido chifrada e isso não era o que mais lhe incomodava. Era o fato do ex-namorado não estar nem aí pro término deles...

Londres; Wimbledon; Segunda-feira; 7:03 da noite;

- Aqui está o envelope que me pediu. – o homem grisalho que vestia um terno cinza entregou o papel ao garoto. Estavam num escritório pequeno e escuro. Os únicos raios de luz que chegavam ao local eram os que passavam através das persianas.
- Obrigado. – Thur disse baixo, abrindo o envelope e puxando para fora seu conteúdo.
Seu rosto se empalideceu ainda mais. A vista embaçou e as mãos ficaram geladas.
- Você está bem, rapaz? – o homem perguntou, vendo-o levar uma das mãos aos olhos e soluçar.
- Eu... Vou ficar.

Londres; Highgate High School; Terça-feira; 11:54 da manhã;

- Luinha! – ouviu uma voz masculina chamar por ela. Estava andando pelo corredor branco da Highgate, em direção ao refeitório. Virou-se, dando de cara com lindos olhos verdes a encarando.
- Duan. – falou surpresa.
- Seguinte, gata. – o menino passou o braço pelo seu ombro. – Vai à festa do Bennet?
- Bennet...? Capitão do time de futebol? – juntou as sobrancelhas. – Não fui convidada...
- Acabou de ser. – o garoto alargou o sorriso.
- Tenho que ver com o Rod se ele vai...
- Aquele primo seu?
- É...
- Não precisa depender dele. Eu te busco em casa, se você quiser. – colocou as mãos nos bolsos.
- Vamos ver, Duan. Vamos ver...
- É sexta, hein? Não esquece.
A garota sorriu leve, olhando pras pessoas no corredor que ainda a olhavam estranho. Tudo bem. Ela não ligava mais. Talvez porque soubesse o motivo. Ou talvez simplesmente tivesse se acostumado...

- Sabe no que eu estou pensando, Chay? – Mel perguntou enquanto estava na fila da cantina. O namorado estava logo atrás.
- No quê, meu bem?
- Que as lembranças não foram aleatórias...
- Como assim? – via a menina pegar uma bandeja.
- Eu não lembrei por acaso. Não tinha só a ver com a Lua... – fez uma pequena pausa, olhando-o em seguida. – Quando eu tive os flashbacks, ela estava exatamente no lugar onde a Iv estava quando aconteceram...
- Wow. – tentou digerir.
- E não é só isso, Chay. – abaixou o tom de voz. – Há uma coisa que eu preciso entender melhor. Eu me lembrei disso hoje...
- O quê?
Senhora Paskin estava atenta aos barulhos de seu salto no corredor vazio. Carregava algumas folhas com o pescoço erguido e a expressão sempre séria. Nunca tinha conseguido se recuperar depois da morte do marido, num acidente de carro. Desde então tinha se tornado uma pessoa completamente ranzinza e triste.
Observou um garoto escorado na parede. Esse alternava seu olhar do vazio pra um livro grosso de capa vermelha. Tinha os olhos sofridos, assim como os dela. Entendia a sua dor...
- Arthur. – ela disse, acordando-o de seus pensamentos.
- Senhora Paskin. – cumprimentou-a.
- Vai passar todos os seus intervalos aqui?
- Prefiro. Longe deles. De todos. – estreitou os olhos. A senhora encostou-se ao seu lado, soltando um suspiro pesado.
- Esse não é o mesmo menino dos olhos esperançosos que me chamava de mãe no primário. – ela esboçou um sorriso.
- E essa não é a mesma mulher feliz. – retrucou.
- Acho que a vida nos passou a perna, meu querido.
- Desculpe-me, senhora. Mas acho que mais em mim. – deu uma risada fraca e sem humor.
- Algumas quedas servem pra que nos levantemos mais fortes. – ela disse com a voz terna. O garoto a olhou em seguida. – William Shakespeare.

Londres; Highgate High School; Terça-feira; 4:54 da tarde;

- Andem, molengas! Vocês estão parecendo um bando de mulherzinhas! – o treinador Stevens gritou, e como de costume, permitindo que uma veia se ressaltasse em seu pescoço. – Thur, sua vez de bater o pênalti!
O garoto assentiu, parando de tocar a bola para Bennet e mais dois garotos e se dirigindo para próximo do gol onde Duan se aquecia para defender.

- Merda. – Mel disse sendo apoiada por Lua. Seu braço estava em volta dos ombros da garota, que caminhava devagar pra fora do ginásio pra que a amiga manca pudesse acompanhá-la. – Por que eu tinha que torcer o pé? Desculpe-me, Luinha. De verdade mesmo. Você não precisava estar aqui.
- Tudo bem, Melzinha. Eu já estava louca pra arrumar um pretexto pra ir embora mais cedo. – deu de ombros. – Aonde você quer ir?
- Vamos ver o futebol masculino. – sugeriu.
As duas andaram devagar até a quadra de grama onde aconteciam os treinos de futebol. Sentaram-se num banco ali perto, observando alguns garotos rolarem as bolas uns pros outros ou ensaiarem dribles. Os olhos de Luinha percorreram cada um até finalmente pousarem em um garoto com os cabelos já molhados de suor. Esse pegava uma das bolas e a colocava na marca do pênalti.
- Luinha! – Duan gritou do gol, acenando pra garota. Thur bufou mesmo sem olhá-la.
Ela voltou a passar os olhos rapidamente no local, notando que um dos rapazes grandes e de rosto rude a encarava curioso. Se não se enganava, aquele seria Scott.

Arthur olhou com raiva e ao mesmo tempo impaciente pra Duan. O motivo daqueles sentimentos? Ele não sabia, mas com certeza se acentuavam com o sorriso bobo do garoto para a menina ali sentada.
Tinha a observado de canto de olho, analisando, mesmo que rapidamente, cada centímetro de seu corpo: as canelas finas, as coxas grossas, o quadril desenhado, a barriga, o busto, os ombros e por fim, seu rosto. O rosto com feições delicadas e corajosas. Serenas e selvagens. Odiosas e ainda assim, apaixonantes.
Lua estava com os cabelos lisos e longos presos por um rabo de cavalo. Tinha deixado os lábios rosados semi-abertos, o que fazia o coração do rapaz disparar, mesmo que involuntariamente. Duan continuava a olhá-la, sorrindo maroto e mal-intencionado. Thur tomou impulso e ágil tocou na bola fortemente com o lado do pé, fazendo com que ela se chocasse contra a rede rapidamente.
- Porra, dude. – o loiro reclamou. – Por que não esperou que eu prestasse atenção?
- Você se distrai muito fácil. – sorriu friamente. – Deveria sempre estar atento.
- Então vamos de novo, margarida. – o rapaz deu um sorriso desafiador, pegando a bola no fundo do gol e arremessando-a de volta para o garoto.
- Como quiser.

- Impressão minha ou um duelo acaba de ser travado? – Mel deu uma risada cheia. O loiro dava pequenos pulinhos para os dois lados, aquecendo-se, enquanto o outro o olhava como uma águia olha a presa.
- Eles são muito competitivos. – Luinha suspirou, abraçando os joelhos. – Thur é habilidoso.
- Ele sempre foi um dos melhores do time. Se não o melhor. – concordou, virando seu rosto lentamente pra amiga.

“- Vai lá, Thur! – a garota gritou, batendo palminhas em seguida. O rapaz virou seu olhar pra ela sorrindo sem graça.
- Iv, não grita por mim assim. – repreendeu-a. – É só um treino. Você me deixa sem jeito...
- Que lindo. – levantou-se do banco e andou rapidamente na direção do garoto, envolvendo seu pescoço com os braços. – Já disse que você é lindo hoje, Aguiar?
- Não. – Arthur abraçou-a pela cintura, colocando seus lábios suavemente sobre os dela.
- Senhorita Whinsky. – o treinador disse com um tom de repreensão na voz. – Pela milésima vez, pare de atrapalhar o treino.
- Relaxa, Stevens. – disse leve. – O Thur não precisa de treino e você sabe.
- Iv, qual é! – Mel falou revirando os olhos. – A treinadora vai pirar se não formos pro ensaio da torcida agora.
- Só é segunda-feira e você já está me dando lições. – bufou irritada, dando um novo selinho no rapaz e indo ao encontro da amiga. – Vamos, então.”


- Segunda-feira... – Mel disse focando o vazio com os olhos bem abertos.
- Segunda o que, Melzinha? – Luinha perguntou preocupada, segurando-a pelos ombros.
- Luinha, deu certo. Eu tive outro flashback! – respondeu animada e assustada ao mesmo tempo.
- O que você viu? O assassino? – a garota perguntou mais baixo.
- Não... Mas uma coisa importante...
- Pode me falar?
- Melhor agora não. – mordeu levemente o lábio inferior, olhando pro lado. – Depois você saberá de tudo. – disse pesarosa. Lua engoliu a seco.

- Uhul! Agarrei sua bola, margarida. – o loiro apontou satisfeito na direção do rapaz com a bola de futebol nos braços. Levantava-se do chão ainda batendo de leve nos joelhos para tirar a grama que grudara ali.
- Depois da terceira tentativa, dude. – Thur sorriu orgulhoso, olhando discretamente para o banco da quadra, onde as duas garotas estavam sentadas.
Luinha observava-o tranquilamente, com certa admiração. O encontro dos seus olhares fazia o coração do rapaz disparar, e o dela não ficava muito pra trás.
- Eu deixei. – Duan deu de ombros, fazendo o mesmo percurso com os olhos que Arthur fazia no intervalo de trinta segundos. – Viu como eu sou bom, Luinha? – gritou, fazendo a garota rir baixo e o amigo enrijecer ainda mais sua feição.
Mel alternou seu olhar lentamente de Thur para Lua: ele parecia nervoso com as gracinhas de Duan para a garota. Ela parecia sem graça ao olhá-lo.

O menino estava escorado numa árvore do pátio, com os joelhos ossudos flexionados e apontando a câmera fotográfica diretamente pro campo de grama. Bateu dois flashes com os dedos longos e finos, dando uma risada baixa em seguida. Olhou a foto deixando que os olhos se enchessem com a imagem:
- Tão... Linda. – murmurou sorrindo e dando uma roncada.

O treinador apitou o final do treino. Lua viu Thur se dirigir até ela, com o pescoço suado e as bochechas mais rosadas, como de costume depois que treinava. O loiro também acompanhou o garoto com os olhos. Arthur passou as mãos nos cabelos de leve, sentindo a garganta arder com a sede e o coração descompassar ao ver Lua ficar cada vez mais próxima. Apesar disso, não conseguia deter seus passos. Parou a centímetros da garota, estendendo seu braço direito para o lado do banco preto e abaixando-se, pegando uma garrafa de água e em seguida, colocando a coluna ereta novamente e despejando o conteúdo em sua boca.
Lua observava-o quase sem piscar. O garoto tinha uma beleza intrigante e uma atração sobrenatural sobre ela. Mal o conhecia e ele era quase tão especial quanto Nick. Nick. O namorado de quem tanto gostava e que, agora, mal tinha notícias. Por onde andaria?
- Luinha. – Arthur chamou-a com a voz dura. A menina estava vidrada em seu rosto e Mel encarava-o curiosa. – Luinha! – falou mais alto, dessa vez, acordando-a de seus pensamentos.
- Oi?
- Vamos? – olhou para os lados inexpressivamente, percebendo que algumas pessoas olhavam em sua direção: Scott. Bennet... E mais alguns babacas
- “Vamos” aonde? – Mel quis saber num tom agudo e preocupado ao mesmo tempo, olhando a amiga.
- Thur anda me dando carona, esses dias. – ela deu de ombros, leve.
- Aguiar? – deu uma risada sem humor. – Seu primo sabe disso?
- Não preciso da permissão dele. – Luinha disse séria, levantando-se e se colocando do lado do rapaz.
- Ela está certa. – o garoto suspirou pesadamente, apontando para Mel com as sobrancelhas. – É melhor que não vá comigo.
- Mas eu vou, Aguiar. – falou decididamente, colocando as mãos na cintura. – Nem trouxe dinheiro pro táxi...
- Faça o que você quiser, Lua, mas só... – a amiga a olhou magoada e pesarosa. – Tome cuidado. – Arthur sorriu secamente quando ouviu as palavras.
- E você, Melzinha? Chay sabe que está machucada? – Luinha se ajoelhou na frente da garota.
- Já mandei uma mensagem pra ele. Daqui a pouco estará aqui.
- Vamos, Luinha. – o rapaz disse nervoso, coçando a cabeça. – Você sabe que eu detesto ir embora tarde.
- Sem stress, Arthur. – levantou-se prontamente, dando um sorriso.

Duan estaria se incomodando com o fato da menina de cabelos longos parecer tão íntima de seu amigo. Estaria se incomodando com isso, se não fossem assuntos mais urgentes...
Caminhou até seu Toyota azul marinho, deixando todos para trás, sem ao menos trocar sua roupa de goleiro. Discou rapidamente alguns números em seu telefone celular.
- O que você quer agora? – perguntou rude.
- Eu e você temos assuntos a tratar. – uma voz masculina respondeu, como se estivesse se divertindo. O rapaz sentiu a espinha gelar por alguns instantes.

- Esse seu desprendimento é doentio. – Thur disse com a expressão séria, enquanto olhava pra direção. Já estavam dentro de seu carro, a caminho da Oxford Street.
- Essa sua frieza também. – ela respondeu, tirando a gominha e permitindo que seus cabelos caíssem em ondas na blusa larga do uniforme de educação física.
- Esse seu jeito... – ele juntou as sobrancelhas. – Simplesmente me irrita. Você não sabe nada a meu respeito e ignora os avisos de todos. Como pode ter certeza de que eu não vou parar o carro agora mesmo e me aproveitar de você?
- Faça-me o favor. – a garota revirou os olhos, impaciente. – Você não quer o meu mal. E nem é uma pessoa má.
- Você deveria ter medo de mim. Assim como todos. – ele enrijeceu o maxilar, fazendo uma faísca de determinação aparecer em seus olhos.
- Eu não tenho medo de você. – falou como se fosse óbvio. – E nem terei, Aguiar. Isso é idiota.
- Então veremos. – o garoto sorriu sombriamente, virando o volante na direção da calçada e pisando fundo no freio, fazendo com que alguns carros buzinassem. Luinha apertou as mãos em volta do banco ao ouvir o Audi cantar pneus até o passeio.
Arthur estava disposto a fazê-la se afastar dele. Sim, era isso o que ele queria. Era isso o que essa garota deveria fazer. Ficar longe. Evitaria problemas para ambos. Ela devia temê-lo. Devia vê-lo como uma ameaça. Quando o carro finalmente estacionou, arremessou o cinto para longe de si rapidamente, já se impulsionando pra esquerda e colocando os joelhos dos dois lados da menina, fazendo com que ela ficasse entre suas pernas.
O coração de Luinha disparou ao vê-lo tão próximo. Disparou ao ver o corpo quente do rapaz tão próximo ao seu, que em questão de segundos já estava sendo pressionado ao dela.
- Tira o cinto. – ele ordenou, sussurrando em seu ouvido.
- Vo... – ela tentou falar, com a respiração cortada. – Você não consegue me obrigar, Arthur. – riu em deboche.
Ele sorriu maliciosamente, segurando com força seus braços e tirando o cinto da garota quase com violência. Lua engoliu a seco enquanto ele emaranhava a mão direita em seus cabelos fortemente e juntava seus narizes.
- Admita que está com medo que eu paro. – falou frio. A menina sentiu a respiração do garoto contra seus lábios, de modo que seu coração acelerasse ainda mais.
- Você não é mau, Thur. – sussurrou, com o olhar fixo em sua boca entreaberta.
- Ah, eu sou. – o rapaz colocou a mão esquerda no quadril de Luinha, puxando-a para perto e juntando ainda mais seus corpos. – Você não sabe o que eu sou capaz de fazer. – tentou seu melhor tom maldoso.
Lua ficou sem reação por alguns segundos, o que o fez achar que ela finalmente tinha se rendido e iria ficar longe. Deixou um sorriso vitorioso transparecer, que foi substituído por uma expressão de confusão logo em seguida, quando a garota começou a gargalhar alto.
- O que foi?
- Me mostre, então. – ela disse ainda se divertindo. – Me mostre do que é capaz, Aguiar, e talvez, bem talvez, eu tenha medo de você. – gargalhou novamente.
Ele sentiu a raiva lhe percorrer as veias. O sentimento de irritação e o de impotência poderiam levá-lo a fazer uma loucura bem ali, naquela hora. E ele teria feito, se não tivesse escutado batidas fortes no vidro da janela.
- Jovens, isso aqui é um local público. – o guarda disse em tom repreensivo. – Mantenham o pudor ou terei que prendê-los.
Thur voltou pro seu lugar, respirando fundo.
- Salva pelo gongo. – murmurou, sombrio.
- Claro. – ela rolou os olhos.
A viagem pra casa branca foi silenciosa, enquanto os dois esperavam os batimentos cardíacos se normalizarem.

Londres; Greenwich; Terça-feira; 6:47 da tarde;

- Sop. – Mel disse adentrando o apartamento, um tanto esbaforida.
- Que foi? – Sophia perguntou, confusa com a aparente pressa da amiga, colocando a tigela de amendoins em cima da mesinha da sala.
- Eu tive outro flashback daquela semana. E esse foi importante. – sentou-se igualmente no sofá.
- Diga.
- Em uma das lembranças você me falava que a Iv estava com raiva do Thur. – falou com calma. – Segunda-feira ela ainda estava de bem com ele. – a garota acompanhou o raciocínio. – Por favor, me diga que você se lembra o porquê deles terem brigado. Por favor... O que aconteceu depois de segunda? – fechou os olhos, contendo as lágrimas.
- Melzinha, eu...

Londres; Oxford Street; Terça-feira; 7:03 da noite;

- Chay me contou. – Rod disse, escorando-se no batente da porta da menina. Ela estava sentada na cama, olhando o laptop.
- Contou o que?
- Que você está pegando carona com aquele... – mordeu o lábio inferior, com raiva do nome. – Com o Aguiar.
- Não acredito que você vá ficar bolado com isso, molengo.
- Tarde demais, Luinha. – ele entrou no quarto, sentando-se na cama. – Aquele cara não presta, eu já te disse. Não quero que você se machuque.
- Rod, eu sou independente, não precisa se preocupar comigo. Eu sei no que estou me metendo, e se eu me machucar, bem... Aí a culpa e as consequências serão minhas, não suas.
- Eu sou o responsável por você. Não posso permitir que isso aconteça. – seus olhos estavam angustiados.
- Eu sou a responsável por mim mesma, molengo. – expirou devagar. – Rod, eu entendo sua preocupação por mim. Mas não precisa. Eu e ele não temos nada demais. É só uma carona.
- Luinha, eu... Não quero te perder. – ele fechou os olhos. A garota passou a mão levemente no rosto do primo, dando um sorriso suave.
- Não vai, nunca.
- Baixinha, eu... – abriu os olhos, olhando-a ternamente.
- Filho! Vem ajudar no jantar! – tio John gritou do andar de baixo. Rod revirou os olhos e levantou-se.
- Eu tenho que fazer a comida. – andou em direção a porta. – Amanhã é o seu dia de fazer, okay? – ela assentiu com a cabeça. – E, Luinha... – encarou-a por alguns segundos. – Cuide-se.
‘Como você estava dizendo, Lua?’ Avril, sua amiga do Brasil, disse numa conversa virtual, chamando a atenção da garota que ainda olhava a porta, pensativa.
‘Que tem esse garoto, chamado Arthur. Ele me intriga, e aparentemente, a todo mundo. ’ Digitou em resposta.
‘Você parece estar bem interessada nele, hein? Mas ainda bem que você passou pra outra, estava meio com pesar de falar sobre o Nick com você...’ – Luinha leu franzindo a testa. Com pesar? Sobre o Nick? ‘...Por quê?’



                                                           Escrita por : Lan
Capítulos 6 ao 8

     A neve e a tempestade matam as flores, 
                            mas nada podem contra as sementes.

                                         (Khalil Gibran)
 
Capítulo 6 -

Londres; Highgate High School; Quarta-feira; 9:23 da manhã;

- Podem se juntar com suas duplas, hoje vou passar o tema do trabalho de literatura desse ano. – senhora Paskin disse, fazendo com que Thur soltasse um suspiro pesado, observando todos da sala se levantarem e irem atrás de seus parceiros.
Olhou para as costas da menina sentada no canto. Ela ainda não tinha movido um músculo. Seus cabelos estavam mais brilhantes do que de costume, embora parte deles estivessem presos por uma piranha prateada. Mas espera! Como ele sabia sobre o brilho de seus cabelos? Talvez estivesse a observando mais do que deveria. Mais do que deveria...
A garota levantou-se e seguiu na direção dele, olhando para os lados. Ele acompanhou-a com o olhar.
- Hey. – ela disse leve. – Vou me sentar ao seu lado, ok? – ele balançou os ombros, vendo-a sentar. – E aí, como vai?
- Não muito melhor. – respondeu inexpressivo. Ela murmurou um “hm” e cruzou os braços por cima da carteira. – E você? – virou-se pra frente.
Não era típico de si mesmo querer saber algo sobre alguém. Ainda mais sobre alguém que tanto o perturbava.
Ela o olhou com os olhos um pouco mais brilhantes. "Já é um avanço", pensou.
- Vou bem. Pra falar a verdade, estou gostando da escola. – sorriu simpática.
- Está gostando disso aqui? - Arthur ironizou. - Então as escolas no Brasil deviam ser um purgatório...
- Seu humor negro é realmente imperdível, Aguiar. - ela riu baixo, fazendo-o ficar ainda mais ranzinza.
- Como a maioria de vocês sabe, todo ano é sorteado um autor diferente pra que me apresentem um trabalho completo sobre ele e suas obras no final do ano. – alguns alunos assentiram. – O autor sorteado esse ano é ninguém mais ninguém menos do que o escritor inglês de maior sucesso... William Shakespeare.
- Odeio estudar gente que viveu há mais de um século. – Mel sussurrou, fazendo a parceira rir.
- Boa sorte com isso. – senhora Paskin ajeitou os óculos tortos no nariz adunco. – Lembrando que a primeira parte do trabalho é a biografia do autor em questão.
- Detesto biografias. – Thur murmurou, apoiando a testa com o polegar e o cotovelo na carteira.
- Há alguma coisa que você não deteste? - brincou enquanto ele bufava impaciente. A menina sorriu ao vê-lo fazer isso. - Shakespeare é legal. – falou aérea. – Você vai ver. – ele a olhou de rabo de olho, respirando profundamente. – E então, como vamos fazer o trabalho?
- Isso é com você. - decretou.
- Ótimo. Vai fazer alguma coisa amanhã à tarde?

Londres; Highgate High School; Quadra; Quarta-feira; 4:24 da tarde;

- Vocês jogam feito mulheres! Acelerem o passo. – treinador Stevens berrou para os alunos que rolavam as bolas de futebol uns para os outros.
- Treinador. – Thur disse chegando ao seu lado.
- Aguiar. Por que não veio ontem? – disse nervoso, olhando o garoto com a expressão séria. Os outros continuavam a treinar, sem se importar com a presença dele.
- Não tinha como vir, senhor Stevens. Meu carro foi roubado.
- O Audi? – deixou o queixo cair.
- Já recuperei. O ladrão nem tinha ido tão longe assim...
- E o que você ainda está fazendo com essa roupa? – apontou pra gravata vermelha sobreposta à camisa social branca. – Vá para o vestiário agora. Seu antigo uniforme está lá.
- Obrigado, senhor. - concordou, já dando de costas pro campo.

- Aguiar? – Scott disse debochado pra Bennet, observando-o chegar à quadra com o uniforme de treino dos Eagles. – O que ele está fazendo aqui?
- Pensei que ele tivesse desistido do futebol pra sempre, desde que...
- Calem a boca. – Duan, goleiro do time, disse por trás dos dois. – Se acham que ele é do tipo que desiste, é porque não conhecem o Thur. – olhou o rapaz. – Dude, aqui! – fez sinal pra que ele se aproximasse.

- O incrível com relação ao Aguiar, - treinador Steves estava sentado no banco do campo, ao lado de Duan, que mirava o nada com os cotovelos apoiados nas pernas. O treino já tinha acabado, e estava começando a escurecer. Apenas os dois ainda estavam lá. – é que mesmo tendo ficado esse tempo todo afastado, ele ainda volta como um dos melhores da equipe.
- O Thur é o meu ídolo. – o rapaz brincou acompanhando três garotas que saiam da educação física com os olhos. – Que maravilha. – sorriu tarado. – Obrigado senhor diretor por esse presente no final do treino. – o treinador riu baixo.
Foi a vez de duas garotas com os cabelos longos saírem do ginásio. Riam de qualquer coisa, e mais do que as outras, chamaram a atenção do rapaz de olhos verdes. Fitou-as interessado. O homem gordo e quase grisalho ao seu lado acompanhou seu olhar.
- Tem bom gosto, senhor Adams.
- Se me der licença, senhor. – sorriu torto, levantando-se e seguindo em direção a elas.

- Juro que eu não vi a bola se aproximando. – Lua disse fazendo Mel dar uma risada.
- Aquilo foi bem ridículo mesmo. – passou as mãos nos cabelos suados.
- E sabe que o pior nem foi... – ia continuar a frase, se não tivesse visto o garoto loiro andar na direção das duas e parar a sua frente.
- Hey, Melzinha. – ele cumprimentou. Mel sentiu o coração acelerar. Julgou uma reação idiota, continuando a olhá-lo. – Hey, Lua. – disse-lhe com uma voz aveludada, analisando-a de cima a baixo. A garota sentiu as bochechas esquentarem. Estava com um short preto de lycra mínimo, assim como todas as garotas da educação física.
- Olá, Duan. – Mel estreitou os olhos.
- Oi.
- Gostaria de oferecer uma carona às duas. Topam?
- Meu namorado deve estar passando por aqui daqui a pouco. – balançou os ombros de leve. – Mas mesmo assim, obrigada por se oferecer.
- E você, Lua? – deu um sorriso torto.
- Eu estava pretendendo pegar um táxi...
- Você não vai me fazer essa desfeita. – olhou-a com olhos pidões. Ela revirou os olhos, sorrindo.
- Tudo bem. Eu topo.
Ouviram duas buzinas vindas de um Hyundai i30 que acabara de estacionar no quarteirão da escola. Mel sorriu.
- Gente, Chay chegou. – disse começando a se afastar. – Já estou indo.
- Tchau, Melzinha. Até amanhã. – a amiga disse. O rapaz fez um sinal com a cabeça, despedindo-se.
Mel observou o namorado sorrir dentro do veículo, andando um pouco apressada até ele. Quando estava chegando ao carro, virou o rosto pra trás, com a intenção de dar uma última olhada nos dois, antes de partir.

“- Melzinha, eles estão lá conversando já tem um tempo. – Sophia disse preocupada, olhando na direção de um casal, na saída do ginásio.
- Tudo bem, Sop. Eles devem estar falando algo sobre o Thur. - ela deu de ombros.
- Sobre o Thur? Será?
- A Iv estava bastante chateada com ele esses dias. Duan deve estar tentando amenizar as coisas.
- É. Deve ser. Mas daqui a pouco precisamos tirá-la de lá ou chegaremos atrasadas na casa domica.
- Hm, minha pequena apaixonadinha. – apertou a bochecha da amiga, que riu sem graça. – Vamos esperar só mais um pouco.”


- Melzinha? – Chay perguntou de dentro do carro, preocupado com a namorada que fitava o vazio. – Melzinha, tudo bem?
- Chay. – ela disse ofegante.
- O que foi, amor?
- Eu... Er... – virou-se, olhando perplexa pra ele. – Aconteceu de novo.

- E então, Luinha. – Duan disse apontando para o Toyota azul-marinho estacionado ali perto, com o queixo. O clima já estava começando a ficar mais fresco. – Me diga algo sobre você.
- Tudo bem. – ela balançou os ombros. – O que quer saber?
- Você é daqui de Londres mesmo?
- Sério que eu te passei essa impressão? – disse boquiaberta, esboçando um sorriso ainda assim. Continuavam a caminhar lado a lado.
- Não era pra passar? – juntou as sobrancelhas, confuso.
- Não é isso. – riu baixo. – Eu sou brasileira. Ganhei bolsa na Highgate.
- Brasileira? Sério? – arqueou as sobrancelhas. – Wow. Te confesso que nem parece. - surpreendeu-se. - Seu inglês é perfeito.
- Ganhei o dia. – disse vendo-o abrir a porta do carro pra ela.

Londres; Quarta-feira; 6:17 da tarde;

- Ethan... – Sophia disse segurando o braço do namorado. Andavam por uma das ruas comerciais da cidade. – Vamos entrar na loja de doces?
- Eu já não te dei uma caixa de bombons semana passada?
- Mas já acabaram. Além do mais, eram de café.
- Qual o problema de serem de café? – perguntou seco.
- Nenhum, mas é que... Vamos entrar? – fez bico.
- Não, Sophia. Não foi você mesma que disse que não podia engordar pra caber no colant das líderes de torcida, ou algo assim?
- Mas Ethan...
- Deixe de ser mimada.

Londres; Dockland; Quarta-feira; 6:23 da tarde;

Thur estava deitado no aparelho de levantamento de peso, carregando barras com 32 quilos de cada lado. As únicas horas em que conseguia ter paz era quando estava completamente sozinho. Ou pelo menos, apenas com o cachorro.
Estava na pequena academia no terraço do prédio, encarando o teto.
“Você não é mau, Arthur... É apenas solitário.” Riu baixo da lembrança, em deboche.
- O que você sabe sobre mim? – murmurou.
O cachorro levantou a cabeça, olhando em direção a porta. Deu um latido abafado. Arthur ouviu passos entrando na academia. Procurou não se importar, continuando a levantar os pesos e ignorando a presença da outra pessoa.
- Você é sempre tão sozinho, Thur. – a garota disse passando uma das pernas por cima do seu corpo, e assentando-se em seu quadril. – Deixa eu curar essa solidão. – inclinou-se, colocando as duas mãos no peito descoberto do rapaz.
- Brittany. – deu uma risada seca, olhando a loira com os cabelos presos em um coque. – Quem te deixou entrar?
- Duan pediu pra que eu entrasse. Era surpresa pra você. – fez bico.
- Eu quero ficar sozinho, se me der licença. – continuou a levantar peso.
- Não. Não dou. – deitou o corpo sobre o dele, colocando a cabeça em seu peito.
- Dá licença, Brittany. É sério. – o garoto levantou-se, de forma que a fizesse levantar também.
- Ah. Qual é, Thur? – colocou as duas mãos na cintura. – Um pouco de diversão não faz mal pra ninguém. – o garoto olhou-a sério, de rabo de olho. Brittany deu um sorriso malicioso, envolvendo sua nuca com as mãos e colando o corpo no dele. – Você não esteve com nenhuma outra depois dela, não é? – o rapaz deu um suspiro impaciente, antes de sentir Brittany encostar a boca na sua.
Sentiu a língua da garota contornar seus lábios, os quais abriu logo em seguida, permitindo à sua encostar-se a dela. Brittany esboçou um sorriso, emaranhando os dedos em seus cabelos. O garoto desceu as duas mãos para sua cintura, apertando-as e fazendo a loira arfar. O beijo foi intensificando-se de pouco em pouco, até a menina enroscar sua perna na de Thur, que o quebrou, em seguida.
- Você é uma vagabunda, Britanny. – disse sombrio, contra seus lábios. Essa por sua vez desceu a mão até abaixo de seu quadril. – Não me provoque... Você não sabe do que eu sou capaz.
- Acredite... – sorriu maliciosamente. – Eu sei, sim.

Londres; Oxford Street; Quarta-feira; 6:30 da tarde;

- Eu te admiro, Luinha. – Duan disse estacionando o carro na porta da casa da garota, após uma longa e divertida conversa desde o colégio.
- Me admira? Essa é nova. – riu, tirando o cinto. – Por quê?
- Você parece tão tranqüila em meio a isso tudo. – escorou uma das mãos no volante, virando-se pra ela. Seu olhar espelhava interesse. – Mesmo as pessoas te olhando esquisito. Você parece não se intimidar nem se incomodar com a situação em que se encontra.
- Situação em que me encontro...?

- Hey, Luinha. – o primo disse assistindo algum programa no sofá da sala. Lua adentrou a casa apressada, dando passos fortes e sentando-se no sofá azul. – Que cara é essa? – as sobrancelhas da garota estavam juntas. Estava nervosa.
- Eu quero saber a verdade, Rod. Agora. – sua voz era dura. – Por que as pessoas me olham torto? O que o Aguiar tem a ver com elas? E, mais importante, o que eu tenho a ver com isso? – o garoto engoliu a seco, percebendo que ela não estava pra brincadeira. Talvez realmente fosse a hora de contá-la. Protegê-la daquele jeito não estava dando certo. Mais cedo ou mais tarde ela suspeitaria...
- Luinha... – suspirou. – Você por acaso já ouviu falar do caso... Ivane Whinsky?
Capítulo 7 -

Londres; Oxford Street; Quarta-feira; 6:47 da tarde;

- Você só pode estar de brincadeira. – Lua disse dando uma risada histérica, ao ver uma foto no facebook de Mel. – Rod, isso é brincadeira, não é?
Ambos estavam no aconchegante quarto de estudos da casa e olhavam com perplexidade a tela do computador. Rod estava sentado na cadeira enquanto Luinha impulsionava o corpo um pouco para frente, numa tentativa de enxergar melhor. Seu coração estava mais acelerado e garoto em um clima receoso um tanto mórbido.
- Bem que eu queria que fosse. – o primo suspirou pesadamente.
Na imagem estavam três garotas abraçadas com pompons e uniformes azuis de torcida. Estavam paradas em frente ao ginásio da Highgate e seus rostos se iluminavam pelo sol esbranquiçado do verão londrino. A primeira, Mel, estava como se estivesse gargalhando de alguma coisa. A segunda: Sophia. Essa saiu falando, apesar disso, tinha conseguido ficar bonita. A última era... Lua? O que ela estava fazendo ali?
- Essa sou eu, Rod. – apontou. – Com o cabelo mais claro, lógico. Mas nada que um photoshop não crie.
- Aí que está a questão, Luinha . – virou seu rosto pra ela, pesaroso. – Essa não é você.
- Deus. – caiu sentada na cadeira de balanço, levando a mão à boca. Como era possível que existisse alguém tão parecida? – E onde está essa garota? Ela se mudou?
- Chegamos à parte dura da história. – ele deu um pigarro, olhando-a seriamente. Lua arqueou as sobrancelhas percebendo o tom extremamente grave que o rapaz usava.Rodrigo permanecia com os olhos inseguros. Depois de um breve momento, respirou fundo e pronunciou baixo a frase. – Ela foi assassinada. Ano passado.
Lua engoliu a seco, olhando novamente a imagem no computador. Leu atentamente a legenda escrita por Mel, com um aperto no peito:
“Sempre em nossos corações...”

Londres; Highgate High School; Quinta-feira; 4:37 da tarde;

- Uf. – a garota de cabelos longos e escuros expirou, ofegante, dirigindo-se para o bebedouro atrás do ginásio à passos largos.
Diferentemente dos outros dias, aquele estava mais quente e ensolarado. Lua vestia o uniforme da educação física da Highgate: um mini-short de lycra preto e uma blusa larga.
Mal a educação física tinha começado e já estava inteiramente suada, o que era de se esperar já que a modalidade era corrida.
Virou levemente à direita quando chegou ao final do edifício, dando de cara com Thur utilizando o bebedouro.
- Oi. – disse aproximando-se com um sorriso simpático nos lábios. Ele vestia uma calça e blusa larga, ambas brancas, que tinham o desenho de uma águia azul: Eagles.
Arthur virou seus olhos foscos pros tênis brancos da garota, subindo para suas canelas finas, pernas, coxas, quadril, barriga, ombros, até por fim, chegar ao seu rosto.
- Não sabia que era do time de futebol. – ela abraçou os braços por trás do corpo. Ele permaneceu calado, encarando-a. – Poxa vida, Aguiar. – irritou-se. - Claro que você não tem a obrigação de gostar de mim, mas pelo menos seja educado e responda alguma coisa que eu falo!
- Oi. – ele respondeu secamente, afastando-se do bebedouro. Lua bufou.
O rapaz continuou fitando-a com curiosidade e falsa indiferença.
- Ainda vai hoje, certo? – perguntou mal humorada, vendo-o virar de costas e se afastar. Aproximou-se ainda mais do bebedouro.
- Sobre isso. – olhou-a por cima dos ombros, estreitando um pouco mais os olhos de atirador. – Como vai embora?
- Quê? – Luinha disse apertando um botão, fazendo com que a água saísse da máquina. – Eu vou pegar um táxi, oras. – ele deu um sorriso amarelo com a resposta.
- Audi preto. Depois do treino. Não se atrase. – pronunciou pausadamente. Virou a cabeça pra frente e continuou a andar, indo em direção à quadra de futebol.
Luinha deixou os lábios se abrirem devagar, surpresa. Impressão dela ou o garoto tinha acabado de lhe oferecer uma carona?

Lua apoiou o pé em um banco, amarrando rapidamente o tênis no final do treino. Pegou seus pertences e seguiu em direção ao estacionamento da escola, fazendo o máximo pra não se atrasar.
Passou os olhos devagar por todos os carros, procurando ainda insegura pelo veículo preto. Depois de um momento, avistou o Audi estacionado e Arthur de braços cruzados e o joelho dobrado, encostado ao mesmo. O garoto estava com os cabelos suados e as bochechas mais rosadas, graças ao cansaço. Abaixou o queixo e observou-a se aproximar, como um predador quando avista a presa.
- Estou custando a acreditar que você vá mesmo me dar uma carona. - ela riu leve, deixando-o sem graça.
- Aproveite que hoje estou de bom humor. - Thur resmungou.
- Wow, sério? - Luinha disse em tom de brincadeira, enquanto o rapaz destravava o carro e abria a porta pra ela. - Imagina quando você acorda com o pé esquerdo, então. - deu uma risada baixa.

- Olha lá o que eu estou vendo, Bennet. – Scott disse olhando pelo retrovisor da picape estacionada na garagem da escola. – Veja se não é o Aguiar com a sua nova namoradinha. - fez uma pausa, analisando melhor o casal. - Coitada. – sorriu maliciosamente. O amigo fez o mesmo.

Lua tinha ficado impressionada com o fato dele resolver lhe dar uma carona. Ainda mais de ter aberto a porta pra ela.
O carro por dentro também era uma coisa que a impressionava – como se por fora já não fosse o bastante. Estavam sentados havia já algum tempo sem conversar, enquanto Arthur dirigia para a casa branca da Oxford Street. Ela tinha passado o endereço. Era lá onde fariam o trabalho, sob o olhar cuidadoso de Rod.
A menina olhou o semblante sério do companheiro, ficando incomodada com o silêncio estabelecido entre os dois.
- Pode ligar o rádio? – Luinha perguntou repentinamente. Thur sentiu um calor passar por seu corpo, ouvindo a sua voz. Consentiu sem pensar muito.
A última coisa que ele queria era pensar naquele momento. Se pensasse, comparaçõesseriam inevitáveis, e a conclusão óbvia de que não eram a mesma pessoa também.
Lua ouviu o som da orquestra vinda do rádio, seguida pela voz do tenor. Estranhou a escolha musical, contendo um sorriso.
- Andrea Bocelli? – juntou as sobrancelhas. – Você gosta?
Aguiar ficou alguns segundos em silêncio, depois respirou fundo para responder.
- As músicas passam sentimentos. – disse sem desviar o olhar da direção. - Gosto dos sentimentos transmitidos pelas músicas dele.
- Isso mostra que você é uma pessoa sensível. - ela sorriu.
- Claro que não. - Thur bufou, fazendo-a sorrir ainda mais.

Londres; Wimbledon; Quinta-feira; 5:23 da tarde;

- A senhorita tem certeza disso, Mel? – o médico perguntou-a sério.
Estavam em seu consultório branco, com cadeiras em tons claros de azul. O médico estava sentado do outro lado da mesa de madeira, de frente para o casal.
- Sim, senhor. Eu ando tendo uns flashbacks esses dias e não sei por quê. – Melzinha colocou as mãos entre as pernas, nervosa. Chay observou seu ato, sentado na cadeira ao lado.
- Talvez alguma coisa tenha forçado essas memórias. Algum lugar, ou alguém... – o homem coçou o queixo, analisando-a através dos óculos finos que o davam maior ar profissional.
- Mas os dois foram em momentos tão distintos que eu não saberia dizer... - a garota disse confusa, consultando o namorado com o olhar. Esse apresentava a mesma expressão desentendida.

Londres; Oxford Street; Quinta-feira; 5:24 da tarde;

- Ok, Rod. – Lua disse batendo as mãos na mesinha da sala da casa. Ela e Thur estavam sentados no chão, de costas para o sofá azul. – O que você quer? Já é a terceira vez que passa aqui.
Estavam há algum tempo mergulhados em livros para escrever sua própria versão da biografia de Shakespeare, mas mal tinham concluído a primeira linha. Ambos se sentiam desconfortáveis perto do outro e mais desconfortáveis ainda por chegarem a essa conclusão. Ela o inspirava medo e ele a inspirava curiosidade. Em contra partida, a única coisa que aquela situação inspirava à Rod era ansiedade. Ansiedade para ver o visitante longe dali.
- Nada. Só pra ver se está indo tudo bem. – lançou um olhar pouco amigável pro outro rapaz.
- Está tudo bem, agora com licença. Você está nos distraindo. – Luinha disse o óbvio. O primo deu uma nova olhada no garoto, antes de se virar de costas e subir as escadas. – Me desculpe por isso. Rod é do tipo “super-protetor”. – bufou, apoiando novamente os cotovelos nos cadernos.
Thur observou de soslaio o aspecto irritado da menina.
- Ele está certo, se quer saber. - falou inflexível.
- Não está. – olhou-o como se estivesse ofendida. – mica contou que você ofereceu seu carro por ele... Foi muito gentil de sua parte.
- Isso não quer dizer nada sobre mim.
- Mais do que você imagina. – o celular do garoto tocou assim que ela terminou a frase. Ela o observou curiosa.
- Com licença. – disse pra garota, tirando o aparelho do bolso e colocando no ouvido. – Alô?
- Dude, como assim você pega a Brittany de jeito e depois dispensa? – o loiro falou do outro lado da linha. Lua arqueou as sobrancelhas, como se tivesse ouvido o conteúdo da conversa. Thur se incomodou com isso.
- Ela me dá dor de cabeça. – sussurrou de volta.
- Que papo de mulher na TPM. - o outro retrucou.
- Sério, Duan, não posso falar agora. Me liga depois, ok? Tchau. – desligou o telefone sem cerimônias.
- Duan? – Luinha perguntou confusa. – Não sabia que eram amigos. - voltou a rabiscar o canto da folha, fingindo desinteresse.
- Melhores amigos desde a infância. – respondeu balançando os ombros de leve. – Onde estávamos? - procurou mudar de assunto.
- No título. – ela suspirou, ainda que sorrisse fraco.
- Sinto muito. Não sou bom com biografias.
- Biografias são chatas mesmo. Vai melhorar quando chegarmos às obras. – apoiou o queixo na mão, incomodada. Ficaram alguns segundos em silêncio... Tempo o bastante para ela ponderar sobre um assunto. – Quem é Brittany? – perguntou de repente, fazendo o coração do garoto acelerar. – É sua namorada?
Arthur respirou fundo, logo substituindo sua expressão de surpresa pela mais séria de sempre.
- Você ouviu. – ele concluiu, comprimindo os lábios.
- Duan fala alto demais. – Lua riu baixo, apesar de não ver humor.
- A Britanny é ninguém. – respondeu, ressaltando a última palavra.
- Só mais uma dor de cabeça? – Luinha perguntou, fazendo-o virar os olhos frios em sua direção. Ela pensou um pouco. – Eu sou uma dor de cabeça, Arthur? – ‘A maior das dores de cabeça.’ Ele pensou, apesar de não exteriorizar.
A garota esperou pela resposta o fitando nos olhos. Depois de um breve silêncio, compreendeu confirmação e sentiu um aperto no peito, como uma angústia desnecessária. Sentiu-se tola por isso.
- Vamos continuar o trabalho. - ele decretou, desconfortável.

Londres; Mark’s; Quinta-feira; 7:03 da noite;

- Uma cerveja aí, Bob. – mica disse chegando ao balcão.
Como era de costume, o Mark’s estava cheio. Cheio de pessoas bêbadas que se animavam à toa com qualquer coisa. Micael precisava daquela folga. Precisava molhar a garganta.
Passou os olhos lentamente por todos, já recebendo a garrafinha aberta e bebendo-a no bico. Pessoas desconhecidas, punks, hippies, alguns boyzinhos da Highgate no fundo.‘Boyzinhos do time de natação’, cuspiu com o pensamento. Seus olhos passaram por cada um deles, arregalando-se por fim, no que estava mais no canto. Deixou o queixo cair. ‘A oportunidade enfim, tinha chegado.’

Londres; Greenwich; Quinta-feira; 7:08 da noite;

- Droga. – Sophia disse irritada, sentada em sua cama.
- Algum problema, Sop? – Mel perguntou sentando-se na cama ao lado, com um pijama curto. – Chay acabou de ir embora.
- Ethan não atende ao telefone.
- Relaxa. Ele sempre se esquece de atender ao telefone. Você sabe disso.
- Eu sei, mas eu...
- O que foi? É urgente? – colocou os cabelos para trás da orelha, analisando a amiga em seu pijama amarelo.
- Não. Eu só queria saber onde ele está. – balançou os ombros. – Eu queria que ele atendesse prontamente quando eu o chamo...
- Como o mica fazia? – Mel arqueou uma sobrancelha, sugestiva.
- Chega de mica, Melzinha. – disse impaciente. – Vamos pra cozinha, quero tomar um iogurte.
- Cuidado, hein? Vai virar uma bola. – levantou-se juntamente com ela. – Ah, e se quiser o de morango, eu já tomei.
- Olha quem fala! – a menina riu, antes de sair do quarto.

Londres; Oxford Street; Quinta-feira; 7:11 da noite;

Após algum tempo concentrados no trabalho e por fim, tendo êxito na biografia, Arthur achou que seria melhor que fosse embora. Ainda mais com a frieza repentina da parceira... O que tinha dado nela? Perguntava-se insistentemente, sem cogitar um motivo consistente.
Afinal... Por que mesmo ele se importava? Era outra questão sem resposta.
- Então acho que é isso aí. – Thur disse se colocando para fora da porta, assim que Lua a abriu para ele.
- É. – disse inexpressiva, encostando-se no batente.
- Obrigado pelo lanche. – parou de frente pra garota, analisando-a novamente à procura de qualquer sinal sobre o motivo de sua irritação.
- De nada. – encarava-o séria. Ele ficou parado, sem saber o que interpretar disso.
- Eu... Já vou indo. – não era a hora dela falar alguma coisa sem sentido e dar um sorriso encantador?
- Tchau.
- Até amanhã, então. - sentia-se extremamente ferido pela sua indiferença.
- Até. - ela falou impaciente.
- Boa noite.
- Arthur, você vai ou não? – Luinha arqueou uma das sobrancelhas.
- Não... Er... Vou. – colocou as mãos nos bolsos. – Pode me chamar de Thur. – suspirou, olhando pra baixo.
'Pode me chamar de Thur? Porra, Aguiar! Você pode fazer melhor! Pensou consigo mesmo.
- Ok, Thur. Boa noite. - ela disse dando o melhor sorriso que conseguia, observando o rapaz enfim dar de costas em direção ao carro. Mas tudo bem, afinal, ela era só mais uma dor de cabeça, certo?

Londres; Dockland; Quinta-feira; 11:31 da noite;

-“Deixe vir o que me aguarda.” William Shakespeare. – Thur disse colocando o livro no peito e dando um longo suspiro enquanto mirava o teto. – E o que me aguarda, Spike? – o cachorro o olhou desentendido, depois bocejou.
Capítulo 8 -

Londres; Highgate High School; Sexta-feira; 11:59 da manhã;

- Melzinha. – Sophia disse chegando à mesa onde a amiga se encontrava. Rod, Chay e Lua olharam-na curiosos. – Ethan não veio à aula. – passou os olhos por todas as mesas, demorando um pouco mais na dos garotos do time de natação. De fato, ele não estava lá.
- Estranho, não é? – a amiga estreitou os olhos. – mica também não veio.
- Quem liga pro Borges? – revirou os olhos, impaciente.
Lua analisou-a. Ela era bonita. Sua pele, um pálido britânico – não tanto quanto a pele deThur. Estava com os cabelos bagunçados.
- Hey, hey, Sop! – Chay disse levantando as mãos. – Eu sei que o mica é um bosta mesmo, mas tem pessoas aqui que se importam com ele.
- Então onde é que ele está? – a garota desafiou, colocou as duas mãos na cintura.
- Provavelmente tomou um porre ontem e não se recuperou a tempo. – Rod balançou os ombros de leve, fazendo a prima rir baixo.
- E o Ethan? Ontem nem telefone ele atendeu...
- Sobre esse aí eu não sei nada não. – apoiou os cotovelos na mesa.
- Quem liga pro Ethan? – Chay copiou o tom que a garota fez, fazendo-a dar o dedo.
- A questão é que ele sumiu, e eu tenho a estranha impressão que isso está relacionado aoBorges...

Thur estava escorado no corredor, como sempre na hora dos intervalos, mas dessa vez não estava completamente sozinho. Tinha um livro em mãos.
- Que nojo o mundo, esse jardim de ervas daninhas. – riu baixo, dando um sorriso sombrio em seguida.

- Okay, Melzinha. Todos já foram embora, ainda temos cinco minutos pra chegar à sala. Vamos pensar. – Chay apoiou o queixo na mão, fixando o vazio.
- Você sabe que esse nunca foi o seu forte, amor. – a garota deu uma risada.
- Deixa de ser chata. – beijou seu pescoço. Ainda estavam sentados à mesa do refeitório, que estava deserto. – Sobre o que mesmo foram os flashbacks?
- Todos eles foram sobre a Ivane.
- Alguém mais aparecia?
- Em um deles, a Sophia e o Duan. – colocou o dedo indicador na boca, como se analisasse as lembranças.
- E o que eles estavam fazendo? – estimulou o raciocínio da namorada.
- A Sop estava conversando comigo. Estávamos esperando a Iv falar qualquer coisa com o ele na porta do ginásio.
- E o que teve em comum entre os dois flashbacks? – perguntou calmamente.
- Em comum...? – Mel estreitou os olhos. – Deve ser que todos os dois foram... – uma luz lhe veio à cabeça.

Arthur ainda estava com as costas apoiadas na parede do corredor quando Lua passou rapidamente por ele, sem olhá-lo. Ela estava o ignorando?
A menina tinha os cabelos presos por um rabo de lado, deixando à mostra sua nuca. Thur expirou mais devagar ao vê-la. Ela passava a impressão de ser tão indefesa...
- Hey, você. – disse alto pra que ela o ouvisse. Por que estava se preocupando tanto com essa garota? Por que ela?
- Pois não? – Luinha virou-se a contragosto. Algumas pessoas que passavam pelo corredor olharam pros dois.
- Você se incomodaria muito de vir aqui? – olhou pra baixo. O que, diabos, tinha dado nele?
Lua deu passos largos em sua direção, apesar da expressão séria.
- O que foi? – perguntou.
- Eu... – o rapaz coçou a cabeça, sem graça. – Trouxe esse livro. Acho que pode nos ajudar nos estudos sobre...
- Contos de Shakespeare? – ela o interrompeu, lendo o título, na capa.
- É um resumo.
- Ah, bom. – um breve silêncio se instalou entre os dois, fazendo com que ela cruzasse os braços atrás do corpo.
- Olha... – o garoto começou a falar, pigarreando em seguida. – Se quiser, não precisa pegar táxi pra ir pra casa.
- Está me oferecendo uma carona hoje de novo, Aguiar? – arqueou uma sobrancelha, desconfiada. Quem era ele e o que tinha feito com o impenetrável Arthur Aguiar?
Lua acabou segurando um sorriso, ao ter esse pensamento.

Entrou na sala encucada. No dia anterior mesmo o garoto a tinha chamado de dor de cabeça. Não com essas palavras, mas tinha. Ela era um atraso de vida pra ele, no fim das contas. Então pra quê oferecê-la carona?
Andaram lado a lado no corredor sem trocar uma palavra um com o outro. Thur parecia estar um pouco mais corado do que de costume. Tão pouco que era quase imperceptível. Não aos olhos dela. Por que ela percebia esse tipo de alteração nele? Isso era um mistério. Aliás, tudo o que rodeava Arthur Aguiar era um mistério. Sua vida, suas preferências, sua relação com Ivane Whinsky...

O celular de Rod vibrou duas vezes no meio da aula do senhor Walker, acordando-o de seus pensamentos sobre o ano anterior. Quanta coisa tinha acontecido!
Tirou-o do bolso cuidadosamente, pra que o homem grisalho não o visse. Tinha recebido uma mensagem. De mica.

- Opa! – Duan gritou ao esbarrar em Lua no corredor, depois do sinal do fim da aula.
Vários alunos perambulavam pelo corredor, tornando o local cheio, como num formigueiro.
- Já é a segunda vez. – Luinha riu sem graça olhando em seus olhos esmeralda. – E aí, como vai?
- Muito bem, garota brasileira. E você? – ele esboçou um sorriso provocante.
- Bem, também. – Lua colocou uma mecha do cabelo que tinha soltado da gominha pra trás da orelha, sem jeito.
- Está indo pra casa agora?
- Estou, na verdade. - ela respondeu.
- Posso pelo menos te acompanhar até o carro? – estendeu a mão como se pra segurar a pasta dela.
- Po... – Luinha gaguejou, observando um garoto passar andando ao seu lado. – Pode.

“Lua e Duan?! Hunf.” Thur pensou ao passar pelos dois, ficando ainda mais sério do que de costume. Aquela garota parecia ter o poder de atrair a todos. E ele sabia que se incluía nisso...

Londres; Highgate High School; Sexta-feira; 5:13 da tarde;

- Me atrasei? – Luinha chegou ofegante à garagem, já podendo observar o rapaz na posição de sempre, encostado ao Audi. - Ah, é claro que sim.
A expressão de poucos amigos dele indicava que devia estar no mínimo aborrecido. Ela abaixou um pouco a cabeça, esperando algum tipo de resposta mal educada, mas sabendo que ele tinha toda razão, já que ela o atrasara.
- Tudo bem. – ele disse gentilmente, surpreendendo-a.
Thur abriu a porta para que a menina entrasse, assim como fizera no dia anterior. Para ela, definitivamente, nada mais fazia sentido.
Observou-o entrar pela outra porta, já colocando o cinto e girando a chave.

- Olha lá, Scott. – Bennet disse entre os carros, fazendo o amigo espiar o veículo que se afastava. – Eles estão mesmo de casinho.
- E isso é ótimo. – o outro deu uma risada sombria.

- Eu não te entendo. – ela disse enrolando uma mecha no cabelo. O garoto a olhou de rabo de olho. – Uma hora não me quer por perto. Volta atrás. Fala que eu sou uma dor de cabeça, e depois age como se estivesse arrependido. Vamos lá, Thur, qual é a sua? – juntou as sobrancelhas. Ela já parecia à vontade em chamá-lo pelo apelido.
Arthur continuou a olhar pra frente por alguns instantes, depois respirando fundo e murmurando as palavras:
- Você não é uma dor de cabeça, Lua. – chamou-a pelo nome pela primeira vez, fazendo com que o sangue percorresse mais quente tanto em seu corpo quanto no dela.
- Pode me chamar de Luinha. – disse automaticamente.
- Okay, Luinha. – ele curvou os cantos da boca, numa tentativa falha de sorriso. – Você não é uma dor de cabeça pra mim.
- Mas eu te perturbo. – os olhos dele se estreitaram. Não tinha como discutir sobre isso.
Ambos permaneceram um tempo em silêncio, fazendo com que ele apertasse o botão de ligar o rádio.
Thur batia os dedos no volante no ritmo da música, enquanto Luinha pegava o papel da capa do CD pra olhar a letra.
Você em seu mundo, separado do meu por um abismo. Ouça, me chame e eu voarei para o seu mundo distante. – a garota traduzia pro inglês a música de Andrea Bocelli, fazendo Arthur tampar a respiração por alguns instantes. – Por você eu voarei. Espere por mim, eu chegarei. Você é o fim da minha viagem. Por você eu voarei por céus e mares, até o seu amor. Quando abrir os olhos, por fim, com você vou estar... - sentiu o coração descompassar por alguns segundos, depois virou seu olhar terno na direção do menino e perguntou, com a voz doce: - Está apaixonado, Thur?
O carro entrou em alguns segundos silenciosos. Depois de um momento, o rapaz deu um sorriso torto e respondeu:
- Eternamente. – Luinha olhou pra baixo, sentindo um calor em seu peito, depois em seus olhos. Era uma reação estúpida, ela julgava. – E você?
Ela pensou por um momento.
- Acho que sim.
- E onde ele está?
- Muito distante. – riu baixo. – O oceano nos separa. – tornou novamente a olhá-lo. – E ela?
- Somos separados por um abismo muito maior que o oceano. – sussurrou, fazendo-a se calar.

Londres; Lowden Avenue; Sexta-feira; 8:57 da noite;

- Entrega logo pra ele, Kimberly. – Brittany ordenou, fazendo a garota estender um envelope.
Estava escuro, mas não o bastante pra que os rostos naquela rua ficassem irreconhecíveis. O homem que recebia o papel das meninas deu um sorriso malicioso. Tinha uma cicatriz na bochecha.
- Essa é a última parte do pagamento, nunca mais nos procure. – Kim irritou-se com os braços trêmulos.
 


"Quando vejo alguém fazer algo que julgo errado; cuido para não fazer o mesmo"
(Prof. Kilme Bezerra)



Londres; Highgate High School; Segunda-feira; 10:17 da manhã;

Mural de avisos da escola:

“Horário da educação física feminina alterado para 4:00p.m”

- Yes! – Mel comemorou, abraçando a amiga pelo lado.
- O que tem de tão bom a respeito disso, Melzinha? – Luinha olhou o mural com cara de tédio.
- É o horário do treino de futebol masculino do colégio. – Deu o mesmo sorriso que uma criança faz quando ganha um pirulito.
- E...?
- Que raciocínio lerdo. – revirou os olhos. – Gatinhos suados. – disse o óbvio.
- Chay, pelo jeito, é esquecido em horas como essa. – a garota riu baixo.
- Claro que não. Eu o amo. Mas não é por causa dele que eu vou parar de ter bom gosto, não é? Não sou cega.
- Okay, okay, “senhorita saidinha”. Vamos voltar pra sala.

- Olha isso, cara. – Bennet disse pra mais dois garotos, apoiando-se nos armários do corredor pra olhar o quadril de duas garotas que passavam. Arthur, que colocava o livro de cálculos de volta no seu armário, olhou de rabo de olho o grupo de garotos, em seguida, o que eles observavam.
- Mal dá pra acreditar que vamos ver isso todo dia na hora do treino. – outro sorriu maliciosamente.
- Isso vai ser tudo de bom, chapa. – o terceiro repetiu o sorriso.
Thur focou o fundo do armário, perdendo-se em pensamentos por alguns segundos. Depois fechou-o e seguiu pra sala de aula, com as mãos nos bolsos.

Londres; Highgate High School: Ginásio Poliesportivo; Segunda-feira; 5:13 a tarde;

- O QUE NÓS QUEREMOS? – uma ruiva gritou levantando bem alto os pompons azuis de torcida.
- GARRA.
- O QUE NÓS QUEREMOS?
- UNIÃO.
- QUAL É O TIME?
- EAGLES! – as demais começaram a fazer a coreografia, levantando alto as pernas e balançando os pompons.
- Argh. – Sophia disse parando de dançar e levando a mão ao peito, ofegante.
- Tudo bem, Sop? – Mel perguntou aproximando-se dela.
- Tudo bem, Melzinha. É só que essa vida de líder de torcida está me deixando exausta.
- O mesmo digo eu. – puxou o colant um pouco pra frente, soprando dentro do mesmo. – Vamos sentar um pouco. Talvez melhore.
Sentaram-se no início da arquibancada. Sophia ainda estava ofegante, deixando a amiga preocupada.

Londres; Highgate High School: Porta do ginásio; Segunda-feira; 5:15 da tarde;

- Deu sorte, Aguiar. – o treinador Stevens disse arrumando o boné na cabeça. – O senhor Hills acabou de quebrar a perna. Estávamos mesmo procurando alguém pra substituí-lo. E adivinha qual era a posição dele? – deu uma gargalhada calorosa. – Muita coincidência, não acha?
- Bastante, senhor.
- Espero você aqui pro treino, começando amanhã.

Londres; Highgate High School: Ginásio Poliesportivo; Segunda-feira; 6:02 da tarde;

- Parece que já terminamos o treino por aqui, garotas. – a treinadora das líderes de torcida disse, batendo palmas. – Vão pra casa e descansem. A grande estréia está chegando.

mica deu uma tragada no cigarro, sentado na arquibancada. Observou todo o treino das líderes de torcida, como fazia toda segunda e quarta. Percebeu alguém aproximar-se e virou o rosto pra olhar.
- Oi, mica. – a garota beijou-o na trave da boca, de surpresa.
- Kimberly. – disse seco, virando-se pra frente.
- Nossa. Por que tanta frieza? Você não fala comigo direito desde que...
- Desde o quê, Kim? Você já fudeu com a minha vida mesmo. O que mais quer de mim? – irritou-se.
- Não precisa ser grosso.
- Me deixe em paz. – levantou-se descendo as arquibancadas, vendo o ginásio já vazio.

- Droga. – Micael disse passando as mãos contra o corpo, sentindo o vento frio tocar-lhe a pele. Passeou pela grama verde que estava escura, graças ao tempo.
Amaldiçoava-se mentalmente por ter estacionado o carro longe do ginásio. Onde estava com a cabeça?
Finalmente avistou o automóvel vermelho estacionado na rua. Tirou a chave do bolso para abri-lo.
Suspirou, colocando a mão na alça da porta para puxá-la, quando sentiu uma espécie de cano gelado encostar-se a seu pescoço. Sentiu a espinha gelar ainda mais.
- Passa a chave, que tudo vai ficar bem. – uma voz masculina dura e rouca disse atrás do mesmo. mica levantou as duas mãos.
- C-Calma, cara. – gaguejou. – Já vou passar. Só... Calma. – virou a mão direita devagar, estendendo a chave com os dedos.
- Deixe-o em paz. – outro rapaz disse, fazendo com que mica espremesse os olhos.

Thur olhava o assaltante sem demonstrar-se intimidado. Imprudência? Quem sabe.
- Aguiar, você está louco? – Micael sussurrou, sendo virado pra frente do rapaz pelo homem armado.
- Um justiceiro? Era o que faltava. – o homem riu em deboche. – E por que você acha que eu o deixaria em paz?
- Pra quê ter um Fiesta vermelho se você pode ter um Audi preto? – apontou pro próprio carro com o queixo, estendendo a chave com a mão esquerda, e levantando a outra mão. – Solte o garoto e o carro é seu.
- Acha mesmo que eu vou cair nessa? – o ladrão disse sério, envolvendo o pescoço de mica com o braço e aproximando mais ainda o revólver de sua testa. Esse, por sua vez, começou a rezar mentalmente, perdendo a respiração. – Prove que essa é a chave do carro. – Thur sorriu torto, apertando um botão no chaveiro o qual estava a chave, e fazendo o alarme do Audi disparar.
- Satisfeito?
- Vamos fazer uma troca. – o homem umideceu os lábios com a língua. – Você me passa a chave. Eu te passo o garoto.
- Fechado.
- Quando eu contar até três, você manda a chave. – Arthur balançou a cabeça positivamente. – Um. Dois. Três. – empurrou mica na direção do rapaz. Thur segurou-o com o braço, impedindo-o de cair. Lançou o chaveiro diretamente na mão do assaltante.
- Agora quietinhos. – ele disse ainda apontando a arma para os dois e apertando o botão de abrir o carro. Seguiu para o Audi, fechando a porta antes de deixar de mirá-los.
- Deus. – mica sussurrou trêmulo, observando o veículo preto se afastar. – Deus... Deus! – repetiu. Thur deu uma risada baixa. – DUDE, QUE PORRA FOI ESSA? – balançou os ombros do menino que agora gargalhava. – SÉRIO! COMO ASSIM O CARA APONTOU UM REVÓLVER PRA MINHA TESTA? CALMA. VOCÊ DEU SEU AUDI POR MIM? – soltou o ar, fazendo um som estridente. – Agora eu estou me sentindo bem de verdade. Porra, eu valho pra você o que? Quanto custou aquele carro?
- O preço não importa. – disse já retomando a aparência fria.
- Não, sério. Você perdeu o seu Audi A-oito. Por mim. Você é louco?
- Eu tenho como localizá-lo e pará-lo por satélite, Borges. – olhou o Fiesta. – Era melhor do que você perder seu carro pra sempre.
- É. Meu pai se nega a me dar um melhor. Ele acha que eu sou muito irresponsável. – fez aspas com os dedos, apesar de ainda estar nervoso. – Precisa de carona pra algum lugar? De um leal servo?
- Não, Micael. Obrigado. – tirou o celular do bolso da calça social preta. – Eu chamo um táxi.
- Quê? Nunca. Gastar mais dinheiro do que você já gastou comigo hoje? Eu insisto. – Thur alternou seu olhar de mica para o veículo vermelho. O aparelho em sua mão começou a tocar.
- Alô?
- Margarida, cadê você? – reconheceu a voz do outro lado da linha.
- Ainda estou na escola, dude.
- Se eu fosse você viria pra cá agora. O Josh já está piradão aqui com o atraso do ensaio.
- Eu já estou... Er... – olhou novamente o carro vermelho e os olhos pidões de mica. – Indo.

Londres; Dockland; Segunda-feira; 7:47 da noite;

- É aqui. Obrigado.
- Quê isso, chapa. Eu que agradeço. Você salvou a minha vida e o meu couro. – fez careta com a imaginação do pai descobrindo que o carro havia sido roubado. Thur abriu a porta do Fiesta já impulsionando o corpo pra fora. – E... Aguiar. – olhou pra trás, dando de cara com um Micael sério. – Sobre aquele assunto... Eu nunca acreditei que tivesse sido você.

- Qual é, margarida? Quase mata seu irmãozão aqui de preocupação. – Duan disse descendo do palco improvisado e indo em direção ao rapaz perdido em pensamentos. – Margarida?
- Oi? – situou-se no local.
- Onde você estava?
- Escola. Preciso ligar pro seguro do carro. Comecem o ensaio sem mim. – começou a discar números no celular, deixando os outros dois garotos confusos.

Londres; Highgate High School; Terça-feira; 12:02;

- Hey, Aguiar. – mica disse aproximando-se do garoto escorado na parede do corredor. Esse soltou um suspiro impaciente. – Trouxe uma coisa em agradecimento por você ter salvado a minha pele.
- Bolo de novo não. – murmurou, olhando pra cima.
- Quê? – arqueou as sobrancelhas. – Não. Vamos jogar baralho!
Aquele seria um ano muito, muito longo. 



Não existe nada de completamente errado no mundo, mesmo um relógio parado, consegue estar certo duas vezes por dia.Paulo Coelho
Londres; Highgate High School; Terça-feira; 9:43 da manhã;

- Bem, classe... – ela dizia andando de um lado pro outro na frente do quadro. – Como todos vocês sabem, hoje é o dia do sorteio das duplas pros trabalhos desse ano. Elas já foram sorteadas por mim. Só falta mostrá-las a vocês.
- Trabalhos desse ano? – Lua cochichou pra Mel. – Todos? Pensei que fosse só de literatura.
- São todos. Mas o principal é o de literatura, da senhora Paskin mesmo. – balançou os ombros. – Todo ano fazemos o trabalho sobre um autor diferente.
- Vincent e William. – começou a pronunciar os nomes.
- Tomara que eu saia com você. – cruzou os dedos, fazendo a amiga sorrir.
- Também queria sair com você, mas isso é difícil. A sala tem quarenta alunos. – fez careta.
- Droga.
- Johnatan e Avril; Evelin e Mel...
- Adeus amiga. – Melzinha deu um suspiro derrotado. – Vou ter que fazer com a insossa da Evelin.
- Lua e... – senhora Paskin olhou-a por cima dos óculos, dando um pigarro em seguida. Sabia como prová-los que o rapaz não era o culpado, ou pelo menos, dar uma chance ao mesmo. Talvez uma pequena trapaça fosse inofensiva... – Arthur.
A menina sentiu o coração descompassar olhando em direção a porta e observando o garoto com os lábios semiabertos, que fitava a professora como se estivesse surpreso. Fingiu não perceber que todos os alunos da sala se entreolharam.
O rapaz virou os olhos pra ela repentinamente, fazendo-a engolir a seco e virar-se pra mulher de roupas escuras, na frente da turma.

Londres; Civic prateado;Terça-feira; 3:25 da tarde;

- O QUÊ? – Rod gritou, deixando o espanto subir-lhe a cabeça. – Você? Dupla com aquele cara? NUNCA.
- Ele salvou a minha vida, Rod. Por que não pode acreditar que ele é uma boa pessoa? – cruzou os braços.
- Ele... Ele não é. Pode até ser que ele tenha salvado a sua vida. Mas isso foi algo inédito. Ele não...
- Admita que você não tem argumentos.
- Ok, não tenho. Mas e daí? Eu não quero você junto dele.
- Por que não?
- Porque não. – focou na direção. Lua respirou fundo, tentando se acalmar. Ela era tratada como uma criança que tinha que ficar alheia aos assuntos, afinal.
– Desculpa. Eu sei que não é justo com você.
- Que bom que sabe.
- Mas tente entender, Luinha. Eu só quero o seu bem. – franziu o queixo. A garota segurou seu ombro.
- Então me deixe ser independente. Começando por eu fazer dupla com ele. – o primo apertou mais sua mão no volante.
- Ok. Mas qualquer encontro de dupla será lá em casa, e sob minha supervisão. – decretou.

Londres; Highgate High School; Quarta-feira; 11:57 da manhã;

- Cara, eu amo melancia. – Chay comentou enchendo a boca, na hora do intervalo.
- Onde você achou melancia no cardápio? – a namorada olhou-o interessada. As pessoas de sempre estavam à mesa: Rod, mica, Luinha, Chay e Mel.
- Eu trouxe de casa.
- Não sabia que podia trazer comida de casa. – Lua disse, apoiando o cotovelo na mesa.
- Não é proibido.
- Eu já contei a piada do bêbado no cemitério? – mica perguntou.
- Estava demorando... – Rod resmungou.
Enquanto os amigos prestavam atenção na piada, a garota passou os olhos por todas as pessoas no refeitório: A mesa das líderes de torcida, onde a ex-namorada de mica estava sentada; a mesa dos jogadores de futebol, onde estavam Scott e Bennet; a mesa de alguns rapazes descolados, que estavam sentados com duas meninas com a saia curtíssima. Tudo parecia estar em seu devido lugar. Menos uma pessoa...
- Melzinha. – chamou baixo. A menina olhou-a. – Er... Todos os alunos não deveriam passar o intervalo no refeitório? – Mel passou o olhar devagar por todos, virando-se novamente praLuinha.
Ele passa o intervalo no corredor, se é o que quer saber. – balançou os ombros, apesar de séria.
Lua endireitou o corpo na cadeira, vendo os três amigos disputarem quem comia mais depressa.

- Ok. Chega de comer. Temos aula do senhor Walker agora. Ele detesta que cheguem atrasados. – Mel disse puxando o braço da garota, que ainda enchia a boca com um pedaço de torta.
- Está tão boa. – fez bico.
- Sério. Até os meninos já foram embora! Isso é um péssimo sinal. – brincou.
- Vamos, então.
Saíram do refeitório subindo as escadas pro terceiro andar rapidamente.
Quando estava prestes a terminá-las, onde Mel a esperava, Luinha chocou seu ombro contra o de outra pessoa, que descia.
- Desculpe. – disse encarando os olhos verdes do garoto, que retribuiu o olhar com uma espécie de felicidade, espanto e horror ao mesmo tempo.
- T-tudo bem. – juntou as sobrancelhas. – A culpa foi... – perdeu a respiração por uns instantes. – Minha.
- Tchau, então. – deu um sorriso amarelo, voltando a subir as escadas e parando por fim, no último andar.
- Espera! – ele gritou. – Quem é você?
- Eu? – apontou pra si mesma. A amiga alternava o olhar dela para o menino loiro, que consentiu. – Lua Marques.
- Lua... – repetiu, com a voz baixa. – Meu nome é Duan Adams. Prazer. – sorriu amigavelmente, depois virou seu olhar pra garota ao lado. – Ei, Melzinha, como vai?
- Muito bem, Duan. – respondeu. – Vamos, Luinha. O senhor Walker...

Londres; Oxford Street; Quarta-feira; 8:02 da noite;

- Luinha do céu, você entrou em coma ou o que? – Rod perguntou do batente da porta, fazendo a garota abrir os olhos pesados e olhá-lo. – Está dormindo desde que voltamos da escola...
- Já vou levantar, molengo. Um segundo. – balbuciou.
Tinha sonhado com Nick. Ela sabia que sim.
Ainda podia sentir seu toque nos sonhos, seu cheiro, ver os detalhes do seu rosto. É, talvez ela ainda o amasse. No fundo. Mas nada a faria desistir do sonho de ir pra Inglaterra. Nada.
Sentou-se na cama examinando o quarto. Quase do tamanho do seu, no Brasil. O armário de carvalho, o piso de carpete. Aconchegante.
Apoiou-se pra levantar, sentindo um ponto dolorido no braço esquerdo: onde Aguiar tinha puxado-a, impedindo que fosse atropelada.
Aguiar. Outra pessoa que a intrigava. Era um garoto estranho, apesar de lindo. Aos seus olhos, e acreditava que aos de todos, parecia ser perigoso e misterioso ao mesmo tempo. O tipo de cara que oferece riscos. Estilo bad boy. Isso a atraía nele. Aliás, o que ele tinha que não a atraia? Seus cabelos organizadamente bagunçados, sua pele um pouco pálida, boca rosada e os olhos. Olhos frios de um atirador. Foscos. Sombrios. Atraentes.
Expirou passando a mão direita de leve no braço dolorido. Ela não o tinha agradecido devidamente. Devia sua vida a ele. Mas o que fazer para demonstrar sua gratidão?

- Tio John? – gritou da cozinha. O senhor assistia futebol com o filho, na sala. – Onde tem farinha?
- Farinha, Luinha? – Rod perguntou confuso.
- No segundo armário, querida.
- Pra quê? – o primo voltou a perguntar.
- E a batedeira?

Londres; Highgate High School; Quinta-feira; 11:54 da manhã;

- Luinha, posso te fazer uma pergunta? – Mel disse observando-a, a caminho do refeitório. A garota assentiu. – O que tem nessa trouxa que você está carregando pra lá e pra cá desde o início das aulas?
- Ah. Isso é... Nada. – balançou os ombros. – Melzinha, você pode ir na frente? Estou apertada pra ir ao banheiro. – apontou pra placa do feminino, quando passaram por ele.
- Claro, então te espero na mesa.
- Não repare se eu demorar. Eu estou nos dias. Sabe como é. - fez careta.
- Pior é que sei. Não se preocupe. Quando eu menstruo fico horas agonizando de cólica, eu entendo. – mandou um beijo no ar, continuando seu caminho.
Lua acompanhou-a com os olhos até que ela virasse o corredor, depois deu de costas e subiu novamente a escada pro terceiro andar.

Estava escorado na parede, como sempre. Olhava o teto como se pudesse ver alguma coisa de interessante.

“– Por que você tanto olha pra cima? – ela perguntou, curiosa.
- Algum problema com eu olhar pra cima? – juntou as sobrancelhas. Estavam sentados na grama do parque Russel. A garota estava encaixada entre suas pernas, e ele afagava-lhe os braços.
- Não. Mas é uma mania esquisita.
- Mania esquisita é você ficar reparando em tudo que eu faço, Iv. – brincou, dando-lhe um beijo na bochecha.
- Que culpa eu tenho? Eu gosto de te observar.”


Deu um sorriso leve, fechando os olhos.
Depois de um tempo apenas tentando relembrar todos os detalhes daquela lembrança, ouviu passos aproximando-se no corredor. Provavelmente Scott, procurando por uma nova surra. Tentou não se incomodar, e manter-se com os olhos cerrados.
Quando chegaram ao seu lado, os passos cessaram. Sem socos. Sem chutes. Sem provocações... Suaves demais pra ser de um zagueiro brutamontes.
Abriu os olhos mirando seu lado esquerdo de rabo de olho e sentindo o coração acelerar.
O que ela estava fazendo ali? Droga.
- Bom dia. – deu um sorriso que ia de uma orelha a outra.
Ele ficou calado, apenas mantendo-a em foco.
- Eu sei que você não costuma a ter companhia na hora do intervalo. – encostou-se na parede ao seu lado. – Não sei se é porque você não gosta, ou porque você tem medo de se relacionar. – ‘Medo de me relacionar? Hunf’, pensou em deboche. – Mas de qualquer forma, se não se importar, quero te acompanhar no intervalo de hoje. Fiz até um bolo de chocolate pra você, em agradecimento por ter salvado minha vida. – estendeu a trouxa azul. Ele olhou a vasilha, depois subindo para sua mão que a segurava, seu braço, seu pescoço, até chegar ao rosto delicado.
- Não preciso disso. – respondeu seco.
O sorriso de Luinha foi se desfazendo aos poucos, recolhendo a mão estendida e juntando-a ao peito.
- Me desculpe. – respondeu baixo e rouca. – Eu vou embora.
Thur observou a garota virar de costas e se afastar, passando as mãos pelos cabelos com o peito carregado. Merda. Por que ela fazia isso com ele?
- Hey, você. – disse mais alto. – Espera. – a menina acelerou os passos, ignorando-o. – Espera. – começou a segui-la.
Quando por fim estava perto o bastante, segurou seu ombro. Ela virou-se a contragosto, olhando-o magoada.
- Eu não... – deu um pigarro, olhando-a nos olhos. – Eu não quis dizer isso. Me desculpe.
Lua encarou-o. Seus olhos de atirador estavam sinceros, apesar de receosos. Talvez ele realmente tivesse um motivo pra ser tão fechado. Do que adiantaria ficar brava com ele?
- Tudo bem.
- P-pode... – coçou a nuca, incomodado. – Pode passar o intervalo comigo. Se quiser...
- Vai aceitar o bolo? – arqueou uma sobrancelha. Thur estendeu a mão pra ela, que sorriu em seguida.

- Você não vai falar nada? – Luinha perguntou sentada no corredor, ao lado do garoto que colocava um pedaço do bolo de chocolate na boca.
- O bolo está bom. – respondeu com a expressão neutra.
- Mais nada?
- Não tenho nada a dizer. – um breve silêncio instalou-se entre os dois.
- Mas eu tenho. – ela balançou os ombros. – Eu sou brasileira, sabe. – ‘Brasileira?’– Então eu tomei um choque quando vim pra essa escola. Não que seja muito diferente das escolas no Brasil, mas as pessoas me olham torto. Até cheguei a pensar que fosse o jeito britânico de se olhar pros outros, mas não. – abraçou os joelhos. – E sabe o que é o mais estranho? –Thur olhou-a seriamente, acompanhando o raciocínio. – É que eu tenho a impressão que tudo isso está relacionado a você...
Soltou o pedaço de bolo dentro da vasilha, olhando para a parede a sua frente. Expirou devagar e inaudivelmente, deixando seus braços caírem de forma que encostasse a vasilha no chão. Lua também estava parada ao seu lado, e pareceu não ter nenhuma reação.
Ninguém tinha dito a ela. Deu uma risada baixa e seca.
- Não te falaram nada sobre mim? – quebrou o silêncio.
- Apenas que era pra eu ficar longe de você. – pigarreou, vendo o menino expirar depressa com um sorriso de deboche na face e virar o rosto pro outro lado. – Me desculpe, eu não quis dizer isso.
- E por que não obedeceu? – perguntou-a baixo.
- Porque... você salvou a minha vida. Não é uma má pessoa. Eu acho. – juntou as sobrancelhas, olhando os joelhos.
- Ninguém te garante.
- Você não está fazendo nada ruim agora, está? – ele riu seco.
- Você não sabe nada sobre mim.
- Que tal começar a me contar? – propôs com um sorriso doce nos lábios.
- Tenho mais o que fazer do que falar sobre a merda da minha vida. – levantou-se.
- Okay. – ela balançou os ombros. – Pelo menos me diz: Qual é o nome da sua banda?
- Quê?
- Aquela que tocou no pub... No Mark’s. – levantou o queixo para olhá-lo.
- The Lumps. – cruzou os braços, voltando a olhar a parede.
- Nome curioso. – disse, vendo-o bufar. – Você não é mau, Arthur. – comentou, apoiando-se nos joelhos para levantar-se. – É apenas solitário. – Sorriu leve pra ele, antes de dar as costas e voltar pra escada. Thur acompanhou-a com os olhos até que a mesma desaparecesse de vista. Seu corpo estava mais quente. Era como se tivesse recuperado um pouco da vida que lhe fora roubada. Mas a que se devia isso?
- Luinha! – o primo gritou novamente com a boca cheia, da mesa de sempre. Chay e mica disputavam na queda de braço, Mel ria histericamente de tudo.
Aproximou-se com um sorriso frouxo.
- Demorou. Onde você estava?
- Problemas femininos...
- Argh! Não entre em detalhes, por favor. – fez careta, fazendo com que a prima risse. 

                                 Escrita por : Lan

Capitulo 3

Com o tempo eu aprendi o significado de amor ao próximo. Não me ama? Próximo!


Londres; Highgate High School; Segunda-feira; 10:50 da manhã;

- Ai, que saco, é a aula de física. – Lua comentou dando um suspiro. A garota ao seu lado riu baixo. Estavam dentro da sala.
- Quê isso. Adoro física. – mordeu a caneta. – Aula de quê agora?
- Biologia, talvez.
- Já está decorando os horários, gostei de ver. – sorriu. – Já faz uma semana que você entrou na escola. O que está achando?
- Sinceramente? – a amiga consentiu. – Diferente.
- Do que?
- Não é “do que”, Melzinha. As pessoas me olham estranho. É porque sou estrangeira? Quem sabe. – balançou os ombros. Mel comprimiu os lábios.
- É, quem sabe.
Deu um suspiro e resolveu olhar por cima dos ombros, em direção à cadeira em frente à porta. O garoto dos olhos foscos encarava-a com o lábio superior levemente sobreposto ao outro e as sobrancelhas mais baixas. Sua expressão sempre séria a fazia tremer por dentro. Mirava-a como um atirador mira o alvo – frio, imóvel.
- Aquele ali é o que mais me assusta. – cochichou, virando-se pra frente.

Horário de almoço na Highgate, todos já estavam sentados à suas mesas, brancas e parcialmente limpas. Lanchavam e jogavam conversa fora.
- Ok, ok. Agora olha essa: O que é um tênis afundando na areia do deserto?
- Já chega, mica. Suas piadas são horríveis. – Rod disse colocando maionese em seu hambúrguer.
- Deixa ele, Rod. Eu quero saber. – Luinha deu de ombros.
- Ela ainda tem paciência porque é nova por aqui, espera só até semana que vem. – Chay revirou os olhos. – Titanike, mica. Você contou essa quinta-feira.
- Ah, droga. – socou o ar. – E qual é a diferença entre a bicicleta e o vaso sanitário? Essa eu já contei?
- Não, não contou. – Mel disse sugando o suco de uma caixinha, pelo canudinho.
- Tem necessidade mesmo de falar? – Rod apoiou o queixo na mão.
- Tenho. – sorriu. Os amigos fizeram sinal pra que ele prosseguisse. – A bicicleta você senta pra correr, e o vaso sanitário você corre pra sentar. – deu um sorriso idiota, esperando a reação dos demais.
- Por que toda vez que você conta uma piada sem graça você tem que fazer a cara do burrinho do Emule? – as pessoas na mesa gargalharam, fazendo mica dar o dedo.
- É uma boa piada.
- Eu também gostei. – Luinha concordou, percebendo que alguns garotos da mesa ao lado examinavam-na.
- Scott e Bennet. – Mel cochichou baixo, pra que só ela ouvisse, referindo-se aos rapazes. – Zagueiro e capitão do time de futebol da escola. Eles não prestam.
- Parece que ninguém por aqui presta...
- Só o Chay. – sorriu torto, abraçando o namorado enquanto ele gargalhava de alguma careta de Rod.

O sinal para os alunos voltarem às salas bateu, fazendo com que Thur desgrudasse suas costas da parede do corredor. Era onde sempre passava o recreio. Sozinho. Apenas com seus pensamentos.
Deu alguns passos em direção ao seu armário, quando percebeu que o barulho de seu tênis no chão não era o único.
- Você a viu, Aguiar? – uma voz masculina em tom de deboche manifestou-se. – Aquela garota? – olhou o menino moreno e alto por cima dos ombros, com os olhos sérios e impacientes. – Sabe quem ela me lembrou muito? Ah. Claro que sabe. – Thur virou-se pra frente novamente, continuando a andar e ignorando-o. – Eu estava pensando em chamá-la pra sair. Tenho boas esperanças sobre isso. – ouvia os passos aproximarem-se dele. – Talvez ela saia por aí dando pra qualquer um, exatamente como a... – apertou os dentes, segurando fortemente o rapaz pela gola da camisa, sendo tomado pelo ódio. Os olhos deThur estavam estreitos, enquanto o outro dava um sorriso malicioso.
- Não complete essa frase, Scott. – cuspiu o nome. – Pro seu próprio bem.
- Senão o quê, Aguiar? O que você fará comigo? O mesmo que fez a ela? – Arthur sentiu o sangue passar mais quente pelas veias, tomando impulso com o braço direito e acertando-lhe um soco no nariz. Scott saboreou a dor da pancada, e em seguida o sangue lhe percorreu o rosto.
- Você é louco, Aguiar! – gritou, tampando o local golpeado com ambas as mãos. As pessoas já começavam a surgir no corredor, olhando-os curiosas. – Isso não vai ficar assim. – deu três passos para traz, afastando-se dele. – Escreve o que eu estou te dizendo, cara. Não vai ficar assim.
Thur arregaçou as mangas da blusa, em seguida colocando as mãos no bolso e virando-se pra andar, inexpressivo. Os alunos no corredor olharam-no estáticos.

- Você não vai voltar pra sala não, Sop? – Mel perguntou, vendo Chay passar pela porta do refeitório com Rod, mica e Luinha. As mesas já estavam praticamente vazias, de menos as das líderes de torcida, onde apenas Sophia estava sentada.
- Só terminando de comer a salada de frutas. – colocou uma colher cheia na boca.
- Cuidado pra não engordar, hein? Senão vai acabar não cabendo no colant e perdendo a grande estréia dos Eagles nesse semestre.
- Vira a boca pra lá, cruz credo. – deixou a colher dentro da vasilha. – Até perdi a fome. – a amiga riu.
- Que dia você vai voltar a passar o intervalo na minha mesa? – perguntou passando os braços pelos ombros da menina.
- Que dia o Borges sai de lá? – Mel revirou os olhos, dando uma risada baixa.
- Deixa de ser besta. Ele é inocente até que alguém prove o contrário.
- Só que tem, Melzinha, que esse aqui – apontou pro olho esquerdo. – é irmão desse. - pro direito. – Conhece? Você defende porque não foi você que viu.
- Ninguém te garante que eu não tenha visto... – falou sussurrado.
- Ah, amiga. O dia que alguém realmente souber a resposta pra isso tudo, eu vou viver feliz. – Mel mordeu de leve o lábio inferior.

- Vocês viram isso? – Chay apontou pro rapaz que tinha acabado de passar por eles.
- Isso o que? – mica perguntou alienado.
- Acho que vi. – Rod arqueou as sobrancelhas.
- Aquele não era o Scott? Quero dizer... Aquele não era o nariz do Scott...
- Ninguém mandou se meter em tretas por aí. – Rod balançou os ombros. – Sempre com o rosto machucado.
- Outro que está louco pra se meter numa treta é esse cara. – mica disse por entre os dentes, observando um rapaz de cabelos grandes, castanho claro e óculos, passar ao lado deles. Ethan.
- Relaxa, dude. – Chay segurou seu ombro. – Ele é só um idiota.
- Mas pra Sophia, o idiota sou eu...

- Senhor Aguiar. – senhora Paskin disse repreensiva pro garoto do lado de fora da sala. Ele olhava pra baixo. – Você agrediu o senhor Turner?
- Ele pediu por aquilo. – respondeu friamente.
- Você sabe que eu tento te defender, Arthur. – colocou a mão em seu ombro. – Eu sei que você é um bom garoto, mas facilite as coisas pra mim. Pare de se meter em confusão.
- Eu tento. Mas ele provocou. Ele se referiu a ela como se ela fosse uma... – parou a frase no meio. Senhora Paskin soltou um suspiro pesado.
- Entre na sala. Eu sei como deve estar sendo difícil pra você. Dessa vez passa. – arrumou os óculos. Ele obedeceu.

“Precisei resolver um problema. O carro está estacionado na esquina da biblioteca, no outro quarteirão. Vou estar te esperando. Rod.”

‘Exatamente como o pai.’ Lua pensou, recebendo o bilhete de mica e lendo-o no final da aula.
- E o quarteirão da biblioteca é...?
- Logo em frente, Luinha. – apontou. – É só você atravessar essa rua.
- Ok. Obrigada. Acho que já vou indo. – segurou a alça da mochila verde-limão no seu ombro.
- Acho que eu também... – estreitou os olhos, olhando pra uma das mesas na grama e observando Ethan abraçar Sophia por trás.
- Você supera. – balançou os ombros, vendo mica dar um sorriso amarelo e descendo as escadas.
Olhou os colegas. Todos conversando animados entre si. Outros nem tanto. Alguns lançavam um olhar curioso em sua direção, mas isso já tinha se tornado rotina. Colocou uma mecha do cabelo pra trás da orelha, passando os olhos pelo rapaz encostado no Audi A8, depois olhando pra dois garotos na frente de uma picape azul.
- Hey, linda. – o mais alto deles gritou. – Não quer dar uma volta conosco? – acelerou os passos, olhando rapidamente para os lados. – Hey! Não finja que não escutou. Venha cá. –Lua entrou na rua com passos apressados, vendo parte de seu cabelo entrar na frente do rosto.
Ouviu uma buzina. Perto demais.
Suas pernas amoleceram, fazendo com que ela perdesse o ar. Olhou pro lado esquerdo, vendo um carro aproximar-se rapidamente. Ela não teria tempo de desviar. Não teria tempo.
Soltou um gemido baixo, já prevendo sua morte. Alguns flashes embaçados de suas memórias começaram a surgir em sua cabeça. Mas afinal, não era isso que as pessoas viam antes de deixar o mundo? Sua vida toda bem diante dos seus olhos?
Sua vista estava embaralhada e seus sentidos confusos, apesar disso não a impedir setir uma forte pressão no braço... Uma pressão forte o bastante pra arrancá-la do alcanço do veículo.
- Você está querendo morrer? É isso? – o garoto disse alto, com desespero na voz. Luinha abriu devagar seus olhos - os quais tinha espremido – para olhá-lo.
Thur estava ofegante, como se tivesse corrido para salvá-la. Soltou a mão de seu braço rapidamente, como se o fato de tocá-la o queimasse.
- O... Obrigada. – disse falha, com os lábios trêmulos.
- Não por isso. – o rapaz respondeu secamente, colocando as mãos dentro do bolso e analisando-a, antes de virar de costas e seguir novamente pro Audi preto.
As pessoas em volta pararam para ver a cena e fofocar qualquer coisa umas com as outras.

- Hey, Luinha. Desculpe. Estacionei em lugar proibido e quase levei uma multa do car... – olhou-a entrar no carro, com as pernas tremendo. – O que aconteceu? – disse baixo, apertando a mão no volante. Ela tinha descoberto? Alguém tinha feito algo pra ela? Talvezaquele cara...
- Ah. Nada. – passou a mão esquerda nos cabelos suados.
- Eu sei que não foi ‘nada’. Você precisa me contar.
- Que eu quase fui atropelada, Rod? – fixou seu olhar no dele.
- Atropelada? – juntou as sobrancelhas. – Quando? Onde? Por... Quem? – sentiu a raiva passar pelo seu corpo.
- Agora, na frente da escola. Mas também... Não foi culpa do motorista, eu entrei na rua sem olhar...
- Mas você está bem, não é? Desviou a tempo...
- Eu não desviei, na verdade. – o primo fez cara de confuso. – Aquele cara me salvou. Aguiar. – Rod arqueou as sobrancelhas.
- Aguiar? Arthur Aguiar? – perguntou incrédulo, dando risadas de nervosismo.
- Eu sei que não gosta dele. Mas ele salvou a minha vida. – colocou o cinto de segurança.
- Difícil acreditar...

Londres; Dockland; Segunda-feira; 4:03 da tarde;

- Merda. Merda. Merda. – bateu a cabeça de leve na porta de madeira, repetidamente. O cachorro que estava em cima da cama levantou seu olhar para observá-lo. – Merda de vida. – suspirou. – Por quê? Por que ela tinha que aparecer? Essa garota. Por que eu tive que tocá-la? Merda. 

                                                                                                       Escrita por : Lan

“Há algo de podre no reino da Dinamarca.” William Shakespeare.

Londres; Greewich; Domingo; 12:08; 






Mel estava sentada na sala, vendo “Como se fosse a primeira vez” com Chay, quandoSophia abriu a porta do apartamento, com os olhos arregalados e leves olheiras. 

- Passou a noite com o Ethan? – perguntou sem desviar os olhos da tela, colocando uma mão cheia de pipoca na boca. 

- Passei. – a amiga respondeu com a voz baixa. Chay desviou seu olhar do filme por um segundo, para olhar a menina. 

- Que cara é essa, Sop? – perguntou juntando as sobrancelhas. Mel olhou-a preocupada com o comentário do namorado. Estava pálida, e seus movimentos mais lentos. – Parece até que viu um fantasma. 

- Talvez eu tenha visto. – se jogou sentada numa cadeira marrom, do lado do sofá. 

- O que quer dizer? 

- O que eu quero dizer, Melzinha, é que eu a vi. – disse pausadamente. Os outros dois perderam completamente a atenção na televisão com a frase. 

- Você sabe que isso é impossível. – a voz de Mel falhou. 

- Desde ontem eu não sei de mais nada. – soltou um suspiro pesado. 
- Onde você a viu? – Chay se manifestou. 
- Na porta do Mark’s. 
- Não devia ser ela. Com certeza não era. – a garota sentiu um nó na garganta, ao relembrar. O namorado abraçou-a pelos ombros. 
- Eu tenho certeza, Melzinha. – Sophia balançou a cabeça pros lados. – Só podia ser... 

Londres; Dockland; Domingo; 1:03 da tarde; 
- Alô? – Thur disse sentado na cama, com o celular na mão. Seus braços tremiam levemente, e não tinha conseguido pregar os olhos aquela noite. 
O cachorro Spike estava em cima da cama, olhando curioso as reações do dono. 
- Porra, dude. – Duan disse do outro lado da linha, como se estivesse sendo acordado pelo rapaz. – Já é a terceira vez que você liga essa manhã, desse jeito vai queimar meu filme com as garotas. 
- Eu não ligo pras garotas com quem você está ou não. – respondeu sério. 
- Então o que infernos você quer a essa hora da madrugada? – resmungou. 
- Tem o telefone do Marques? 
- Marques? – pensou por alguns segundos. – Quê? Aquele perdedor da turma D? 
- Você tem ou não? – matinha a voz dura. 
- Lógico que não, Aguiar. Pirou? – deu uma risada um tanto irônica do outro lado da linha. – Não acredito que você me ligou a essa hora pra pedir o telefone de um cara. Você está mal mesmo, hein? Mas eu sei como resolver o seu problema. Hoje mesmo a Brittany aparece por aí. 
- À merda com a Brittany. – irritou-se, passando a mão pelos cabelos. – Eu não estou com saco pra ela. Quero o telefone do Marques. Só. 
- Mais gay a cada dia que passa. – Duan revirou os olhos. 
- Que seja. Tchau, dude. 
- Fica com Deus, margarida. Olha lá o que vai fazer, hein? – Thur desligou o celular, colocando-o no criado-mudo e caindo deitado de barriga pra cima, focando o teto. 
Onde ela estaria, e mais importante, quem era ela

Londres; Oxford Street; Segunda-feira; 6:30 da manhã; 

Rod tinha passado a noite inteira inquieto. Aquela segunda era o primeiro dia de aula na polêmica Highgate High School. Não que já não estivesse acostumado com as polêmicas e os mistérios, mas naquele ano em especial, ele tinha Lua. E ter a prima consigo só podia significar uma coisa: Problemas. Mas o que poderia fazer? Mandá-la desistir do sonho de estudar na Inglaterra e voltar pro Brasil? Não seria viável. Ainda mais, com que explicação? 
Tratou de acordar cedo pra ter uma conversa com o pai, a respeito daquilo
- E se ela arrumar confusão lá pai? O que eu vou dizer pra tia? – perguntava preocupado, andando de um lado para o outro na cozinha. 
- A questão é que ela já está aqui, Rod. – o pai disse sentado à mesa de madeira, com os braços cruzados. 
- Mas o que eu devo fazer? Eu não a quero perto daquele cara. – coçou o braço com o nervosismo. 
- Ninguém tem certeza se ele realmente foi o culpado. Pode ter sido qualquer um. Você vai privá-la de conhecer outras pessoas? – arqueou uma sobrancelha. 
- Não. A Luinha não merece isso. – soltou um suspiro pesado. 
- De qualquer forma, filho, quero que mantenha os olhos nela. Ok? 
- Claro. Vou manter os dudes em alerta também. A história não vai se repetir. 

Londres; Civic prateado; Segunda-feira; 7:46 da manhã; 
- Ai, que emoção. – Lua disse em português, alargando o sorriso de frente pra uma câmera de vídeo. – Meu primeiro dia de aula na Inglaterra, isso não é emocionante? 
- Você sabe que eu não entendo nada do que está falando, certo? – Rod disse rindo baixo, olhando rapidamente pra prima. Estava dirigindo, e ela, no banco do carona. 
- Aham. – acompanhou a risada baixa do garoto. – Você deveria aprender a falar algumas palavras em português também. 
- As que eu sei já são o suficiente: ‘Oi’, ‘Tchau’, ‘Obrigado’ e ‘Te amo, tia’. – ela gargalhou. 
- Esperto você. – disse olhando pra fora do vidro, e vendo as imagens passarem rapidamente. 
Passaram por várias casas e bibliotecas, até que seu olhar parou em um determinado lado: A grande e magnífica Highgate High School. 
Ocupava todo o quarteirão, e era constituída por dois prédios grandes: Um de três andares, o principal, e o outro que seria o ginásio poliesportivo. 
Lua observava e filmava empolgada os alunos uniformizados: As meninas com uma saia plissada vermelha três dedos acima do joelho, blusa social branca e uma gravata da mesma cor da saia. Os meninos da mesma forma, mas com a calça social preta. 
‘Nem parece que são quem são.’ Rod pensou. 
- Todo mundo vestido igual. – ela disse maravilhada, apesar de estar vestida do mesmo jeito. 
- Bem vinda à escola da elite. – balançou os ombros de leve. – Vamos parar o carro ali. – apontou com as sobrancelhas, já manobrando pra estacionar junto com os demais. 
Quando por fim desligou o automóvel, Rod saiu do Civic, contornando-o e abrindo a porta pra prima, que filmava tudo. 
- Vamos, Luinha. Acho que não quer chegar atrasada... – coçou a nuca, dando uma olhada rápida nas pessoas em volta. 
- Não mesmo. – desligou a máquina e colocou-a dentro da mochila verde-limão. Desabotoou o cinto e saiu do carro, enquanto o primo segurava a porta. Rod fechou-a ágil, já se colocando do lado da menina e passando novamente os olhos pelos alunos, como se fosse um corvo. 

- Wow. – Scott, zagueiro do time de futebol, disse, escorado em sua picape azul. – Quem é a garota? – apontou com o queixo, fazendo com que Bennet olhasse. 
- Wow. – o grandalhão repetiu, observando boquiaberto a menina de cabelos longos que acompanhava um branquelo da turma D. – Mas essa é a... 
- Eu também pensei que fosse. Mas não é possível. – Scott olhou pros lados, confuso. Todas as outras pessoas pareciam olhar na mesma direção e cochichar baixo. Marques estava incomodado, acelerando os passos da menina. 
- Impressão minha, ou todo mundo está nos olhando, Rod? – ela disse dando uma risada baixa e encostando a cabeça no peito do primo, enquanto andavam juntos pra entrada do colégio. A maioria dos alunos estava escorada nos carros, ou sentada nas mesas que tinham na grama, ao lado de onde caminhavam. 
- Impressão sua, baixinha. Continue andando. – disse seco, passando os braços pelos ombros da garota. Subiram as escadas da frente. 
- Dude, quando você arrumou mulher e não me falou? – ouviu uma voz masculina conhecida esganiçar, por trás de si. Virou-se juntamente com ela. 
- Eu não arrumei mulher, mica. – rolou os olhos, enquanto o rapaz arqueava as duas sobrancelhas ao olhá-la. – Essa é minha prima. Lua. – ressaltou as duas últimas palavras, como se estivesse tentando dar um sinal pro garoto. 
- Lua? – perguntou confuso, vendo a cara de poucos amigos de Rod e engolindo a seco. – Ah, Lua! – encheu-se de entendimento, estendendo a mão pra ela, que apertou-a em seguida. – Meu nome é Micael Borges, melhor amigo do seu primo. Pode me chamar de mica. – sorriu simpático. 
- Hey, mica. – também sorriu. – Pode me chamar de Luinha. 
- Mas então... De onde mesmo que você veio? – fez sinal pra que continuassem a andar, e assim fizeram. 
- Eu sou do Brasil. – ela dizia leve, feliz por ter conhecido uma nova pessoa, ainda mais, tão simpática quanto ele. – Ganhei uma bolsa de estudos na Highgate, por isso vim morar com o molengo. – balançou os ombros. mica deu risada, fazendo o humor de Rod ficar ainda pior. 
- Brasil, cara? – disse surpreso. – Sempre sonhei em passar umas férias lá. A comida, as praias, as mulheres... – sorriu tarado. – Não sei o que você está fazendo aqui, na terra onde o sol mal brilha. 
- Sempre foi o meu sonho. Sabe como é, Beatles e tal. – deu de ombros. 
- Wow, então temos aqui uma amante da música?! – alargou o sorriso. 
- Com certeza. 
- Você podia nos ouvir tocar, algum dia desses. – colocou as mãos nos bolsos. O amigo lhe olhou de rabo de olho, ainda abraçando a garota pelo lado. 
- Tocar? Vocês têm uma banda? – juntou as sobrancelhas. 
- Em formação ainda, mas... É, é uma banda. 
- Por que não me disse, Rod? – Lua voltou seu olhar pro primo, que ainda encarava as demais pessoas no corredor largo e branco. 
- Não achei que isso importasse pra você. – deu um sorriso torto. 
- Claro que importa. Eu nem sabia que você tocava algum instrumento, ainda mais ter uma banda. – ela sorriu leve. – Óbvio que eu quero ouvir vocês tocarem. 
- Pra onde vão agora? – mica perguntou. 
- Secretaria. Precisamos saber qual é a sala da Luinha. Quer vir também? – Marques convidou o amigo, que tinha parado o olhar numa direção só, por um momento. 
Sophia estava escorada na parede, conversando com algumas outras meninas líderes de torcida. Estava com o cabelo preso em um rabo de lado e ria de qualquer bobagem que falavam. O garoto sentiu o coração bater mais acelerado, ao ver a cena. 
- mica? – Rod arqueou uma sobrancelha, olhando na mesma direção que o rapaz. 
- Quê? Ah. Ir à secretaria... Não sei. Acho que preciso fazer outra coisa. – atrapalhou-se.Marques soltou um suspiro pesado. 
- Sai dessa, cara. – bateu em seu ombro. Lua olhava-os curiosa, também passando seus olhos por Sophia. – Você sabe que não deu certo. 
- Eu sei que foi um engano, dude. Um engano que eu preciso corrigir. – mordeu de leve o lábio inferior. – Agora eu estou indo. Tchau, Luinha, prazer te conhecer. E Rod... Muito boa sorte. 
Luinha sentiu um alerta em sua voz, como alguém que alertasse sobre algum perigo, implicitamente. Sentiu a respiração falhar por um momento, e virou seu olhar na direção de duas garotas paradas no corredor, enquanto continuava a caminhar com o primo. A escola era realmente imensa. 

- Senhoritas Harris e White. – uma senhora branca e franzina, de óculos fundo de garrafa, disse examinando-as de cima a baixo. 
- Senhora Paskin. – elas disseram quase juntas, dando um sorriso forçado. 
- Pensei que a norma da escola fosse saias três dedos acima do joelho, e não dois palmos. – arqueou uma das sobrancelhas finas. As meninas se entreolharam. 
- O que podemos fazer se nossos dedos são gordos? – Kimberly fez bico. 
- O diretor vai adorar a explicação. – tirou uma caderneta e um lápis da bolsa, começando a anotar algo. 
- Ah, qual é, senhora Paskin. Até parece que não se lembra quando tinha a nossa idade. – Brittany Harris disse aproximando-se da mulher. – Mas eu sei de algo que vai fazer a senhora lembrar. – tirou da bolsa cor-de-rosa uma nota de cinqüenta libras. 
- Você não vai me comprar desse jeito, senhorita. Espero que amanhã as duas tenham ‘afinado’ os dedos, senão estarão na detenção. – ela deu um sorriso satisfeito, virando de costas e seguindo seu caminho, enquanto as garotas davam o dedo, sem que ela visse. 
- Ridícula. – Brittany murmurou enquanto as atenções de Kimberly estavam pra outro lado. 
- Ai. Meu. Deus. – disse sentindo as pernas bambearem. – Brit... Brit! – cutucou a amiga com movimentos frenéticos repetidos. 
- O quê que é, inferno? – disse passando as duas mãos nos cabelos. Kimberly levantou o dedo na direção de um casal que passava, fazendo o queixo de Brittany cair e sua vista embaçar. 
- Ah não. – disse sentindo dificuldade em falar. – Mas isso não é possível. O que...? Quem...? 
- Isso deve ser loucura da nossa cabeça. Ela não pode estar... 
- Cala a boca, Kimberly. – a loira disse dando uma risada um pouco histérica. – Óbvio que não é ela. Olhe a cor do cabelo. 
- É. Não é ela. – concordou nervosa. – Não pode ser... 

- Amor! Que bom te ver. – Chay disse abraçando a namorada, no corredor do segundo andar. – Já está melhor? 
- Você fala como se não tivéssemos nos visto ontem mesmo. – riu baixo. – Estou, sim. 
- Que bom. Eu fico muito preocupado com você... – começaram a andar. Ele abraçando-a pelos ombros, e ela abraçando-o pela cintura. 
- Eu posso ter esquecido uma semana da minha vida. Mas de você eu nunca vou esquecer. – sorriu de leve, encostando a cabeça em seu peito. 
- Eu entraria em depressão se isso acontecesse. – sorriu maroto. 
- Já olhou em que sala vai ficar? 
- Na D, como sempre. – ele revirou os olhos. – E você? 
- Devo ter ficado na B de novo. Mas tenho que conferir. – balançou os ombros, observando um casal que passava ao lado deles. Sentiu as pernas tremerem e os olhos esquentarem. O coração disparou, impulsionando-a a andar apressada atrás dos dois. 
- Hey, Melzinha, o que você está...? – Chay perguntou, vendo a namorada desvencilhar-se de seus braços e correr em uma determinada direção. 
Uma lágrima ameaçou sair pelos olhos de Mel, quando ela estendeu as mãos trêmulas e puxou a garota de cabelos longos e escuros pelo ombro, fortemente. 
- Hey, você... – disse sentindo a voz falhar. 
Os olhos das duas se cruzaram. Mel com olhos vermelhos e mareados, a menina com os olhos surpresos e assustados. 

“- Hey, Melzinha.- viu-a sorrir, colocando uma mecha dos cabelos claros pra trás da orelha. – Por que está me olhando desse jeito? Até parece que não me reconhece. 
- N...Não é nada, Iv. – disse olhando pra baixo. – É só que eu tive um pressentimento estranho a seu respeito. Só isso. 
- Eu hein. Vira a boca pra lá! – riu baixo, envolvendo os ombros da amiga pelo braço. – Vamos pro ginásio, temos que nos apressar. Hoje vamos ver os Eagles detonando os Tigers da Drayton High School! – riu animada.” 

- Tudo bem, moça? – Lua perguntou sentindo o coração bater pequeno, ao ver a garota vidrada. 
- Vamos embora, Luinha. – Rod disse apressado. – A aula já vai começar. Precisamos achar a sua sala. – explicou-se. 
- Okay... – Lua examinou a menina novamente. – Está tudo bem com você? 
- E...Está sim. – Mel olhou-a, fazendo com que os olhos percorressem todo o seu rosto. 
- Então está bom. – Luinha sorriu simpática. – Cuide-se, hein? – e continuou seguindo seu caminho ao lado do primo. 

- Melzinha! – Chay disse chegando a seu lado. – O que deu em você? 
- Por um momento eu achei que fosse ela. – disse baixo, com o corpo ainda mole. 
- Você sabe que isso não é possível, meu bem. – abraçou-a, afagando seus cabelos. 
- Mas esse não é o mais estranho, Chay. – Mel disse estreitando os olhos. 
- E o que é? 
- Acho que eu tive uma lembrança... – virou seu olhar pra ele. – Daquela semana. 

- ‘Vamos lá garota, está esquentando’. – Duan disse chegando ao lado de Thur, cantando qualquer música do 50 cent que ouvia em seu iPod. 
- Bom dia. – disse sem olhá-lo. 
- Mau humor aqui é mato, hein?! Quê isso, dude. – tirou os fones do ouvido. – Ano novo, vida nova. 
- Quem dera. – passou os olhos por todos os alunos, como se procurasse alguém. 
- Cara. – Duan disse segurando-lhe pelo ombro. Thur virou-se a contragosto em sua direção. – Você sabe que é meu ‘irmão’ desde os doze anos, certo? – consentiu. – Então escuta o conselho de um irmão, não de um amigo: Passa pra frente. Esquece. É o melhor que você tem a fazer. 
- Eu não quero esquecer. – fechou os olhos, respirando fundo. 
- Você não tem que querer. Você precisa. Pelo bem do seu irmãozão aqui. – deu um soco de leve em seu ombro, Thur sorriu torto. – Agora vamos pra sala, margarida. Antes que a chata da Campbell nos coloque pra fora. 

- Turma B. – Rod disse olhando a placa em cima da porta de madeira. – É aqui que nos despedimos, Luinha. 
- Tudo bem. Pode ir. – disse empolgada, passando os olhos pelos novos colegas que estavam em pé ou sentados em cima das mesas. O primo continuou a olhá-la. – O que é dessa vez, Rod? 
- Nada. Eu só... Estou preocupado. – passou dois dedos atrás da orelha. 
- Não precisa ficar. Eu sou grandinha, sei me cuidar. – deu de ombros. – Você está me tratando como se eu tivesse cinco anos, molengo. Sabe que eu já passei dessa idade há muito tempo. Eu sei lidar com uma nova escola. – rolou os olhos, sorrindo. 
- Ok, ok, senhorita crescida. – disse entrando na brincadeira. – Mas, Luinha, sério, qualquer coisa que precisar, o mica estuda na sala ao lado, viu? 
- Está certo, Rod. Mas eu tenho certeza que eu não vou precisar de nada. Vou ficar bem por aqui mesmo. - olhou o relógio de pulso. - Agora me deixe entrar, senão vou ficar parecendo anti-social, ou algo do tipo. 
- Cuide-se. 

Alguns minutos já tinham se passado desde que ela entrou na sala, e maioria dos colegas já tinham olhado-a com uma cara estranha. Mas enfim, quem daquela escola não tinha a olhado assim? Talvez fosse o jeito britânico de olhar uns pros outros. Ou talvez fosse apenas o jeito britânico de olhar pros estrangeiros. Mas, afinal, estava tão na cara que ela era latina? Acomodou-se na cadeira, tirando da pasta verde um livro que tinha trazido pra ler, algum da saga “Harry Potter”. 

Chay deixou Mel na porta da sua sala, dirigindo-se pra turma D. A menina passou os olhos rapidamente pelas pessoas, focando na garota sentada no canto, lendo um livro grosso. Sentia que precisava falar com ela. 
- Olá. – disse um pouco rouca. Lua virou seus olhos para encará-la. 
- Hey. É a menina do corredor, certo? – sorriu. – Já está melhor? 
- Bem melhor, obrigada. – sentou-se em uma cadeira do seu lado. 
- Desculpe a pergunta, mas... – fechou o livro. – Por que me puxou daquele jeito? Confesso que eu assustei. – riu baixo, e Mel também. 
- Eu te confundi com outra pessoa. Desculpe-me, sério. – deu um tapa de leve em sua cabeça. – Eu sou muito distraída. 
- Tudo bem. Já passei por isso. – fez careta. – Então, qual seu nome? 
- Mel. – estendeu a mão. – Pode me chamar de Melzinha. E você é a...? 
- Luinha. – apertou-a. – Lua, na verdade. Mas eu prefiro Luinha. 
- Quer dizer então que você gosta de Harry Potter? – apontou pro livro. 
- Que graça a vida teria sem a magia dos livros? – disse bem humorada. 

O horário já tinha começado há três minutos e ele ainda estava olhando-se no espelho. Mais um ano. Droga. 
Fez com as mãos em formato de concha, enchendo-as com a água da torneira e passando no seu rosto. Talvez aquilo aliviasse a tensão. 
Thur enxugou o rosto com um papel toalha, amassou-o e jogou no lixo logo em seguida. Ser expulso da aula por chegar atrasado era uma péssima opção, ainda mais pra quem queria se livrar das repreensões do pai. Arregaçou as mangas da camisa social branca e dirigiu-se pra sala. 
- Desculpe o atraso, senhor Walker. – disse para o grisalho que estava na frente da turma, fazendo com que todos os alunos o olhassem. O homem virou lentamente seus olhos pra ele, irritando-se com a interrupção. 
- Sente-se, senhor Aguiar. – disse seco. O garoto obedeceu, sem manter contato visual com nenhuma das pessoas da sala. Eram medíocres. 

- Melzinha. – Lua cutucou a menina que estava perdida em pensamentos. Mel virou seu olhar pra ela, analisando-a: Estava eufórica e desconcertada ao mesmo tempo. – Quem é ele? – cochichou baixo, olhando pro garoto que tinha acabado de sentar perto da porta. 
Mel olhou-o de relance, sentindo o coração pulsar mais quente e engolindo a seco. 
- Pra quê quer saber, Luinha? – cochichou de volta. 
‘Pra quê quer saber, Luinha?’ A garota também se perguntou. Tinha sido o primo mesmo que pedira pra que se afastasse dele. Por quê? Talvez o garoto tenha sacaneado Rod... Mas e se não fosse isso? E que coincidência encontrá-lo na mesma escola. Destino? Quem sabe. 
- Curiosidade. – mordeu o lábio inferior. 
- O nome dele é Arthur Aguiar. Dezoito anos. Filho de um grande empresário da Inglaterra. – encarava-a séria. – Se eu fosse você, ficava longe dele. 
Lua endireitou a coluna, cruzando os braços em cima da mesa e voltando a prestar atenção na aula. Sentiu um frio na boca do estômago, mas não havia de ser nada. 

Dois horários depois, o sinal do intervalo tocou, fazendo com que todos os alunos da turma B se levantassem. 
- Vai passar o intervalo com quem, Luinha? – Mel disse recolhendo seus livros de cima da mesa, e dando uma olhada rápida em direção a porta. O garoto ainda estava sentado, olhando fixamente pra uma caneta. 
- Provavelmente com o meu primo, Rod. E com o amigo feliz dele, mica. – levantou-se, também olhando na mesma direção. 
- Rodrigo Marques e Micael Borges? – arqueou uma sobrancelha. 
- Conhece? 
- Claro. São melhores amigos de infância do meu namorado, Chay. – fez sinal pra que elas fossem andando em direção ao fluxo, aproveitando que o rapaz estava distraído. 
- Ah é? Você tem namorado? 
- Já temos dois anos de namoro. Às vezes eu acho que ele é o amor da minha vida. – ficou mais rosada. 
- Que lindo. 
- E você, tem também? – começaram a caminhar atrás de Vincent, o maior garoto da turma. 
- Tenho sim, no Brasil. – sentiu nervosismo ao ver que se aproximavam da porta, e conseqüentemente, do garoto sentado na cadeira a sua frente. – Ele não concordou com a minha vinda pra Inglaterra. 
- Eu também não concordaria se o Chay resolvesse morar do outro lado do oceano. 
- Então eu acho que no final das contas, está tudo acabado entre nós. – suspirou, sentindo os olhos ameaçarem a arder. 
- Você o amava? – Mel disse colocando uma mão no ombro da menina, consolando-a. 
- Ele foi meu primeiro amor, mas não sei se ainda sinto a mesma coisa. 
- Amor é amor. Com menos intensidade, então não é. – piscou pra ela. Luinha abriu um sorriso amarelo. 
- Obrigada. – quando terminou de pronunciar a palavra, Vincent já passava pela porta, deixando as duas como sendo as próximas. Resolveu dar uma olhada novamente no garoto que antes mexia na caneta. 
Ele estava parado com os cotovelos apoiados nos joelhos, e encarando-a fixamente, com curiosidade. Seus olhos, quase sem brilho, representavam pra garota um misto de mistério e perigo, tornando-o mais interessante que qualquer outro. Seu coração descompassava, à medida que o largo momento se passava. 

Thur mantinha a garota em foco, enquanto tentava fazer sua respiração voltar ao normal. Não era ela. Claro. Não podia ser. O que ele estava pensando ao achar isso? Os cabelos dessa menina eram muito mais escuros, assim como os olhos. Talvez sua pele fosse mais bronzeada também. Mas do que importava? Se era tão diferente, porque ainda assim ele insistia em olhá-la? Por que ela era tão intrigante? O que essa garota tinha que tanto o perturbava? 
Ela também o olhava um pouco assustada. Ele não ligava. 
- Vamos, Lua. – a menina que a acompanhava disse rapidamente, incomodando-se com a troca de olhar dos dois. 
Espera. Aquela não era... Mel? 

- Sop, espera! – mica gritou, vendo a garota dar passos largos no corredor, provavelmente pra livrar-se dele. – Espera! – desviava dos outros alunos que entravam em sua frente, continuando a segui-la. 
- O que você quer, Borges? – virou-se irritada. – Será que eu nunca vou poder ter nenhum intervalo em paz? 
- Não até você acreditar em mim. – parou ofegante. 
- Já te dei duas chances de se explicar semestre passado. Você não conseguiu. Agora me deixe em paz. – voltou a dar as costas. 
- Eu... – segurou seu braço. – Não tenho provas. Mas um dia eu terei. 
- Quando esse dia chegar, - ela disse por entre os dentes. – aí você me procura, mas agora me deixa em paz, eu tenho namorado! – soltou-a, permitindo que ela continuasse a se afastar apressadamente. 
Ela estava com outro cara, afinal. 

- Luinha! – ouviu o primo chamá-la com a boca cheia, assim que entrou no refeitório com a nova amiga. – Aqui. – acenou de uma das mesas no centro, fazendo as duas se aproximarem. 
À mesa, estavam sentados Rod – com a boca cheia de cachorro-quente -, mica – um tanto cabisbaixo – e outro garoto, o qual ainda não tinha sido apresentada. 
- Hey, amor. – Mel disse, sentando-se ao lado dele e dando-lhe um selinho demorado. –Luinha, esse é o Chay, meu namorado. 
- Prazer, Lua. – estendeu a mão. O menino a olhou um pouco estático, assim como todas as outras pessoas do colégio, depois apertou sua mão de leve. – Sou prima do Rod. 
- Chay, namorado da Melzinha. Mas pode me chamar de Chay. 
- Alguém ficou sabendo do trote que passaram no senhor Walker? – mica perguntou voltando a prestar atenção no local. 

Londres; Hyundai i30 prateado; Segunda-feira; 3:45 da tarde; 

- Eu gostei dela. – Mel disse encostando a cabeça no vidro. 
- Ela é simpática. – o namorado balançou os ombros. 
- Queria tê-la conhecido também. Essa garota. – Sophia comentou, no banco de traz. – No mínimo é uma pessoa que me intriga. Por que ela apareceu agora? Justo nessa escola? 
- Ela é brasileira, Sop. Tem bolsa de estudos. – a amiga explicou. – Não tem culpa de estar aqui. Ela nem suspeita... – ajeitou-se no banco. 

Londres; Oxford Street; Segunda-feira; 3:57 da tarde; 

“Fui trabalhar. Quando voltar, quero saber tudo sobre o primeiro dia de aula na Highgate. Tem comida congelada no freezer. Com amor, Papai/Tio John.” 

- Ele é uma peça. – Lua deu uma risada baixa, olhando o bilhete pregado na geladeira. 
- É sim. – Rod a abria, tirando de lá uma caixinha de suco de laranja e tomando-a no bico. 
- Ainda bem que eu não tomei esse suco. Teria um delicioso sabor azedo à lá Rod. – revirou os olhos, o primo gargalhou. 
- Deixa de ser fresca, Luinha. – brincou. – Vamos pedir pizza? A comida congelada do velho é horrorosa. E olha que eu sei do que estou falando. – pegou o telefone branco sem fio e dirigiu-se pra sala, assim como ela. 
Lua jogou-se deitada no sofá azul macio, enquanto Rod sentava-se no outro. 
- Ah sim, uma gigante, meio calabresa e meio pepperoni. – concordou com a cabeça. – Já sabe o endereço? Ah sim. Obrigado. 
- Rod? – ela perguntou, focando o teto. 
- Diga, baixinha. – desligou o telefone. 
- O que aconteceu entre o mica e aquela garota? – disse simplesmente, fazendo-o arquear as sobrancelhas. 
- Gostei. Observadora. – balançou os ombros. 
- Mais do que você imagina. – tentou disfarçar sua curiosidade maior. 
- Eles namoraram, um tempo. Aconteceu um mal entendido, eles terminaram. – roeu a unha do dedo médio, como se estivesse desinteressado. – Como qualquer casal normal. 
- Que mal entendido? 
- Pergunta isso pro mica, Luinha. Detesto ficar fazendo fofoca. – ligou a televisão no canal de ‘Friend’s’. 
- Ah, claro. “mica, por que mesmo você foi chutado?” – disse com uma voz afetada, fazendo o primo rir baixo. 
- Então pergunta pra ela. 
- “Olá menina que eu não conheço, o que o mica fez de tão grave?” – Rod riu mais ainda. 
- Ok, Luinha. Péssima. 
- Culpa sua. – sorriu, vendo Chandler fazer caretas na televisão. 

Londres; Dockland; Segunda-feira; 4:14 da tarde; 

Sentou-se na cama, passando a mão direita na cabeça do cachorro, ali deitado. Observou novamente seu apartamento: Muito diferente do que estava acostumado. Apesar de ter uma grande vidraça pra cidade de Londres, já que morava na cobertura, era constituída apenas por uma sala grande – onde montara a sua cama de casal, uma cozinha, e uma sala de estar improvisada – e um banheiro. Era suficiente pra ele e pro cachorro Golden Retriever, apesar de que esse insistisse todos os dias para dar uma volta. 
- Não era ela, garotão. – esfregou-lhe a cabeça. O cachorro olhou-o sem entender. – E agora mais essa. Aposto que apareceu só pra infernizar a minha vida... Só pra me perturbar. 

Londres; Highgate High School; Terça-feira; 3:30 da tarde; 

- Precisamos resolver isso. A situação não pode continuar como está. – o professor de física manifestou-se, passando as mãos pelos cabelos ralos. 
- De quem foi a brilhante idéia de colocá-los na mesma sala? – foi a vez do professor de cálculos. 
- Os alunos são divididos por suas médias, senhor Johnson, de forma que todas as salas fiquem equilibradas. A garota é brasileira, não tinha como ninguém saber. – senhora Paskin bateu os dedos freneticamente na mesa da sala de reuniões. 
- Não importa quem foi o culpado. O mais viável é que fiquem em salas separadas. Para o bem de todos. 
- Não podemos afirmar que ele tenha sido o culpado. – professor de biologia. – Pode ter sido qualquer um. Ela correria risco em qualquer sala. Além do mais, uma pessoa já não foi presa por causa disso? 
- Sim. Mas ninguém acreditou na culpa dela, Willer. 
- Ninguém garante que a história vá se repetir. É até uma suposição tola. 
- De qualquer forma, eu não quero aquela menina lá. Não naquela sala. Não junto com ele. – novamente o professor de cálculos se manifestou. 
- Ele não foi o culpado. – senhora Paskin disse com convicção. – E eu me recuso a trocá-la. 
- A senhora não pode provar. 
- Mas eu tenho certeza. – ‘E vou prová-los’, pensou

                                                                                                          Escrita por : Lan







Os ventos que tiram algo que amamos, são os mesmos que trazem algo que aprendemos a amar... Por isso não devemos chorar pelo que nos foi tirado e sim, aprender a amar o que nos foi dado. Pois tudo aquilo que é realmente nosso, nunca se vai para sempre... – Bob Marley



Um ano depois... 


Londres; Civic prateado; Sexta-feira; 2:47 da tarde. 



Rod se acomodava no banco do carona, enquanto senhor Marques mantinha seu olhar fixo na estrada. Os fones do i-pod se embolavam, apesar disso não impedi-lo de ouvir Blink no volume máximo. Sua cabeça estava em outro lugar. 

Segunda-feira seria o inicio das aulas na polêmica Highgate High School, berço dos alunos mais problemáticos e misteriosos de toda cidade londrina. Rod gostava da escola. Gostava dos colegas, apesar de não conviver com as pessoas julgadas ‘certas’. 

Estava a caminho do aeroporto pra receber a prima brasileira, que não via desde a infância. Ela moraria com eles na casa branca da Oxford Street, conseguindo uma bolsa de estudos pra Highgate School – que podia ser o lar de alunos problemáticos, mas não deixava de ter um ensino exemplar e de abrigar os filhos dos mais ricos empresários da cidade. 

Rod suspirou contra o vidro, vendo o pai estacionar o carro bem a tempo de pegar a garota saindo da sala de embarque. Seu coração acelerou por um momento. ‘Como ela estará?’ perguntou-se, com medo de não reconhecê-la. 

O pai fez sinal pra que ele saísse, e os dois seguiram até o lugar de onde saiam os passageiros do vôo que tinha pousado. Ela com certeza estaria lá. 

- Lua! – o pai disse empolgado, abraçando a garota com uma calça de moletom cinza. Rod não pôde ver seu rosto direito, mas esboçou um sorriso. Talvez ele sentisse mais saudades dela do que imaginava. 

- Tio John! Que bom vê-lo. – sua voz era suave. – Rod! – se desvencilhou dos braços do tio, indo abraçar o primo, que a olhou estático. 

- Luinha? – disse deixando os lábios entreabertos e sentindo um leve tremor passar pelo corpo. 

Aquilo não ia prestar. Ah se não ia. 

Beleza não era o problema da prima. Tinha um rosto angelical um tanto infantilizado, mas atraente ao mesmo tempo. Seu corpo e suas curvas eram proporcionais: Não muito chamativos, mas delicados. Os cabelos mais escuros caiam sobre os ombros, exatamentecomo a... Evitou pensar o nome. 

Droga. Talvez incentivá-la a ir pra Highgate School não tivesse sido a melhor idéia. Talvez não, não tinha sido uma boa idéia. 

Esperou que a impressão que sua prima lhe passou tivesse sido apenas pra ele. Rezou mentalmente pra que ninguém percebesse... Ou se lembrasse. 



Londres; Cemitério West Norwood; Sexta-feira; 3:15 da tarde. 



Colocou o buquê de lírios amarelos em cima da grama, na frente da lápide. Seus olhos já começavam a arder, enquanto se sentava por ali mesmo. 

- Ei, Iv. – abraçou os joelhos, dando um suspiro pesado e sentindo o coração bater apertado. – Hoje faz um ano que eu não a vejo. Triste não? Eu também acho. – o vento batia frio contra os seus cabelos. Ele não se incomodava. – Eu venho pensado muito em você... Todos os dias. Não sei se eu te contei ontem, mas meu pai viajou pra França. Provavelmente vai passar uns seis meses lá, como da última vez. – encarou o vazio. – Eu comprei um apartamento só pra mim. Nada muito luxuoso. Você iria adorar. Spike sente sua falta também. Ele ainda chora olhando pra porta, achando que em alguma hora você vai entrar por ela. – uma lágrima quente desceu pelos seus olhos, seguida de outras. – Eu faço o mesmo. – no momento seguinte já estava chorando compulsivamente, apesar de ser o que tentava evitar. Mas o cemitério estava vazio, então não teria problema. Ninguém o veria. 

Ficou um tempo da mesma forma, lutando contra as lágrimas descontroladas, até que, por fim, o choro cessou. Enxugou os olhos com as costas das mãos, tirando os óculos escuros presos na camisa preta e colocando-os. 

Thur levantou-se e foi na direção do Audi A8, estacionado a metros dali. 



Londres; Lowden Avenue; Sábado; 1:37 da manhã; 



- Wow, wow, gatinho. – Sophia disse embolando a boca, com um copo de bebida na mão. – Calma lá. 

- Vamos entrar aqui, Sop. – Micael disse tão afetado pelo álcool quanto a garota, segurando sua cintura e a pressionando contra a parede. Estavam no meio da festa de confraternização de um dos capitães do time de futebol da escola. A casa estava lotada, apesar de ser bem grande. 

Não existia mais nenhum sóbrio no ambiente, e aqueles que não se beijavam como loucos ou utilizavam os quartos e banheiros pra outros fins, estavam vomitando pelos corredores. 

- Não sei não, hein. – respondeu emaranhando seus dedos nos cabelos dele. 

- Eu sei que você quer isso tanto quanto eu quero. – deu um sorriso tarado, apertando a sua coxa. 

- E se eu quiser? – ela mordeu o lábio inferior, fazendo uma cara inocente. Isso o fez desejá-la ainda mais. 

mica juntou seus lábios rápida e intensamente, abrindo abruptamente a porta na qual estavam escorados e jogando a menina pra dentro. Sophia sorriu ao vê-lo fazer isso, já se preocupando em desabotoar a blusa azul xadrez que ele usava. 

mica puxava pra baixo a saia da garota, fazendo-a arrepiar e dar mordidas leves em seu lábio. 

Minutos depois o quarto já estava inundado por gemidos e risadas baixas. 



Londres; Oxford Street; Sábado; 10:30 da manhã; 



- Ai, desculpa acordar só agora. – Lua disse chegando à sala com uma camisola curta de mangas compridas. 

- Tudo bem, querida. – tio John disse dando um sorriso terno e se levantando. – A viagem deve ter sido cansativa. 

- E foi. 

- Vou a cozinha preparar algum lanche. Rod está no quarto de estudos. – dirigiu-se ao lado contrário a ela, enquanto ela decidia subir as escadas e bater a porta branca do quarto de estudos. 

‘Rod, estudando? Ah, essa é boa. ’ Pensou. 

Abriu-a (a porta) devagar, vendo o primo em frente ao computador e segurando um violão. Olhou-a ainda com os olhos um tanto arregalados. Mesma reação que teve no dia anterior. 

Lua andou devagar e sentou-se em uma cadeira de balanço, na frente do garoto, que acompanhava seus movimentos como se estivesse vendo uma aparição. 

- Tudo bem, Rod. O que foi? – arqueou uma sobrancelha. 

- O que foi quando? – fez-se de desentendido, voltando a olhar o violão e a tocar algumas notas. 

- Por que está me olhando assim? 

- Assim como, Luinha? – permaneceu concentrado em seus dedos nas cordas. 

- Olha pra mim. – pediu, vendo o primo virar seu olhar devagar em sua direção. - O que eu tenho? Você está me olhando esquisito desde ontem. – colocou o cabelo pra trás da orelha. Podia ser ingênua, mas nunca fora boba. 
- Nada. É só que... Você mudou. Muito. – permaneceu olhando pra ela fixamente. Depois chacoalhou a cabeça. 
- Eu cresci, bobo. – riu leve. – Você também não é mais o mesmo pirralho. 
- É. Eu fiquei gostoso. – balançou os ombros fazendo a garota rir. – Seu inglês é bom. 
- Depois de dez anos em um curso, tinha que ser, não é? – sorriu. Rod sentiu novamente um tremor passar pelo seu corpo, vendo o jeito da garota. – Ai, droga. – olhou o computador. – Será que você pode me deixar mandar um recado pra alguém, rapidinho? 
- Claro, a casa é sua. – levantou-se da cadeira na frente da escrivaninha, permitindo que a prima sentasse. – Quem é esse ‘alguém’? 
- Meu namorado do Brasil. – ela enrolou o cabelo colocando-o pro lado, enquanto sentava-se e digitava algumas palavras. 
- Não sabia que você tinha namorado. 
- Há muitas coisas que você ainda não sabe sobre mim, priminho. – mandou um beijo no ar. – Também, é claro. Não nos vemos desde os doze anos... 
- Aham. – concordou na cadeira de balanço. – E como está o pessoal lá no Brasil? 
- Lindos e fortes. – respondeu sorridente, fazendo-o rir baixo. – Senti sua falta. – comentou. 
- Eu também senti a sua, minha baixinha. – Rod levantou-se abraçando a prima sentada, que o abraçava pela cintura. 



Londres; Lowden Avenue; Sábado; 11:02 da manhã; 



- Sop? – mica perguntou sentindo a garganta arder ao falar. Estava deitado na cama de um dos quartos da casa de Bennet, capitão do time de futebol. – Sop? – chamou novamente, levantando a cabeça e abrindo os olhos. 

Sophia vestia a calça rapidamente, com as mãos e as pernas trêmulas. Estava sentada do outro lado da cama. 

- Sop? O que foi? – mica escorregou no colchão até aproximar-se dela, preocupado. 

- Tire a mão de mim, Borges. – disse com a voz embargada pelo choro. 

- O que aconteceu? Ontem foi tudo tão perfeito... – olhou-a sem entender. 

- Ethan aconteceu! – cobriu os olhos molhados com uma das mãos. 

- Aquele babaca do time de natação? – juntou as sobrancelhas. – Ele é um idiota, Sop. Você merece coisa muito melhor. 

- O quê por exemplo, Borges? Você? – deu uma gargalhada em sinal de deboche. 

- Qual o problema comigo? 

- A gente já tentou uma vez, e viu que não deu certo. – colocava a blusa igualmente apressada. – Você não é cara pra uma só. 

- Eu já disse que aquela história da Kim foi um engano... – ele disse se assentando e tentando uma nova aproximação. 

- E a fada dos dentes existe. Borges, conta outra. – começou a colocar os tênis. – Você me trairia com a primeira vagabunda que aparecesse. 
- E você acha que o idiota do Ethan faz o quê? – revoltou-se. 
- Vai à merda, mica. – Sophia elevou seu tom de voz, ainda com algumas lágrimas rolando. – Eu vou embora. 
Saiu do quarto rapidamente, batendo a porta logo em seguida e deixando o garoto sozinho, sem reação. Micael colocou as mãos nos cabelos e deu um gemido abafado, sentindo o coração apertar: ‘Como eu fui perder essa garota?’, repetiu a si mesmo mentalmente, várias vezes. 
Sophia descia as escadas o mais rápido e silencioso que podia, tentando não acordar nenhuma das pessoas que dormiam pelos cantos. Primeiro porque isso seria desagradável, e segundo porque não queria causar problemas com Ethan. Não mesmo. 



Dockland; Londres; Sábado; 2:30 da tarde; 



- Bom dia, Bela Adormecida. – o garoto loiro dos olhos verdes dizia abrindo a cortina do apartamento, permitindo que a luz invadisse todo o ambiente. 

- Puta que pariu, dude! – Thur balbuciou, tampando o rosto com o travesseiro. – Me deixa em paz. 

- O dia já clareou, margarida. – sentou-se na cama, com um sorriso largo estampado no rosto. – Esqueceu do showzinho no Mark’s é? 

- O show é hoje? – abriu um dos olhos, dando de cara primeiramente com o cachorro Spike lhe encarando, depois com os olhos verdes de Duan. 

- Daqui a seis horas, pra ser mais claro. – olhou o relógio. – Temos que repassar as músicas.

- Me espera lá embaixo então. – Thur sentou-se, coçando a cabeça. Seus olhos estavam pesados, circulados por olheiras. 

- Ok, só não demora, seu gay. – Duan disse bem humorado, fazendo com que Thur mostrasse o dedo do meio, antes de fechar a porta. 

O garoto se levantou um pouco pálido. Depois de treinar com os The Lumps (sua banda) até as nove horas da noite, tinha afogado as mágoas em copos e copos de cerveja no Pub mais próximo. 

Olhou-se no espelho antes de entrar para o chuveiro. A aparência pálida e doente de seu rosto com certeza já tinha se espalhado por todo o corpo. Estava mais magro, também. Tudo desde aquele dia... Aquele maldito dia. Tomou uma chuveirada rápida enquanto escovava os dentes, se arrumando quase mecanicamente pro ensaio. 



Londres; Wimbledon; Sábado; 3:17 da tarde; 



- Como foi lá, Melzinha? – Chay disse vendo a garota sair pela porta branca do hospital. – O que ele disse? – observou a namorada com o olhar baixo e carregado, com o rosto um pouco vermelho. 

- Ah, Chay... – ela suspirou pesadamente, abraçando o rapaz. 

O médico saiu logo em seguida, fazendo sinal pra ele, como se o cumprimentasse. 

- O que foi, meu bem? Qual o diagnóstico? – estava realmente preocupado, enquanto sentia sua blusa molhar devagar, com as lágrimas quentes dela. 

- Eu queria me lembrar. Mas eu... 

- Ele disse que você não vai recobrar memória? – apertou ainda mais seus braços contra ela.

- As chances são... Difíceis. – soluçou. – Eu não consigo me lembrar de mais nada que aconteceu aquela semana. Eu preciso lembrar... 

- Não se force, amor. Talvez seja melhor mesmo você não se lembrar... 

- Chay! – ela disse esganiçado, virando os olhos pra ele. – Você diz isso porque não foi um dos dudes. Imagina você saber a resposta pra tudo e simplesmente não se lembrar...? – voltou a chorar e a encostar a cabeça em seu peito. 

- Você não tem certeza se realmente sabe de alguma coisa, Melzinha... – afagou seus cabelos. 

- Eu sinto que sim. 



Londres; Oxford Street; Sábado; 6:30 a tarde; 



- Luinha? – Rod disse batendo duas vezes a porta do novo quarto da menina. 

Ela estava sentada na cama, com o notebook no colo e com fones de ouvido. Vestia uma roupa larga. 

- Diga, molengo. – chamou-o pelo apelido de pequeno, fazendo com que ele fizesse careta. 

- Tá afim de sair hoje? – encostou o corpo no batente da porta, com um sorriso simpático estampado. 

- Ah, que bom que perguntou. – deu um suspiro de alívio. – Acho que eu não ia agüentar passar o sábado em casa. Sou doida pra conhecer a noite londrina. – piscou mais rapidamente, animada. 

- Tem um pub aqui perto... Acho que você nunca ouviu falar. – balançou os ombros de leve, analisando a prima de cima a baixo. 

- Não, mas topo. – ela tirou os fones de ouvido, apertando um botão no computador que desligou-o. – Que horas saímos? 

- Lá pelas oito e meia acho que está bom. – olhou o relógio de pulso. – Todo sábado tem apresentação de bandas, e normalmente começa as oito. 

- Ótimo. – bateu palminhas. - Agora tchau, molengo. Tenho que me arrumar. – mandou beijinho no ar pro primo, que sorriu ao vê-la fazer isso. Rod desgrudou do batente da porta e dirigiu-se pra seu próprio quarto. 



Londres; Greenwich; Sábado; 7:50 da noite; 



Sophia limpou o rosto com a toalha, após tê-lo lavado várias vezes. Não acreditava que tinha dormido com mica novamente, ainda mais namorando com Ethan. 

Morava junto com a amiga Mel em um pequeno apartamento alugado, e tinha passado a tarde inteira entre choros e sorrisos bobos, sem saber ao certo o que deveria sentir. 

Mel tinha chegando junto com Chay (seu namorado há dois anos), ao apartamento. Estava em prantos por não conseguir se lembrar de nada que se passou aquela semana. Se pelo menos tivesse lhe restado uma imagem, ou uma pista... Mas o acidente não lhe permitiria recobrar a memória. Tudo o que se passava pela sua cabeça quando pensava naquela noite eram faróis acesos e uma buzina alta. Apenas. 

- Melzinha... – Chay chegou oferecendo uma caneca de chocolate quente à garota, que estava sentada no sofá. – Já se passaram várias horas desde a consulta, tente se acalmar. 

- Eu sei, amor. Mas tem uma coisa me dizendo que... – ela balançou a cabeça de leve, tentando se livrar do pensamento. 

O telefone da sala começou a tocar, Chay pegou-o da escrivaninha. 

- Sop, Ethan no telefone! – disse um tom mais alto, mesmo que desnecessário, por causa do tamanho do apartamento. 

- Pode deixar que eu atendo aqui. – respondeu. – Ei, Ethan. – Sophia disse com a voz falha, com medo de que o namorado tivesse ficado sabendo de alguma coisa... 

- Oi, Sop. – sua voz tranqüila a fez acalmar. – Seguinte, os meninos estão querendo ir no Mark’s assistir ao show de uma banda, queria saber se você quer ir também... – ela sentiu o coração desapertar de repente. Ele não sabia. Nem ia ficar sabendo. 

Sentiu os olhos ficarem quentes, e uma vontade repentina de revê-lo. 

- Quero sim, Ethan. Que horas vai passar aqui? 



Londres; Mark’s; Sábado; 7:55 da noite; 



- Olha, bibas, não vão me desapontar. – Josh disse pros outros dois integrantes da banda. 

- Claro que não, dude. Quero sair daqui pelo menos com três groupies. – Duan deu um sorriso insinuante, enquanto Thur tentava levantar sua calça dois números maior inutilmente, depois olhando para o lado. 

- Falando em groupies... – murmurou, vendo duas garotas se aproximar. 

Mark’s era um pub pequeno, apesar de quase sempre comportar muitas pessoas. Tinha várias cadeiras, mesas e um palco baixo de madeira, onde as bandas se apresentavam. 

Thur mirava as duas garotas se aproximando: Uma loira com um pequeno short jeans e uma blusa preta colada, deixando a mostra seu piercing no umbigo (Brittany); A outra morena, um pouco mais baixa, com um vestido vinho tão curto quanto (Kimberly). 

- E aí, rapazes? – a primeira disse, se apoiando no braço de Thur, que fez pouco caso de sua presença. 

- Vieram desejar boa sorte, lindas? – Duan perguntou dando um sorriso torto. Kimberly deu uma risada, apoiando-se em seu ombro assim como Brittany fazia com Thur. 

- Toda sorte do mundo. – Brittany aproximou-se mais ainda do rapaz, que não a olhou. 

- O mesmo digo eu. – Kimberly virou o rosto de Duan para si, dando-lhe um selinho longo.Thur suspirou irritado. 

- Dudes. – o gerente do pub chamou, o local estava começando a encher de pessoas. – Está na hora do show. 

- Boa sorte. – Brittany disse. – Espero que tenham um tempinho para nós depois. – fez bico. 

- A noite é uma criança. – Josh brincou, dando um sorriso. 
O homem já subia ao palco com um microfone. Nesse momento pelo menos dois terços do pub já estava ocupado. 
- Boa noite, senhoras e senhores. Essa noite o Mark’s tem o orgulho de apresentar: The Lumps! – os garotos subiram ao palco. 



Londres; Mark’s; Sábado; 8:40 da noite; 



Rod entrava de mãos dadas com a prima, para guiá-la no meio das pessoas. Sabia que Markus, o gerente, teria reservado um lugar especial para os dois. 

Lua observava todas as pessoas com atenção. Queria gravar todos os detalhes possíveis de sua passagem por Londres: O calor do pub, a animação das pessoas, o rock vindo das guitarras e baterias da banda. Usava um vestido azul marinho tomara que caia e um salto alto prateado, enquanto o primo vestia uma blusa verde e calça jeans. 

- Rod, isso é demais! – disse sorrindo, chegando ao balcão onde tinham duas cadeiras vagas, como o esperado pelo menino. 

- Você ainda não viu nada, Luinha. – sorriu. – Você está conseguindo ver a banda daqui? – a garota levantou um pouco o pescoço, avistando várias cabeças a sua frente e enfim, a banda. 

Assentiu, passando os olhos com cuidado em cada integrante. Um em especial lhe chamou a atenção. Sentiu seu coração acelerar ligeiramente. 

Durante as duas músicas seguintes, Luinha bebia seu copo de cerveja observando-o em cada movimento. ‘Eles se conheciam de algum lugar? Quem era ele, afinal?’ Perguntava-se insistentemente. 

O garoto tinha ombros largos e a pele um tanto pálida. Possuía as bochechas levemente rosadas e os lábios que seguiam o mesmo tom. Era lindo. E ela o conhecia, tinha certeza... 

Desviou o olhar dele alguma vezes, lembrando-se de seu namorado no Brasil, mas algo mais forte a fazia manter o olhar naquela direção. 

- Quem é ele? – perguntou pro primo no exato momento em que seus olhares se cruzaram. Sentiu o coração bombear mais fortemente. 

Rod virou-se pra olhar a quem ela se referia. 



Thur perdeu o ritmo. Todos os sons que não fossem de seu coração lhe pareciam alheios. Era ela. Mas o que ela estava fazendo ali? Naquele lugar... Naquele dia. Sua vista escureceu por um segundo. Já tinha parado de tocar. Sabia que Josh e Duan se enfureceriam com o seu ato. 

Thur sentia um suor gelado brotar em sua pele, seu coração estava disparado, e sua boca seca. 

- É ela. – sussurrou pra si mesmo. 

A garota encarava-o curiosa, apontando em sua direção e comentando alguma coisa com o rapaz ao lado. Rapaz? Ele o conhecia. Aquele era... Marques! Claro. Da Highgate High School. Mas o que ele estava fazendo com ela? 

Thur sussurrou seu nome, largando seu instrumento musical e descendo as pequenas escadas do palco com as pernas trêmulas. As pessoas e os guys assistiam-no estáticas. 

Observou Marques segurar a garota pelo pulso e puxá-la rapidamente em direção a porta do pub, com cara de poucos amigos. Thur tentou se esgueirar entre as pessoas para alcançá-los, vendo-a encará-lo como se o reconhecesse. Claro. Era ela. 

- Esp... – sussurrou sentindo a voz falhar. – Espera! – disse mais alto, antes de sentir uma mão agarrar-lhe o ombro. 

- O QUE VOCÊ PENSA QUE ESTÁ FAZENDO? – Markus berrou. 

- Eu preciso... – voltou seu olhar novamente em direção a porta. Eles já tinham saído. 

- VOLTE PRA LÁ, AGORA! – disse apontando pro palco, onde Josh e Duan o olhavam com reprovação. 



- Hey, Rod! – Lua disse um pouco ofegante. – O que aconteceu? 

- Aquele cara, aconteceu! – Rod respondeu tão ofegante quanto, enquanto seguiam andando no quarteirão do pub. 

- Ele fez alguma coisa pra você? – perguntou preocupada. 

- Comigo, não. – suas sobrancelhas estavam juntas. – Escuta, Luinha. – parou de andar, virando-se pra ela. – Quero que prometa ficar longe dele. 

- Mas Rod, o que... 

- Prometa! – disse um tom mais alto. 

- Eu prometo que farei o possível. – sorriu de leve. – Meu molengo preocupadinho. – ele foi contagiado pelo sorriso, ao ver que a prima estava ‘a salvo’. 

- Vamos pra casa, baixinha. – abraçou-a pelos ombros. 

Continuaram seguindo pela rua até esbarrarem sem querer em outro casal. 

- Desculpe-me. – Luinha disse olhando pra garota, que arqueou as duas sobrancelhas e arregalou os olhos. 

- Você... – ela cochichou. Lua achou a ação estranha, voltando a seguir seu caminho com o primo e ignorando-a. – HEY VOCÊ! ESPERA! – ouviu a menina gritar. 

- Rod... Acho que é comigo. – sussurrou. 
- Ignore, Luinha. – o primo apertou ainda mais a mão no seu ombro direito. 
- ESPERA! 
- Continue seguindo. – ele parecia nervoso. 
- O que está acontecendo, Rod? – estava confusa, sentindo um frio passar pela espinha. 
- Nada com que você precisa se preocupar... – ‘Pelo menos por agora’, completou em pensamento. 
Lua não tinha uma boa impressão sobre aquilo tudo. Sabia que algo ruim estava por vir, só não previa o quê. 

                                                                                                               Escrita por : Lan





Nome da Web Novela: Ópera
Adaptada Por: Brubs Barros de "Um Amor de Novela"

Sinopse: Olhou-se no espelho, tendo certeza que estava sozinha. Examinou-se de cima a baixo: Seus cabelos claros caiam pelos seus ombros como cascatas, cobrindo as alças da pequena camisola cor-de-rosa e o meio sorriso escondido. Ah, o sorriso. Aquele sorriso o qual não via há muito tempo, e que de uma hora pra outra, voltou a habitar o seu rosto. Ela sabia que devia aquele sorriso a ele. Sim, ela o amava e a partir daquele dia em diante, estariam juntos para sempre.
Virou-se pra se examinar de lado, enquanto dava tapinhas leves no rosto pra tomar mais cor, o amado se impressionaria.
Ouviu um barulho vindo da janela, que de repente espalhou-se por todo ambiente, vindo da direção do chuveiro. Assustou-se.

- O que você está fazendo aqui? – disse juntando as sobrancelhas e olhando pra pessoa que a encarava. Sentiu o frio percorrer-lhe a espinha quando viu o que ela segurava. Aquilo não seria nada bom. Nada bom. – O que você pensa que...
Durante alguns minutos, o silêncio se espalhou pelo local, mas pra ela, ele seria eterno.
Uma hora depois a mansão já estava cercada por policiais, e mais do que isso, envolvida pelo véu da morte. A mágoa e a vingança seriam suas eternas moradoras, desde então.
 




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A web 'Ópera' é escrita por Lan!

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